CENA
1: Suzanne arranca seu celular da mão de Raquel.
-Isso
é invasão de privacidade! Melhor dizendo: é invasão de domicílio!
-Cê
tá louca, Suzanne? Esse apartamento não é seu! Isso aqui é um
hotel, criatura! Sem falar que todo mundo aqui sabe que sou sua mãe.
-Você
não tinha que ter vindo aqui sem me avisar, muito menos na hora que
eu faço a minha caminhada! Você não tinha que estar no seu
trabalho? Ou será que agora que passou no concurso, não teme a
exoneração? É por isso que essa merda de país não vai pra
frente... olha isso aí: a funcionária pública dando voltinha em
pleno expediente!
-Não
fale desse jeito comigo, mocinha! Ainda sou sua mãe e tenho direito
de saber o que você esconde.
-Que
direito o que, dona Raquel? Você não tem direito a nada se eu não
quiser. Deixa que a minha vida eu resolvo!
-Eu
sei que o meu neto, seu filho, corre risco. É ele que você quer
proteger, não é?
-Cala
a boca, mãe. Você não vai arrancar nada de mim. Sabia que eu podia
te denunciar por estar fazendo uma investigação por conta própria,
sem permissão judicial? Quero ver se sua promissora carreira na
polícia continua intacta depois dessa...
-Você
não seria capaz.
-Seria
capaz disso e muito mais. Eu falei pra senhora não se meter no meu
caminho. Não foi uma ou duas vezes: eu avisei, dona Raquel. Não
atravesse o meu caminho, senão eu não vou pensar duas vezes em te
derrubar feito uma peça de dominó.
-Chega,
Suzanne! Você não vai fazer nada disso! Nos outros você até pode
meter medo, mas não mete medo em mim! Eu vou dar um jeito de
descobrir quem é que você tá acobertando. Eu tenho certeza que é
Guilherme!
-E
daí? Você pode provar alguma coisa? Me deixa em paz!
-Não
posso provar. Mas alguma ponta há de ficar solta.
-Se
eu fosse você, não contava com isso.
-Você
se acha muito esperta, não é? Muito superior, sempre sagaz, sempre
cheia de si, uma vaidade sem limites... sempre foi assim, desde
menininha... eu que demorei a perceber. Cuidado, viu? Vaidade não é
virtude, é fraqueza.
-Me
poupe desse seu papo piegas de autoajuda. Você não tem que estar
aqui, vai embora.
-Eu
não vou enquanto eu não quiser e você não pode me impedir,
Suzanne. Se você pensa que vai ficar impune, tá muito enganada.
-Querida...
eu não penso que vou ficar impune. Eu tenho certeza, sabe por que?
Porque eu sou rica! Rica! Sabe quando que uma pessoa rica nesse país
vai mofar na cadeia? Nunca! Então é melhor se acostumar com o fato,
minha doce mamãezinha: eu não vou acabar presa. Eu sempre compro
quem tem preço.
-Você
é doente, Suzanne. Mas não cante vitória antes do tempo... muita
coisa ainda pode acontecer.
-Não
seja ingênua, dona Raquel. Eu sei como dar as cartas nesse jogo.
Você é quem não sabe.
-Vá
se achando esperta assim...
-Não
acho, mamãezinha querida... eu sou.
-É
impressionante como você consegue mesmo quebrar o clima de qualquer
tentativa de diálogo civilizado que eu tente ter com você.
-Ui!
Devo treinar boas maneiras? Mudou o nome pra Raquel Kalil agora, mãe?
Me poupe do seu pieguismo. Você não tem mais nada pra fazer aqui na
minha casa.
-Esse
apartamento não é seu...
-Ai,
meu Deus, que chata que você é!
-Fique
aí, cantando vitória. Você sabe que tem gente na sua cola.
-Esperava
mais da sua inteligência, mãe. Eu sei que o Valentim tá grudado no
meu rastro. Mas também sei que ele tá contra a lei. Vocês não tem
chance comigo, desiste.
CORTA
A CENA.
CENA
2: Eva e Renata fazem chamada de vídeo para Adelaide, que está na
ONG e chama Regina, Geraldo e Cleiton.
-Gente!
Venham cá correndo! As meninas estão fazendo uma chamada em vídeo!
- fala Adelaide.
Os
três chegam.
-Queridas!
Que saudade de vocês! - fala Regina.
-Coração
chega a estar apertadinho... como vocês estão? - fala Cleiton.
-Parecem
tão cansadas... - observa Geraldo.
-Morrendo
de saudade de vocês, do Brasil, de tudo! Mas estamos bem, sim...
cansadas, é verdade. Estamos agora na Espanha! - fala Eva.
-Que
maravilha... como estão as coisas? - pergunta Adelaide.
-Nada
fáceis, mãe... mas a gente já esperava por isso. Só que
testemunhar ao vivo e a cores, diante dos nossos próprios olhos,
todas as situações absurdas de sofrimento, abuso, injustiça que as
mulheres sofrem, mexe de verdade com a gente. Só que ao mesmo tempo
que isso mexe com a gente a ponto de abalar, a gente faz com que essa
comoção sirva de combustível pra gente poder fazer algo pra
melhorar a vida de todas essas mulheres que muitas vezes são
negligenciadas pelos próprios estados! - fala Renata.
-Tudo
isso que a Renata disse é a mais pura verdade. Dói no coração ver
tanta coisa horrorosa. Há países da África onde as mulheres
lésbicas são estupradas e mutiladas apenas pelo fato de serem
homossexuais. Tudo muito triste, muito doído de ver. Muitas delas
contraíram o vírus HIV através dos estupros que sofreram. A taxa
de suicídios e feminicídios em alguns lugares é assustadora. De
acordo com uns levantamentos que a gente fez, em alguns países a
expectativa de vida média da mulher mal passa dos trinta e cinco
anos. É tudo muito assustador, quando a gente sai da nossa bolha de
proteção, da cultura que a gente se habituou a crer que era a única
do mundo. Mas tudo isso serve de combustível pra gente poder fazer
alguma coisa por essas mulheres tão sofridas... muitas delas, em
vários países, nunca ouviram falar que tinham direitos. Acreditavam
que nasceram para sofrer e serem submissas aos homens, sempre
dominantes. A quantidade de culturas que punem as mulheres que
engravidam de meninas é absurda... é como se nascer mulher fosse
uma maldição e muitas vezes, há até crenças religiosas
envolvidas nisso. Todos os dias, desde que a gente começou essa
viagem pelo mundo, são um choque tremendo de realidade... - fala
Eva.
Adelaide,
Cleiton, Geraldo e Regina seguem conversando em vídeo com as filhas.
CORTA A CENA.
CENA
3: Valentim conversa com Raquel sobre Suzanne.
-Não
sei como você foi dar esse mole, Raquel... você sabia perfeitamente
que ela poderia voltar a qualquer momento, ainda mais pela manhã.
-Precisava
descobrir algo de concreto pra te ajudar, Valentim.
-Desiste,
Raquel... precisamos dar outros jeitos de ficar no rastro dela. Ela
já sabe que eu estou no encalço dela e nem é pelo que você acabou
de me contar que afirmo isso.
-É
por que, então?
-Ela
se percebeu seguida quando fui atrás dela. Desceu num restaurante e
ficou lá por horas. Eu não podia ficar esperando por ela muito
tempo... e ela sabia disso. Claramente ela me percebeu, ela está
alerta.
-Isso
só dificulta mais ainda as coisas, Valentim... precisamos encontrar
uma maneira de resolver isso.
-Não
vai ser fácil. Ela está jogando com todos.
-Como
é que é? Como você afirma isso? Baseado no que?
-Simples,
cara Raquel: ela pode simplesmente estar blefando pra ganhar tempo.
-Sim,
mas... ganhar tempo pra que? Que sentido isso faz? Ainda não peguei
o espírito da coisa...
-Nenhum
crime cometido por ela foi provado por nenhum de nós para que ela
pudesse ser presa. Nenhum crime recente, eu digo... o único crime
comprovado já prescreveu e ela sabe muito bem disso.
-Sim,
mas onde você quer chegar?
-Na
parte que ela pode estar falando as coisas sem nexo, jogando uma
cortina de fumaça em tudo.
-Isso
significa que ela pode estar associada com outras pessoas e não
exatamente com o Guilherme?
-Também.
Mas de qualquer forma, precisamos provar o que suspeitamos. O
problema passa a ser fazer isso por fora, sem amparo judicial nenhum.
-Isso
é o que me preocupa ainda, Valentim. Você não pode arriscar sua
carreira tanto assim em nome da verdade sobre minha filha. Claro que
é importante pra gente descobrir, mas você não pode se
prejudicar...
Mara,
nesse instante chega.
-Mas
eu posso ter a solução pra esse caso. - afirma Mara.
Raquel
e Valentim encaram Mara, intrigados. CORTA A CENA.
CENA
4: Cláudio e Bruno conversam com Vânia e Setembrino sobre planos
para casamento.
-Basicamente
a gente tá pensando em marcar o casamento pro primeiro fim de semana
livre do Cláudio, assim que terminar a primeira temporada do
monólogo dele... - fala Bruno.
-Mas
quanto tempo isso ainda leva, meu filho? Queria ver vocês casados
logo, tá na cara que vocês são o amor da vida um do outro... -
fala Vânia.
-Então,
sogrinha... a primeira temporada é sempre a mais curta. Não dura
nem um mês... geralmente é para testar a receptividade do público,
essas coisas. Inclusive é o que define indiretamente quando que
começa a segunda temporada. - esclarece Cláudio.
-Menos
mal, queridos. Afinal de contas, eu penso que a gente poderia fazer
uma daquelas festas que encham o salão de festas... - anima-se
Setembrino.
-Ah,
pai... eu sei que você adora festas e já sei que você vai
provavelmente querer escolher um repertório daqueles que seja bem
matador, mas daí a querer um festão... acho que não precisa de
tudo isso... - fala Bruno.
-Deixe
seu pai, Bruno... ele é mesmo exagerado de vez em quando, mas de
qualquer maneira a gente quer ajudar na organização, pra poder
proporcionar uma festa pelo menos bonita, com tudo o que vocês tem
direito, sabe? - fala Vânia.
Os
quatro seguem planejando detalhes sobre a organização do casamento.
CORTA A CENA.
CENA
5: Mara se explica a Raquel e Valentim.
-Queridos,
eu sinceramente não sei como nenhum dos dois pensou na melhor
solução pra tudo isso... - fala Mara.
-E
eu posso saber qual seria? - questiona Valentim.
-A
mesma que a gente já utilizou diversas vezes ao longo dos anos:
solicitar permissão oficial para escuta, validando o grampo, de
forma que ele possa ser utilizado para fins investigativos sem
necessidade da reabertura de um inquérito arquivado. Me surpreende
você, Valentim, não ter pensado nisso antes. Tava praticamente
dançando ragatanga na nossa cara o tempo todo e a gente parecia mais
preocupado em fazer tudo escondido... aliás, a gente não, você,
porque sempre é possível encontrar uma precha pelo caminho da
verdade... - explica Mara.
-Verdade...
bem, eu particularmente ainda tou me acostumando com essas brechas,
mas de fato eu já tinha conhecimento dessa possibilidade, só não
lembrei... - fala Raquel.
-Mas
querida, isso pode levar dias! A gente não tem tanto tempo pra ficar
parado. - protesta Valentim.
-Amor,
você sabe que eu tenho meus contatos e posso solicitar prioridade em
determinados casos. Foi o que fiz. Ainda hoje vamos ter a resposta se
a permissão foi ou não concedida. - esclarece Mara.
-O
jeito é esperar que a permissão seja concedida... - fala Valentim.
-Tá
comigo, tá com Deus, Valentim... você sabe disso. Se você pedisse
essa permissão, talvez não surtisse o mesmo efeito e você sabe bem
o motivo... - fala Mara.
-Sim,
eu sei que já fui suspenso, não precisa lembrar desse detalhe... -
incomoda-se Valentim.
CORTA
A CENA.
CENA
6: Valquíria chama Marion para lhe fazer um convite especial.
-Filha,
eu pensei muito desde que Leandro resolveu desenvolver e me ajudar a
atualizar a trama que escrevi há mais de trinta anos...
-Pensou
no que, exatamente?
-Marion,
você é uma grande atriz e eu não digo isso por você ser minha
filha.
-Obrigada,
mãe... mas onde a senhora quer chegar com isso?
-Simples,
minha querida: eu já conversei com Leandro e Vicente e eles acharam
excelente minha proposta.
-Que
proposta?
-Pra
que seja você a protagonista dessa possível novela que vai acabar
se transformando o meu roteiro. Você gostaria de estar no papel
principal?
-Claro
que eu adoraria! Mas tudo isso ainda pode levar algum tempo, né?
-Isso
é o melhor, querida. Tempo de preparação, pra você e pra todo
mundo que vier a trabalhar na equipe, não vai faltar.
-Bem,
nesse caso eu tou mais que dentro disso. Tou mergulhada de cabeça!
Obrigada, mãe... eu fico feliz demais por isso.
-Eu
que fico feliz, minha querida... é até estranho pensar nas voltas
malucas que esse mundo dá...
-Né
não? Quem diria que um dia as coisas chegariam nesse ponto! Eu acho
lindo tudo isso... cada uma de nós realizou nossos sonhos, cada uma
à sua maneira...
-Exatamente,
Marion... então já sabe: vamos ter muito trabalho pela frente.
Estamos diante de um grande desconhecido.
-Que
a gente pode e vai fazer dar certo, a senhora vai ver!
Marion
abraça Valquíria, agradecida. CORTA A CENA.
CENA
7: Marcelo conversa com Rafael sobre suas preocupações.
-Sei
que não devia pensar besteira, mas às vezes fico com umas coisas na
cabeça...
-O
que, amor?
-Nem
sei se vale a pena dizer.
-Ah,
Marcelo... agora que começou, faça o favor de terminar. Você sabe
que não gosto de meias palavras...
-Ando
com medo do Guilherme.
-Mas
o que? De onde você tirou isso?
-Não
é tão absurdo assim, se você parar pra pensar.
-Tá,
absurdo não é, mas o que um sujeito marcado feito ele poderia fazer
contra a gente?
-A
questão não é o que ele pode fazer contra mim ou você. É sobre o
que ele pode fazer contra o meu irmão.
-Mas
amor, por mais que a obsessão maior da vida do Guilherme seja o
Cláudio, você acha que um sujeito vaidoso feito ele arriscaria
perder a liberdade por causa disso?
-Rafael...
certas coisas não tem lógica. Certas pessoas também nunca terão...
Guilherme é uma delas.
-De
qualquer forma, você acha que vai resolver alguma coisa se preocupar
desse jeito?
-Resolver
não vai, amor... mas pelo menos ajuda.
-Posso
saber como?
-Pelo
menos assim a gente não baixa a guarda. Pelo menos eu, no caso...
ficar alerta é importante.
-Querido,
existe toda uma distância entre estar alerta e estar paranoico...
tenta não pensar nisso, vai ser melhor pra todos nós,
principalmente pro Cláudio...
CORTA
A CENA.
CENA
8: Horas depois, Mara conversa com Valentim.
-É,
Valentim... a sagitariana pode ser eu, mas quem nasceu com a bunda
virada pra lua foi você...
-É
o que eu tou pensando?
-Sim.
Foi concedida a autorização para efetuar escuta na linha da
Suzanne. Só falta a operadora deixar de classificar a operação
como falha no sistema de segurança deles.
-Excelente.
Agora eu vou ficando com mais certeza de que isso tudo vai se
resolver logo.
-Assim
espero, Valentim. O tempo está contra nós, não a favor. Por mais
otimista que eu sempre tenha sido, é preciso reconhecer os fatos.
-Mais
uma vez, você tem razão, querida... só de imaginar que muita gente
pode estar correndo risco...
-Verdade.
Nós precisamos ter uma prova o mais rápido possível, pra que essa
maldita presunção de inocência possa cair por terra. Ainda que eu
acredite que Suzanne seja safa o suficiente pra se livrar da
cadeia...
-De
qualquer maneira, precisamos tentar.
-Sem
dúvida. De qualquer forma, ainda vamos ter de aguardar o aval da
operadora. Qualquer escuta que for feita agora não vai ter valor
ainda.
-Isso
é o que me quebra as pernas.
-Paciência,
meu querido... isso tudo tá chegando ao fim...
CORTA
A CENA.
CENA
9: Horas depois, Cláudio adormece ao lado de Bruno e em seu sonho,
aparece misteriosa senhora.
-Dona
Velha! Que bom te ver... gosto tanto de você e nem sei porque...
-Também
gosto de você, querido.
-Mas
você parece preocupada, parece que tá querendo me dizer alguma
coisa...
-Venha
comigo, Cláudio... você precisa caminhar um pouco, relaxar... não
precisa?
-Ando
muito precisado, Dona Velha... mais do que você possa imaginar.
-Eu
sei de tudo.
-Sabe?
-Eu
sempre disse que eu sei das coisas. Não tenha tanto medo: o terror
que aquele cara colocou na sua vida tá prestes a acabar. Você vai
se livrar da obsessão dele... só que você precisa ser forte pro
que vai acontecer...
Cláudio
se assusta. FIM DO CAPÍTULO 152.
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