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sexta-feira, 30 de setembro de 2016

CAPÍTULO 119

CENA 1: O burburinho entre a imprensa aumenta e Marion se impacienta.
-Por favor, eu gostaria que vocês fizessem silêncio! - fala Marion, sem aumentar a voz.
Os jornalistas, fotógrafos e repórteres se calam.
-Muito obrigada. Eu gostaria de passar a palavra primeiramente a meu filho Rafael, certo?
Rafael começa a falar.
-Como minha mãe bem já anunciou, estamos nos desligando da emissora que trabalhamos por tantos anos. Ela e o Vicente por muito mais tempo que eu, por motivos óbvios. Tomamos essa decisão em conjunto, pois mesmo com o apoio do público e o carinho de nossos fãs, o fato é que mesmo depois de eu assumir minha sexualidade publicamente, ainda assim tentaram abafar o caso e engessar minha atuação e, consequentemente, a atuação de Marcelo, que acabou por também se tornar ator. Não é que não possamos interpretar personagens heterossexuais, somos atores o suficiente para isso e há vários artistas LGBT que o fazem. Ocorre que nesse momento das nossas vidas não cabe aceitar que a mídia, aparelhada e financiada em grande parte pela emissora, queira construir uma imagem pública sobre nós que não corresponde nem de perto à nossa realidade. Por esses e outros motivos, eu resolvi me desligar da emissora e pago cada centavo da multa rescisória. Gostaria de passar a palavra novamente à minha mãe. - fala Rafael.
Marion volta a falar.
-Endosso tudo o que foi dito por meu filho. Não quero que pensem, contudo, que não sou grata por tudo o que eu alcancei na minha vida e carreira graças à projeção que tive na emissora, por vinte e um anos. Meu amor à arte de atuar nasceu comigo e se consolidou graças a esse impulso indispensável na minha carreira e tenho uma boa memória para lembrar de tudo isso. Também tive, ao longo de todos esses anos, um excelente relacionamento com colegas, autores, diretores e mesmo o pessoal do executivo da emissora. No entanto a coisa passou a mudar de figura quando eu passei a sentir na pele, na qualidade de mãe de um filho gay, o peso da pressão que era feita sobre ele. Eu e Ivan sabíamos da homossexualidade do nosso filho desde seus catorze ou quinze anos e nunca concordamos completamente com o aparato em torno dele, entre assessores e ordens da própria emissora, que o obrigavam a omitir fatos importantes sobre si mesmo em nome de sua imagem midiática, porque “venderia mais”. Naquela época precisávamos desse dinheiro porque eu estava sem trabalho, mesmo com contrato de longo prazo e estávamos à beira da falência, pelos motivos que todos sabem e que não vou repetir, por respeito e amor ao meu marido. Ocorre que, desde o ano passado, nossa situação financeira melhorou consideravelmente com a mudança de minha sobrinha Riva para cá, que havia se tornado milionária. Ainda assim, tive a sorte de ser chamada para atuar em mais uma novela. Tudo isso foi muito bom, maravilhoso. Até mesmo minha mãe conseguiu realizar seu sonho mais querido e se tornou atriz depois dos setenta. Ocorre que chegamos todos nós à conclusão de que estamos num momento da vida em que já realizamos nossos sonhos e não nos sentimos na obrigação de nos mantermos vinculados a uma emissora que quer nos podar e silenciar. Temos sonhos e projetos, mas eles não cabem na emissora, não enquanto a velha mídia não aprender a se reciclar e parar de censurar o que meia dúzia de conservadores de elite, barulhentos e sacudindo uma boa quantidade de dólares e euros na cara dos grandes empresários, decidem que não querem ver. Nos desligamos da emissora porque liberdade não está a venda. - finaliza Marion.
CORTA A CENA.

CENA 2: Na manhã do dia seguinte, Valentim ajuda Procópio a abrir a companhia de teatro.
-Não sou a Mara pra ter esse negócio de intuição aguçada, mas posso jurar que você tá com a cabeça longe, Valentim...
-E tá certo, meu amigo. Essa questão toda da fuga recente do Guilherme do instituto psiquiátrico está me tirando o sossego.
-Ué, mas por que? Ele não deu nem sinal até agora.
-E eu tava otimista sobre isso antes... mas a Mara me disse algumas coisas que fazem completo sentido...
-Sei. O que seriam essas coisas?
-Que esse silêncio ensurdecedor pode ser mais preocupante do que nos dar motivos para relaxar. O pior disso tudo é que ela tá coberta de razão ao apontar isso. Guilherme tem ódio por muita gente, a começar pelo Cláudio e pelo Bruno, passando pelo Mateus que foi seu principal delator e responsável por ele ter sido desmascarado e preso. Ainda tem a Laura, que acabou descobrindo muita coisa nesse impulso de investigar por conta própria. O fato é que de alguma forma, se ele estiver por perto, todos nós corremos algum risco.
-Sim, meu amigo, mas o que pode ser feito de concreto a esse respeito? Você mesmo nem sabe por onde esse rapaz anda...
-O melhor a ser feito nesse momento é solicitar proteção policial a todos, inclusive aqui para a companhia de teatro.
-Você não acha um pouco exagerado isso? Não é que eu queira diminuir os riscos, mas sei lá... o que um bandido iria querer fazer por aqui?
-Procópio, não é sobre o teatro em si... mas sobre os atores e atrizes que fazem parte daqui. Entende, agora?
-Entender eu entendo, mas será que isso não criaria um alarme excessivo? Digo, sei que pode ser importante, mas temo que isso gere uma espécie de histeria entre todos nós.
-É uma possibilidade, mas de todos os riscos, a histeria é o menor deles. Depois, você sabe como a Mara é tinhosa...
-Claro que sei. Antes de vocês voltarem a ficar como era na juventude, fui casado com ela durante anos. Bateu na intuição dela, é batata: cedo ou tarde se confirma.
-Justamente, Procópio: é por saber disso que eu acredito que se ela disse, então devemos levar minimamente a sério. Mesmo que seja por excesso de precaução.
-Como ela mesma diz, Valentim: melhor pecar pelo excesso do que pela falta. Exageros à parte, ela tem razão quando diz isso, quase sempre.
-É isso que estou levando em consideração, Procópio... mas chega de papo que eu ainda tenho que abrir meu consultório. Nos vemos mais tarde!
Valentim vai embora. CORTA A CENA.

CENA 3: Bruno e Cláudio voltam de cartório, empolgados.
-Amor... você não acha muito apressado a gente ter marcado o casamento para daqui três semanas?
-Deixa disso, Bruno! A gente já perdeu foi muito tempo e teria perdido menos tempo se não fosse minha cabeça dura e minha teimosia. Devemos isso a nós dois.
-Sim, mas será que vai dar tempo de convidar todo mundo? E se até lá a minha mãe piorar?
-Isso tudo pode acontecer sim, querido, mas um pouquinho de otimismo e beijo na boca não faz mal a ninguém.
-Bobo... chega a ser difícil crer que falta tão pouco pra gente se casar de verdade...
-Pois trate de acreditar depressa nisso, Bruno. E que dessa vez eu não esteja errando a pontaria!
-Nossa, mas você se acordou fazendo gracinha mesmo hoje, hein viado?
-Como se você achasse muito ruim essas minhas piadinhas sem graça.
-Ainda bem que você tem autocrítica, né.
-Depois o bobo sou eu... ai ai... eu te amo, viu Bruno?
-Eu te amo mais, Cláudio.
-Tá, deu de melação que senão eu me distraio na direção e ainda causo um acidente.
Os dois se divertem ouvindo música.
CORTA A CENA.

CENA 4: Vicente se reúne com Riva, Marion, Rafael e Marcelo.
-Desculpa se fiz alguém acordar muito cedo... - fala Vicente.
-Não, Vicente... nem se preocupa. Eu posso recuperar as horas de sono perdidas depois... - fala Marcelo.
-Então, queridos... andei pensando nos detalhes mais práticos para dar um impulso inicial nessa produtora que tou pretendendo abrir... - fala Vicente.
-Desculpa interferir no seu pensamento, Vicente, mas eu acho que posso contribuir agora mesmo e não falo de dinheiro... - diz Rafael.
-Como, querido? - pergunta Riva.
-Simples, gente: andei escrevendo algumas coisas nesses últimos tempos. Algumas ideias que andaram pipocando aqui na minha mente. Se eu conseguir dar uma roteirizada nisso, ou mesmo se a gente trabalhar junto, a coisa pode sair do papel e quem sabe possa se tornar nossa primeira obra dentro da produtora... - fala Rafael.
-Amei a ideia, filho! Nem sabia que você andava escrevendo ultimamente. Aliás, é uma novidade pra mim saber que você quer ir além da atuação... - fala Marion.
-Esse bichinho começou a morder o Rafa quando a gente gravou a série exclusiva do site da emissora... - fala Marcelo.
-É uma ideia e tanto, gente. Só que tem uma coisa: antes da gente pensar em colocar em prática qualquer projeto nosso que pintar de série, minissérie, ou até mesmo novela pra internet, a gente precisa primeiro definir como e quando a coisa vai começar a sair da imaginação pra se tornar real. Como já foi falado antes, nós temos um espaço imenso no nosso terreno para a construção de um pequeno complexo de estúdios... ainda assim, mesmo sabendo que ninguém aqui em casa se opõe, a gente precisa pensar, por exemplo, num nome, numa marca registrada, entendem? Algo que seja de impacto, que dê identidade à produtora. Além disso, tem a questão dos trâmites legais. Liberação de CNPJ, essas coisas... -fala Vicente.
Todos seguem conversando. CORTA A CENA.
CENA 5: Procópio chama Laura para uma conversa em particular.
-Até imagino o motivo de você ter me chamado aqui, Procópio.
-Sim, Laura... é sobre sua gravidez. Eu sei que você está empolgada e tudo mais...
-Mas tem medo que eu acabe deixando o elenco da peça, não é isso?
-É... não tava encontrando o jeito certo de dizer.
-Quanto a isso, pode ficar tranquilo, querido. Vou trabalhar até onde eu puder.
-Sim... mas isso por si só já faz com que nossa peça, quando ficar pronta, tenha uma primeira temporada reduzida.
-Isso na prática não há de ser algo ruim, querido. Até parece que você não tem essa companhia de teatro há mais de trinta anos, sabe? Devia saber melhor que eu que uma primeira temporada curta, se fizer sucesso, é bilheteria garantida pra próxima.
-Verdade, Laura. Mas a questão aqui é que a gente nem faz ideia de quando esse texto pra peça vai ficar completamente pronto.
-Não acho que vá demorar tanto, Procópio. Estamos escrevendo em conjunto e o Mateus e o Haroldo estão inserindo um texto considerável, maior que o que eu escrevi até agora, inclusive. Você sabe disso.
-Até sei, querida, mas me preocupa é a realização depois do texto finalizado. A Mara vai acabar dobrando o trabalho dela que pouco já não é, afinal tem de conciliar o teatro com a polícia.
-Você parece estar subestimando nossa preparadora. Aquela ali tem fôlego e disposição de adolescente.
-Nisso você tá certa... acho que nunca vou perder esse frio na barriga que antecede a realização e as estreias...
-Cacoetes profissionais, Procópio... cada um de nós tem o seu próprio. Agora você me dá licença que eu preciso ir lanchar com os meninos.
CORTA A CENA.

CENA 6: Raquel bate no apartamento que Suzanne está hospedada.
-Que milagre é esse, dona Raquel? Resolveu lembrar que ainda tem uma filha? Já enjoou da cara do seu filhinho do coração? Que coisa, não? - ironiza Suzanne.
-Faça um favor a mim e a você mesma, Suzanne: poupe-me dessas ironias. Eu não vim aqui pra te dar um abraço e te chamar de filhinha querida, pro seu governo.
-Ai, que grosseira! Deveria ter mais amor pela sua única filha.
-Amor eu tenho... mas também tenho visão e sei que o seu caráter é podre.
-Tá, chega dessa aura de superioridade, fala logo a merda que te trouxe aqui pra me falar sermão.
-Como é que você teve a cara de pau de mentir em depoimento à polícia, Suzanne?
-Nossa, nem dá pra acreditar que você é investigadora de polícia, viu? O delegado não te disse que nada foi comprovado sobre minhas contas? Aceita que dói menos, querida: elas não são ilegais. Lide com isso. Quer ver sua filha na cadeia? Pois vai ter que ralar muito, dona Raquel. Não vai ser nada fácil provar qualquer coisa contra mim.
-Você deve estar se sentindo por cima da carne seca agora, né? Toda cheia de si, se sentindo a vitoriosa... cuidado, viu Suzanne? Mais alto o coqueiro, maior é o tombo do coco.
-Isso é uma ameaça, mãe?
-Não. Não sou da sua laia. Isso é um aviso pra deixar claro que esse jogo não acabou. Você sabe que seu inquérito permanece aberto. Você vai acabar sendo pega em algum momento, pode apostar.
-Era só isso? Então me deixa em paz e volte pro seu trabalho de justiceira da terceira idade e acolhedora de sem teto.
-Eu vou embora, mas fica o aviso: você não vai ficar impune.
-Isso é o que veremos, “mamãe”.
CORTA A CENA.

CENA 7: Vicente está concentrado na escrivaninha do quarto e Riva percebe.
-Nossa, amor... você tá tão concentrado que daqui a pouco essa escrivaninha te engole!
-Ah... desculpa, amor... realmente fiquei bem concentrado aqui.
-Com o que?
-Então, Riva... eu tava fazendo uma estimativa de orçamento para a nossa futura produtora.
-Sério? Que bom que você já pensa nisso com toda essa antecedência, assim não tem como dar erro na hora de colocar tudo em prática. Aliás, se isso te interessa, sou uma excelente empresária.
-Como se você precisasse reafirmar isso, Riva. Você geriu o próprio negócio durante mais de dez anos com louvor!
-Enfim... quanto tá saindo o valor desse orçamento?
-Olha, amor... vai sair no mínimo seis milhões de reais para construir toda a estrutura do que vai ser nosso complexo de estúdios. Ainda não fiz a planta, isso fica mais pra frente, mas calculando a área que nós temos disponíveis e levando em conta que material de construção bom não é tão barato assim e eu pretendo que tudo seja de qualidade, por menos de seis milhões não tem como sair. Essa conta pode inclusive triplicar conforme a coisa for tomando forma.
-Nossa... é dinheiro pra danar, Vicente. Mas nem de longe isso vai ser um problema pra nós... graças a Deus!
-Ainda bem. Só que eu estou contando com o meu dinheiro, o seu e o de Rafael. Com o de Marion eu não vou contar porque eu ando com receio que ela acabe sendo processada pelo João Bernardo...
-Você acha mesmo que o dono da emissora poderia abrir uma ação contra ela?
-Conheço aquele sujeito. Caráter nunca foi o seu forte...
CORTA A CENA.

CENA 8: Ao final do dia, Valentim conta a Mara sobre notícia que recebeu.
-Tenho algo a te contar, querida.
-Fala, Valentim.
-Um dos últimos fugitivos da instituição psiquiátrica foi recapturado. O nome dele é Paulo. Sabe o que ele disse? Que Guilherme foi o mentor da fuga em massa que ocorreu.
-Eu sabia que tinha participação direta dele nisso! Foi dita mais alguma coisa?
-Não... o delegado que me informou a respeito só disse isso.
-Tá vendo como você tem que me ouvir mais vezes, Valentim? E sou capaz de apostar que foi o Guilherme que eliminou aqueles dois homens que foram encontrados mortos.
-Não tenho certeza sobre isso. Ele sempre foi de mandar outros fazerem o serviço por ele para não sujar as próprias mãos.
-As coisas podem mudar quando a situação pede, Valentim. De repente, numa situação extrema, ele pode perfeitamente ter assassinado esses dois rapazes. Eles nem estavam mais com as roupas da instituição... talvez soubessem demais. Queima de arquivo, sabe?
-Isso a gente só vai descobrir com o tempo, querida...
CORTA A CENA.

CENA 9: Mateus, Laura e Haroldo estão em casa e conversam tranquilamente após o jantar.
-Cês acreditam que o Procópio pensou que eu fosse desistir da peça? Ah, até parece que não me conhece... - fala Laura.
-Não conhece mesmo. Quando você enfia uma coisa na cabeça, ninguém tira... - comenta Haroldo.
O celular de Mateus toca e Laura escuta.
-Querido, não é seu celular tocando?
-Deve ser, mas pela distância, deve estar lá no quarto...
Mateus vai ao quarto e encontra o celular tocando. Vê que é número desconhecido e atende.
-Surpreso com a minha ligação, traidor?
Mateus percebe se tratar de Guilherme. FIM DO CAPÍTULO 119.

quinta-feira, 29 de setembro de 2016

CAPÍTULO 118

CENA 1: Marcelo e Rafael se animam.
-Peraí... isso significa que todos vocês estão se desligando da emissora? Foi isso mesmo que eu entendi? - questiona Marcelo.
-Eu já estava desligada, meu bisneto... meu contrato era por obra e acabou no dia que terminou a novela... - fala Valquíria.
-Eu tenho contrato de longa duração, mas estou disposta a pagar a multa rescisória. - afirma Marion.
-O mesmo se aplica a mim. Vai ser uma multa alta? Vai, mas nem de perto vai deixar a gente quebrado... - fala Vicente.
-Eu não tinha pensado nisso, gente... mas meu contrato também é de longa duração... vai ser uma multa e tanto, mas... ando tão desgostoso com o rumo que a emissora anda tomando que pago o dinheiro que for preciso pra me desligar dela... - fala Rafael.
-Que sorte, a minha... no final eu fico de boas, que nem a bisa... - fala Marcelo.
-Eu é que vou encontrar problemas, acho... - fala Riva.
-Ah, gente... nós temos tudo para nos sairmos super bem dessa. Não digo nem que vai ser volta por cima porque a gente sequer vai afundar. Na verdade... eu vim amadurecendo uma ideia faz algum tempo e ela voltou a martelar na minha cabeça depois da conversa de mais cedo... - fala Vicente.
-E que ideia é essa que você faz tanto mistério e nem contou pra mim ainda? - pergunta Riva.
-Pois agora vou contar a todos vocês: na realidade, é um sonho antigo. Como vocês sabem, sempre me interessei por esse universo de entretenimento, de fazer televisão, dirigir, produzir... como a internet anda crescendo vertiginosamente nos últimos tempos, principalmente depois da popularização dos serviços de streaming, é meio notório que as emissoras da velha mídia estão sofrendo uma espécie de derretimento na audiência, o que é um processo natural, diga-se de passagem... assim foi quando a própria TV surgiu e passou a ameaçar o império do rádio. Os grandes empresários, donos de verdadeiros impérios e ligados à ultra direita quase que via de regra, fizeram de tudo para boicotar a TV. Por outro lado, a própria chegada da TV aqui no Brasil, como vocês sabem, foi uma ação visionária e muito bem paga pelo Assis Chateaubriand, que era um sujeito milionário. A TV, nos seus primórdios, começou por um capricho, aqui nesse país. Só que com a internet esse caminho foi completamente diferente... embora seja algo que existe há décadas e décadas, a popularização se mostrou democrática e espontânea, reflexo do crescimento num geral, do aumento do poder de aquisição das camadas da sociedade que eram, até então, excluídas. Bem... desculpem por falar esse monte de coisa pra explicar, mas tudo isso foi pra deixar bem claro qual é meu projeto: eu quero abrir uma produtora independente de conteúdo dramatúrgico. Pode ser aqui no terreno da nossa casa mesmo, já que ele é gigantesco e há um imenso espaço inutilizado. Penso num pequeno complexo de estúdios. Sem concessão pública, sem nada disso: o investimento inicial sai dos nossos bolsos... a gente vai produzindo na medida do possível, esperando que a coisa dê certo. - explica Vicente.
Todos se empolgam com a ideia.
-É brilhante isso, amor! - vibra Riva.
-Sempre confiei no potencial do meu grande amigo! - afirma Marion.
-E eu tou super empolgado com isso, Vicente! Seria um sonho produzirmos conteúdo dramatúrgico sem passar por censura nenhuma! - fala Rafael.
Todos seguem conversando sobre a ideia de Vicente. CORTA A CENA.

CENA 2: Márcio chega em casa junto com Raquel e ela o recebe com um abraço.
-Nossa, pensei que não morava mais nessa casa. Me fala, meu filho... foi bom passar esses dois dias lá no meu neto?
-Maravilhoso e emocionante. Ele me chamou de pai pela primeira vez, acredita? Todo cheio de amor, me pergunto se mereço tudo isso.
-Claro que merece, meu querido. Merece todo o amor do mundo. E espero muito que você encontre uma mulher boa pra você, que te faça esquecer de uma vez por todas da Suzanne.
-Queria ter essa certeza, mas vou ser sincero com você, mãezinha... acho que nunca vou encontrar uma mulher que me encante. Já desisti disso.
-Você tá moço ainda, querido. Entrando recém nos quarenta... tem uma vida linda pela frente. Não é justo você se privar de amar dessa maneira.
-Vai por mim, dona Raquel... todo o amor que existe dentro de mim já se concentra pelos meus filhos e pela Suzanne. Os meus filhos eu posso amar sem sofrer, já a sua filha...
-Não é justo com você isso, Márcio. Definitivamente não é. Você sempre foi uma pessoa boa, de bom coração. Eu sempre enxerguei isso, mesmo quando todos duvidaram de você.
-E eu vou ser eternamente grato por isso... de verdade. Eu não sei até onde vai minha capacidade de amar, mas eu sinceramente não estou interessado em encontrar alguém.
-Pois deveria estar, meu filho... eu vejo estampado no seu rosto que você sofre por causa disso...
-Eu escolhi esse sofrimento quando aceitei me deixar envolver pela Suzanne.
-Continuo a te dizer que nada disso é justo com você mesmo. Você não pode passar a vida inteira se maltratando por um amor fadado ao fracasso. Você amou e isso basta.
-E ainda amo. Não tenha dúvidas disso.
-Mas esse amor não te faz bem, meu querido. Amor só é bom se nos fizer sorrir...
-Independente do que a Suzanne é... eu não sei deixar de amá-la.
-Isso é amor incondicional. Viva com esse sentimento se quiser, meu filho. Mas não permita que esse sentimento seja qualquer coisa maior do que sua própria dimensão, tá me ouvindo? Você pode escolher não sofrer, se não quiser mais sofrer. Quando o amor é amor, o simples fato de amar já basta. Lembre-se disso, tá? E não se esqueça de amar a si mesmo em primeiro lugar.
-Eu tento, dona Raquel... mas ainda é tão difícil, sabe?
-Ninguém disse que a vida era fácil... não é para amadores. Mas você já provou que é forte. Cedo ou tarde, vai superar tudo isso.
-O seu otimismo me contagia, mãezinha...
-E é pra contagiar, mesmo. Onde já se viu um homem bonito desses sofrendo por causa de uma mulher que não vale nada? Dá cá um abraço, vai!
Márcio abraça Raquel. CORTA A CENA.

CENA 3: Na manhã do dia seguinte, Mara acorda e estranha ver Valentim acordado antes dela, tomando uma caneca de café e pensativo na sala.
-Nunca te vi se levantar antes de mim, querido... e com essa cara de quem tá pensando na morte da bezerra, posso apostar cem reais que você tá com alguma coisa martelando forte na sua cabeça...
-E tou, Mara... eu me acordei com esse pensamento. Na realidade, mal dormi. Eram umas quatro da manhã quando eu comecei a pensar nisso...
-Do que se trata, Valentim?
-Fiquei pensando sobre a fuga do Guilherme.
-Depois sou eu que insisto nesse assunto. Tá vendo como eu tinha razão? Só não peço palmas porque eu mereço o Tocantins inteiro...
-Sem gracinha, sagitariana piadista. Eu tou começando a crer que ele tenha deixado o país.
-Baseado no que você acredita nisso? Porque olha, por mais que eu seja uma excelente observadora por cacoete profissional, o psiquiatra aqui ainda é você, então pode falar que eu quero entender suas teorias...
-Bem, querida... não são exatamente teorias. São observações do padrão comportamental dele. O Alceu me passou algumas informações há algum tempo.
-E do que se trata essas informações?
-Basicamente falam sobre o comportamento escapista do Guilherme.
-Até aí, novidade nenhuma... a negação da realidade é meio comum em vários momentos na vida de um esquizofrênico, não?
-Não é só isso, Mara... o Alceu relatou que, durante alguns surtos, Guilherme inventava novas realidades.
-E numa dessas ele poderia tomar a decisão de se mandar e recomeçar a vida... é isso?
-Exatamente.
-Espero mesmo que você esteja certo. Vai ser melhor pra todos. Agora quer fazer o favor de me acompanhar no café da manhã?
Valentim se diverte com Mara. CORTA A CENA.

CENA 4: Suzanne é acordada pela campainha tocando.
-Mas que merda! Se for alguém daquela família chata de comercial de margarina eu juro que meto a mão na cara e ainda chamo a segurança! - esbraveja Suzanne, vestindo um robe e indo à porta.
Ao abrir a porta, depara-se com um homem.
-Bom dia. Quem é você? - pergunta Suzanne.
-Sou Gustavo Marcolino, oficial de justiça. - fala o homem.
-Ih, lá vem bomba. Qual é a bronca, Gustavo?
-Você está sendo intimada a comparecer na delegacia para prestar esclarecimentos ao delegado às dezesseis horas. Aqui na intimação estão todas as informações que você precisa saber. É sobre suas contas no exterior, dona Suzanne. Esteja na delegacia pontualmente às dezesseis horas, pois caso contrário você será conduzida coercitivamente. - fala Gustavo.
-Não precisa se preocupar... Gustavo é seu nome, né?
-Isso.
-Fique sossegado. Não sou mulher de fugir da raia. Estarei lá antes mesmo da hora marcada. Passar bem, rapaz.
Suzanne fecha a porta e fica apreensiva. CORTA A CENA.

CENA 5: Antes de saírem para ensaiar, Laura, Mateus e Haroldo acertam os últimos detalhes para a gravação de um novo vídeo, dessa vez com a participação dos três e não somente de Laura, para o canal dela.
-Tá tudo ok, meninos? - pergunta Laura.
-Quase lá, amor. Mateus, senta ao lado dela que eu sento do outro lado e confiro aqui depois se o enquadramento pegou todo mundo... - fala Haroldo.
Mateus se senta de um lado e Haroldo do outro. Rapidamente Haroldo confere que está tudo certo.
-Então é isso, queridos... gravando! Depois a gente edita isso tudo aqui. Prontos? - fala Haroldo.
Laura começa a falar.
-Oi galerinha do bem! Espero que não tenham sentido muita saudade de mim. Prometo que vou levar menos tempo pro próximo vídeo. Como vocês podem ver, hoje ao meu lado estão Mateus e Haroldo, os homens da minha dúvida. Assim, não que vocês precisem ser apresentados a Mateus Viveiros, mas na dúvida... - fala Laura, descontraída.
-Pois é, pessoal! Vocês me conhecem da TV e aqui estou eu falando abertamente sobre o relacionamento que tenho com Laura e Haroldo. Sim, eu namoro os dois! - afirma Mateus, se sentindo à vontade.
-E eu sou o Haroldo, a outra ponta desse triângulo. Amo esses dois de um jeito que nem vale a pena tentar comparar. É algo indescritível. Pra quem não sabe, sou o filho mais velho de Ivan Bittencourt e, consequentemente, irmão de Rafael Alves. - fala Haroldo.
-Bem, feita essa apresentação dos amores da minha vida, queria falar sobre um outro amor que está surgindo nas nossas vidas. Antes que vocês, safadinhos, pensem que tem mais alguém com a gente, se engana: eu descobri recentemente que estou grávida. Isso mesmo, galerinha do bem! Vou ser mãe! Porém, é importante a gente falar sobre a legalização do aborto: não é porque eu decidi levar essa gravidez adiante que me torno contrária à legalização. Como bem sabemos, a legalização é uma questão urgente e de saúde pública...
Laura segue falando. CORTA A CENA.

CENA 6: Horas depois, Márcio liga para Cláudio.
-Que surpresa você me ligar! Tudo bem com você, pai?
-Tudo indo, né filho... eu sei que você não gosta que eu fale na Su...
-Nem continua, por favor. A única coisa que aquela mulher fez por mim foi me colocar nesse mundo e eu não quero falar sobre ela.
-Tá certo. Liguei pra saber como estão as coisas por aí, como vai a sua sogra.
-Graças a Deus a dona Vânia não teve mais nenhuma crise renal das bravas. Mas mesmo assim estamos procurando uma maneira de colocá-la na diálise novamente, mas essa mulher é teimosa...
Vânia escuta Cláudio.
-Ei! Eu ouvi isso, meu genro! Sou teimosa mesmo, sou teimosa pra caramba! - grita Vânia.
-Tá vendo? Mas é esse humor que você pode ver pessoalmente. Uma delícia de se ter por perto.
-Sabe, filho... queria saber se você me perdoou de coração por tudo...
-Estou aprendendo a lidar com tudo, pai. Eu não tenho o que perdoar. Nós dois fomos vítimas esse tempo todo. Você pela sua omissão causada pelo amor cego e eu por ter sido abandonado. Mas águas passadas não movem moinhos.
-Verdade, Cláudio...
-Bem, eu vou precisar desligar agora que eu acho que a máquina de lavar tá com problema. A gente vai se falando, pai. Beijo!
-Te amo, filho.
-Eu também, pai.
CORTA A CENA.

CENA 7: O delegado ouve Suzanne depor e depois de alguns instantes, faz as últimas perguntas.
-Então está certo, dona Suzanne. Até o momento não chegamos a nada que te incrimine de fato. - diz o delegado.
-Eu estou dizendo a verdade, delegado. Minhas contas no exterior, a maior partes dela na Suíça, são inteiramente legais. Não tem nada de ilícito porque elas sempre foram declaradas.
-De fato, Suzanne. Desde que foi inciada a investigação, pudemos averiguar que a procedência dessas contas aparentemente é legal.
-Não teria motivos pra não ser. Assim como eu não teria motivos para mentir para um homem bonito como você...
-Por favor, dona Suzanne, contenha-se. Estou trabalhando.
-Tá bem, seu delegado... era só um elogio, não precisa ficar ofendido.
-Prossigamos... bem, apesar de nada apontar para algo de ilícito, o inquérito não será fechado. Você permanecerá a ser investigada.
-E as minhas contas bancárias?
-Uma vez provado até segunda ordem que não há nada de ilegal, suas contas bancárias serão desbloqueadas.
-Menos mal. E o meu passaporte?
-Esse continuará retido. Você não tem permissão para deixar o território nacional.
CORTA A CENA.

CENA 8: No consultório de Valentim, Mara conversa com ele sobre Guilherme.
-Eu sei que você tem seus motivos para acreditar que o Guilherme foi pra longe, mas...
-Mas o que, Mara?
-Eu não sei se ele realmente teria feito isso. Talvez você esteja subestimando a inteligência dele.
-De forma alguma. Eu sei que ele é extremamente articulado e inteligente. Dissimulado também.
-Justamente, querido... você mesmo admite tudo isso. Você não acha que ele pode estar preparando o bote? Desculpa falar, mas acho que esse silêncio nos dá mais motivos pra preocupação do que qualquer outra coisa.
-O pior é que você pode estar certa. Mas vamos tentar ser otimistas.
-Ninguém nessa vida é mais otimista que eu. Só que otimismo não combina com nossa profissão e muito menos vai mudar o caráter de um bandido.
-Eu sei de tudo isso, Mara... me expressei mal. Você sabe que eu não seria imprudente.
-Mas está a um passo de ser, se mantiver as coisas imóveis como estão. E a proteção pros meninos, que ainda não foi solicitada?
-Eu vou providenciar isso, querida... fique sossegada.
CORTA A CENA.

CENA 9: Horas mais tarde, a imprensa chega à mansão dos Bittencourt, convocada por Marion.
-Vem por aqui, queridos... no salão de habitualmente. - indica Marion.
Os jornalistas, repórteres e fotógrafos se acomodam no salão de festas da mansão. Marion começa a falar.
-Bem... já que todos já estão aqui presentes, eu gostaria de fazer um comunicado importante. Aliás, não somente eu, como meu filho Rafael, meu amigo Vicente, minha sobrinha Riva e minha mãe Valquíria. - fala Marion.
-E sobre o que seria esse comunicado? - pergunta uma jornalista.
-Circulam rumores de que você, Marion, anda estremecida com o pessoal da emissora. É verdade? - pergunta outro jornalista.
-Não passam de boatos. Sempre tive uma boa relação com todo o pessoal. No entanto, chamei vocês aqui hoje para comunicar que nós todos estamos nos desligando da emissora.
Cria-se um burburinho entre a imprensa. FIM DO CAPÍTULO 118.

quarta-feira, 28 de setembro de 2016

CAPÍTULO 117

CENA 1: Cláudio se espanta por saber que Valentim espalhou a notícia.
-Não entendo, gente... eu podia jurar que o Valentim não iria espalhar a notícia... - estranha Cláudio.
-Mas você há de convir que nós somos alvos potenciais do Guilherme... e nem é pelo fato de eu ser seu irmão, mas sim pelo fato do Rafael ser irmão do Haroldo, que foi chantageado e coagido pelo Guilherme antes... - fala Marcelo.
-Foi por isso que eu vim aqui, meu filho. Eu sei que eu nunca fui um pai pra você, até porque eu nem sabia que era você o meu filho antes... mas você sabe que te amo, não sabe? - fala Márcio.
-Claro que sei... - fala Cláudio.
-Então, meu filho... é justamente por isso que eu tou aqui, com seu irmão e seu cunhado: pra me juntar a eles e te dizer que você não está sozinho, que você também tem o meu apoio. Não sei exatamente o que eu posso fazer pra te ajudar ou tranquilizar, meu filho... mas qualquer coisa que você precisar, qualquer coisa mesmo, é só me chamar. - fala Márcio, se emocionando.
Cláudio também se emociona.
-Você não tem ideia do quanto me aquece o coração saber que posso contar com você, pai. - fala Cláudio.
Márcio fica surpreso ao perceber que pela primeira vez na vida, Cláudio o chama de pai.
-Você me chamou do que, Cláudio? - pergunta Márcio, ainda descrente.
-Escapou... mas se escapou é porque veio do coração, pai. Pai, pai, pai. Meu pai!
Cláudio e Márcio se abraçam emocionados. Bruno, Rafael, Marcelo, Vânia e Setembrino se emocionam com os dois.
-Aqui... sem querer cortar o barato desse momento tão comovente e mexicano, mas vamos falar das coisas mais objetivas? - fala Rafael.
-Tem razão, Rafael... por que você não convida eles pra ficarem pro jantar? - sugere Bruno.
-Mas tá cedo ainda... - pondera Cláudio.
-Ah, a gente pode conhecer melhor o seu pai biológico enquanto isso. Ele parece realmente ser um bom homem... - fala Vânia.
-É... realmente parece. Mas a senhora que não me invente de ficar de gracinha com ele... - brinca Setembrino.
-Impressionante como esses dois nunca mudam. O pai sempre com essas brincadeiras fora de hora! - diverte-se Bruno.
-Ai, pelo menos a gente vai dar uma arejada nesse ambiente conversando sobre qualquer coisa, menos sobre a fuga daquele baixinho maluco do Guilherme. Chega dessa urucubaca que viada que é viada tem que colocar a cara no sol pra brilhar, meu bem. Como diria Inês Brasil, segura essa marimba, mon amour! - fala Marcelo.
-Isso mesmo, amor. Bicha bonita não se esconde, bota a cara no sol e samba de salto agulha na cara das inimigas! - segue Rafael, descontraído.
Márcio se diverte com todos.
-Se eu soubesse antes o tanto de tempo que perdi longe de vocês, meus filhos... teria largado a Suzanne há muito mais tempo! - fala Márcio.
-Ai, credo, pai! Nem invoca o nome dessa demônia que ela materializa. Quer dizer... desculpa, Cláudio... - fala Marcelo.
-E por acaso isso é alguma mentira? Relaxa, mano. Aquela lá só serviu pra me parir e nada mais... - fala Cláudio.
Todos seguem falando sobre amenidades. CORTA A CENA.

CENA 2: Na manhã do dia seguinte, durante o café da manhã, Marcelo e Rafael decidem conversar sobre o que andam planejando com Riva, Vicente, Marion e Valquíria.
-Sabe, gente... eu sei que pode parecer loucura o que eu vou dizer. Quer dizer... o que eu e o Marcelo vamos dizer... mas o fato é que a gente andou pensando e conversando muito nos últimos dias sobre um assunto que pode ser do interesse de vocês, mas vamos compreender se não for... - fala Rafael.
-E do que se trata, filho? - questiona Marion.
-Então, tia... desde que o Rafa se assumiu pra imprensa e, apesar da aparente boa recepção do público e até mesmo por parte da mídia tradicional, a gente sente falta de algo a mais. Algo que nos contemple por completo e faça mais gente se sentir contemplada. Infelizmente a mídia tradicional não nos proporciona isso, entendem? - fala Marcelo.
-Acho eu que tou começando a entender onde vocês querem chegar, meninos... - comenta Vicente.
-Provavelmente sim, Vicente. Você sempre foi um artista dentro da emissora que se opôs às tendências internas, inclusive politicamente falando, mas isso não vem ao caso agora... a nossa ideia é que boicotemos, na medida do possível, a mídia tradicional, que pouco ou nada se modificou nos últimos cinquenta e tantos anos... ou sessenta e poucos, tanto faz. - fala Rafael.
-Mas meu neto, como que a gente vai fazer isso? Querendo ou não, é a mídia tradicional que ainda nos dá a projeção nacional como atores... - pondera Valquíria.
-É, gente... a mãe tá certa. Como é que a gente vai combater esse império todo? - questiona Marion.
-A ideia pode ser mais simples do que imaginamos de ser executada. Não é segredo pra ninguém o sucesso que eu e Rafael fizemos na plataforma digital da emissora com aquela série exclusiva pra internet... onde tivemos liberdade de tratar da temática LGBT sem censura. Na possibilidade da gente romper o contrato que temos com a emissora, a gente podia justamente pegar carona nesse sucesso e tentar um pouco mais essa inserção nas mídias de internet, seja por redes sociais, sites de vídeos, enfim... - fala Marcelo.
-Eu gostei muito da ideia, meus queridos... mas como que a gente vai ter condições de bancar tudo isso? O retorno nem é garantido... - fala Riva.
-A Riva tá certa, meninos... a ideia é incrível... não é propriamente nova, mas certamente é revolucionária, mas a questão é: como que a gente vai bancar tudo isso? Sem patrocínio, sem anunciantes? Sem a estrutura? Vocês sabem que não sou capitalista, mas vivemos nesse sistema e infelizmente ainda somos dependentes dele... - considera Vicente.
-Isso é algo que a gente ainda conversa. Se o problema for dinheiro ou a preocupação com os gastos, acho meio inútil tanta preocupação, porque dinheiro é algo que não falta a nenhum de nós. - fala Rafael.
-O Rafa tá certo, gente... mas claro, a gente vai entender se vocês precisarem de algum tempo pra pensarem nisso tudo ainda. É uma ideia que a gente tá tendo... - fala Marcelo.
-Vocês estão me dando algumas ideias, meninos... mas outra hora eu explico melhor sobre isso... - fala Vicente.
CORTA A CENA.

CENA 3: Mara insiste com Valentim que ele deve solicitar proteção policial a Cláudio e Bruno.
-Poxa vida, amor! Será possível que você não percebe o óbvio?
-Lá vem você de novo com esse papo, Mara... a gente dormiu falando nisso, agora vamos começar o dia falando nisso de novo?
-Eu não insistiria nesse assunto se não fosse de extrema importância. A Raquel tem razão quando diz que às vezes nem parece que você tem trinta anos de polícia nas costas, porque francamente! Como é que você ainda não solicitou proteção policial aos meninos?
-Porque talvez o Cláudio e o Bruno não queiram essa proteção, considerem exagero!
-Acontece que a situação é grave e você, como investigador e psiquiatra, não pode subestimar a gravidade da situação.
-E o que você sugere que eu faça? Que eu solicite a proteção sem que eles saibam?
-Não, seu imbecil. Eu tou mesmo falando com você, Valentim? Às vezes parece que eu tou falando com o Barbosa da TV Pirata, porque olha... te contar uma coisa, viu?
-Vou dar meu jeito de convencer os meninos de que a proteção policial é um procedimento de praxe. Espero que eles não fiquem muito alarmados.
-E mesmo que fiquem alarmados, é pela segurança deles tudo isso. Eles continuam a ser os principais alvos do Guilherme e você parece subestimar essa informação. A loucura obsessiva do Guilherme teve início por algo que ele culpa o Cláudio por ter começado. Essa paixão louca, doentia, facilmente se converte em ódio. E mais ódio ainda pode acabar sendo direcionado ao Bruno, que “roubou” Cláudio dele. Entendeu agora? Ou vai precisar que eu desenhe?
-Tá, Mara! Chega desse seu papo cheio desse discurso agressivo! Eu sei o que tem que ser feito. Só que ainda acho melhor que pensemos nisso, com calma. Talvez seja preciso um pouco mais de tempo pra gente verificar se realmente há necessidade disso ou não.
-Vai por mim, amor... há necessidade. Eles são os principais alvos.
-Então está certo. Assim que der eu falo com eles. Satisfeita?
-Valentim, por favor... não encare isso tudo como algo que estou te forçando a fazer... é algo necessário e no fundo, por mais otimista que você seja, você sabe disso. Prevenção nunca é demais. Vidas inocentes devem sempre estar seguras e você sabe perfeitamente disso.
-Eu sei. Mas até o momento nós não temos nenhuma posta do paradeiro do Guilherme.
-Justamente por isso. Esse silêncio que antes não representava nada, agora pode representar riscos reais depois da fuga dele. E nada me tira da cabeça que os rapazes assassinados que foram encontrados morreram pelas mãos do próprio Guilherme, pode apostar nisso.
-Você acha?
-Só falta confirmar...
Os dois seguem conversando. CORTA A CENA.

CENA 4: Horas depois, Mara e Raquel conversam sobre suspeitas de Raquel a respeito de Suzanne na companhia de teatro.
-Então, Mara... depois de tudo isso que eu te disse... você acha que minhas suspeitas tem fundamento?
-Por um lado sim, por outro lado não.
-Como assim?
-Que sua filha tem envolvimento com grandes criminosos é praticamente certo. Se não tem mais, em algum momento teve. Ainda mais com a gente sabendo que ela foi a mandante do sequestro do filhinho da Riva.
-Sim! E até hoje ninguém sabe do paradeiro desses dois homens. Simplesmente sumiram do mapa, ninguém sabe, ninguém viu.
-Por outro lado me parece improvável a ligação da Suzanne justo com a maior facção que existia aqui no estado.
-Por que?
-Veja bem, Raquel: eu não estou dizendo que não é possível... eu estou dizendo que é pouco provável. O fato é que a Suzanne, por mais espertalhona que seja, talvez não tenha propriamente o perfil de quem se associa com o crime organizado. O trabalho dela parece ser mais individual, ela usa as pessoas.
-Sim, mas isso pode ser perfeitamente aplicável dentro de uma facção, não?
-Até pode, mas geralmente esse pessoal mais individualista roda cedo dentro dessas facções. Individualistas que são, querem dar passos maiores que as próprias pernas e podem acabar mexendo com as pessoas erradas. Com peixe grande, entende? Se assim fosse, sua filha provavelmente já estaria morta.
-Entendo...
As duas seguem a conversa. CORTA A CENA.

CENA 5: Horas mais tarde, Mateus e Haroldo preparam o jantar e não permitem que Laura se meta na cozinha.
-Mas que palhaçada isso, gente! Agora eu não posso nem cozinhar? Mereço! Se esqueceram que a gente passou por um dia intenso de ensaios hoje? - protesta Laura.
-Justamente por isso, amorzinho... você já se exercitou e se cansou o suficiente por hoje... hora de descansar. - fala Haroldo.
-Tou com o Haroldo e não abro. Nada de querer se meter aqui na cozinha. Fica bem sentadinha aí no sofá assistindo a gente cozinhar. - fala Mateus.
-Vocês estão me tratando como se eu estivesse doente. Em que século que nós estamos, mesmo? No século quinze? Onde já se viu tratar gravidez como doença? Me poupem, se poupem, nos poupem! - reclama Laura.
-Meu Deus do céu, cê só sabe reclamar, mulher? - fala Mateus.
-Eu não teria motivos pra reclamar se vocês dois não tivessem se juntado nessa coisa toda. Vou te contar uma coisa... eu devo ter dançado pole dance na cruz e depois ter feito uma suruba na santa ceia pra merecer uma coisa dessas... - reclama Laura.
-Deixe de ser ingrata, amor! A gente só tá querendo te fazer um agrado, poxa! Deixa que a gente cozinha hoje, você não vai se arrepender dos nossos dotes culinários... - fala Haroldo.
-Ai, tá certo. Hoje vocês venceram, mas eu posso saber por que vocês estão com essa cara de quem viu assombração desde hoje cedo no ensaio? Posso postar a unha do meu dedo mindinho que vocês estão querendo me dizer alguma coisa, mas não tem coragem e... antes de tentarem desconversar, lembrem que sou uma excelente observadora e não vou me contentar com qualquer resposta! - fala Laura.
Mateus e Haroldo se olham e Mateus decide falar.
-É que a gente tem medo que você acabe querendo abortar esse bebê...
Laura fica perplexa com fala de Mateus. CORTA A CENA.

CENA 6: Márcio, que dormiu na casa de Cláudio, se prepara para ir embora.
-Fica pelo menos pro jantar, pai! Tanto o Bruno quanto os pais dele adoraram conversar com você!
-Eu agradeço imensamente, filho... mas já tomei muito do seu tempo. Isso já tá virando abuso da minha parte, não quero dar trabalho.
-Sério, pai... eu já perdi algum tempo nessa minha mania de julgar e fazer birra... eu tou curtindo ter um pai. Você não me dá trabalho nenhum. Se você quiser ficar mais essa noite aqui, eu dou meu jeito, você já viu que o sofá-cama da sala é bom...
-Prefiro voltar pra minha casa, Cláudio. Eu moro com a sua avó... aliás, você bem que poderia ir qualquer hora dessas conhecer a dona Raquel de perto. Ela é a minha mãe do coração... acreditou em mim quando ninguém mais acreditou.
-Se Deus quiser e minha memória não me trair, logo eu vou conhecer minha avó de perto. É bom saber que tenho uma família viva... e de sangue.
-Mas agora eu preciso ir, filho. Faz algum tempo que eu me decidi em fazer todas as coisas certinhas. Peço que me entenda... não quero dar um passo maior que a perna.
-Eu te entendo, pai. Pode sossegar. Mas não se esqueça que a minha casa vai sempre estar de portas abertas pra te receber. Eu sei que pode parecer meio doido dizer isso, mas tou criando uma afeição forte por você. Eu acho até que te amo...
Cláudio se emociona e Márcio também.
-Eu sempre te amei, meu filho... mesmo antes de saber quem você era. Meu coração sempre te esperou.
Os dois se abraçam e Márcio vai embora. CORTA A CENA.

CENA 7: Laura começa a gargalhar diante de Haroldo e Mateus, que não entendem nada.
-Você pode fazer o favor de parar de rir do que a gente acabou de falar? - reclama Haroldo.
-Ai, meninos... vocês são ótimos, meus amores! Vocês acham mesmo que eu iria abortar essa criança? Pensei que vocês me conhecessem melhor... - fala Laura.
-Não vai? Mas você... - Mateus começa a falar e é interrompido.
-Mas o que? Eu sou defensora da legalização do aborto, não significa que nessa altura da minha vida, mulher feita e dona do meu próprio nariz, eu fosse pensar em abortar. Ai, amores... às vezes vocês são bem bobos, viu? Defender a legalização salva a vida de muitas mulheres, sabia? Mas desde que eu descobri que tou grávida, eu já comecei a amar essa criança que vai nascer. Pode ser menino, menina, cis, trans... o que for. É parte de mim. E eu já amo essa vida que tá se formando dentro de mim... - esclarece Laura.
-Você não sabe o quanto isso me alivia, querida. Na verdade eu não tive coragem de dizer antes, mas o meu medo em relação a tudo isso, de que essa gravidez pudesse afetar nossa relação a três, não tinha a ver com a gravidez em si... mas com o que você poderia fazer dela... - fala Mateus.
-Depois o Mateus conversou isso comigo, ainda ontem... naquela hora que você tava de papo com a Eva e com a Renata... acabei entrando na pilha... tive medo, também. - fala Haroldo.
-Seus bobos... a gente vai ter esse filho. E eu já pensei em tudo... como eu tenho certeza de que ele é filho do Haroldo, pela questão temporal mesmo, o Haroldo registra ele e você, Mateus... você vai ser o padrinho dessa criança! - afirma Laura.
Os três se abraçam. Haroldo e Mateus estão aliviados.
-Ai... como é que eu pude arranjar namorados tão bobos nessa vida? Me diz, meu Deus? - fala Laura.
CORTA A CENA.

CENA 8: Vicente, Marion, Valquíria e Riva procuram Marcelo e Rafael para conversarem.
-Bem... a gente espera não estar incomodando o momento de vocês... - fala Riva.
-Que isso, gente... podem entrar. É sobre o assunto que tou pensando? - fala Rafael.
-Creio que sim, Rafael. A gente andou considerando tudo o que foi conversado... - fala Vicente.
-Depois, constatamos que chegamos num momento da vida onde nossos sonhos já se realizaram... percebemos que podemos arriscar mais e por isso decidimos que vamos romper com a emissora! - afirma Marion.
FIM DO CAPÍTULO 117.