CENA 1: Suzanne duvida das
palavras de sua mãe.
-Como é que é isso daí?
Você tá falando isso pra me meter medo, só pode.
-E eu lá preciso meter medo?
O Valentim conseguiu com a justiça esse impedimento. Você não pode
deixar o país.
-Isso é um absurdo, uma
arbitrariedade! Não tenho nenhum crime comprovado! Como isso pode
ter sido feito?
-Falou bem: comprovado. Mas
que tem, tem.
-Que papelão, dona Raquel.
Minha própria mãe duvidando de mim.
-Deve ser porque você nunca
me deu motivos para acreditar em você.
-Isso é abuso de poder! Você
está influenciando as investigações porque trabalha com eles.
-Não, querida. Graças a Deus
eu não sou uma conspiradora. Deixe isso para a direita.
-Mas eu ainda tenho o direito
de ir e vir! Ninguém pode me impedir, mãe!
-Podemos e devemos. Você vai
ser presa se for pega tentando fugir do país. Ficou conhecedora das
leis agora, Suzanne? Essa é nova pra mim... pois saiba que não é
assim que funciona! A partir do momento que o Márcio te denunciou,
foi aberto um inquérito. Enquanto esse inquérito não for fechado
ou arquivado, você tem a obrigação de estar à disposição da
justiça e da polícia, para prestar esclarecimentos.
-Você e o Márcio são dois
traidores! Vocês eram as únicas pessoas que eu tinha na vida e me
apunhalaram desse jeito!
-Você quer realmente entrar
nesse mérito, Suzanne? Então vamos lá: você enganou a mim e ao
Márcio durante todo o tempo. Obrigou o coitado a esconder de mim que
você esperava um filho e quando você teve esse filho, eu não soube
e, se aproveitando disso, obrigou o Márcio a aceitar que você
entregaria ele pro orfanato. Isso sem falar dos golpes que você
praticou desde sempre e alguns deles o Márcio assumiu. Ele ficou
fichado na polícia por crimes que não eram dele!
-Mas ele participou porque
quis.
-Participou porque você se
aproveitou do amor cego que ele tinha por você! Você sempre foi
assim: usa as pessoas e depois joga fora quando elas não servem. Se
o Márcio esteve esse tempo todo ao seu lado, foi por estar cego de
amor. Mas ele está abrindo os olhos agora. Você não vai escapar,
Suzanne. A justiça vai te pegar.
-Não enquanto não ficar
provado algum crime meu.
-A gente sabe que você tem
contas na Suíça.
-Mas elas não são
irregulares.
-É o que aparenta. Mas
estamos na sua cola. Você não vai escapar, entenda isso.
-Sai da minha casa.
-Essa casa nem é sua. E isso
não é uma casa, é um apartamento de hotel. Ah... sabia que os
funcionários do hotel que você destratou querem abrir um processo
contra você? Eu vou apoiar se eles quiserem.
-Você é horrível, mãe. Uma
mãe nunca faria isso.
-Você que é a psicopata
aqui, Suzanne.
-Eu já disse pra ir embora
daqui. Fora! Some da minha vida!
-Já vou embora, mas não é
porque você tá me expulsando. Eu tenho um trabalho a fazer. Muito
trabalho, por sinal... acho que você nem sabe o que é trabalhar.
Vou investigar criminosos como você e defender as mulheres que são
violentadas todos os dias.
-Vai embora!
Raquel deixa o apartamento.
CORTA A CENA.
CENA 2: Haroldo visita Cláudio
e Bruno.
-Não esperava ver só você
aqui, Haroldo. Achei que a Laura e o Mateus vinham junto... - fala
Cláudio.
-Andei falando com eles. Senti
que devia alguma explicação a você... - fala Haroldo.
-Você não me deve explicação
alguma, até porque o Bruno voltou a ser meu namorado. Relaxa. - fala
Cláudio.
-Vocês querem que eu saia?
Acho que eu não tenho nada a acrescentar no papo de vocês... - fala
Bruno.
-Fica, amor... você é de
casa. - fala Cláudio.
-Eu prefiro não incomodar. Eu
vou ler um livro. - fala Bruno, indo ao quarto.
-Sabe o que eu acho mais
engraçado nisso tudo, Haroldo? A sua hipocrisia.
-Hipocrisia? Desde quando eu
fui hipócrita, Cláudio?
-Desde o momento que quando
você tava comigo e eu pensava que você se chamava Rodrigo, você
tinha todo um pensamento mais caretão. Onde é que foi parar o seu
machismo e conservadorismo?
-Eu nunca disse que fui
conservador.
-Mas dava a entender que era,
Haroldo. Não me faça de idiota. Eu acho realmente louvável,
admirável que você esteja vivendo uma relação com a Laura e com o
Mateus ao mesmo tempo, só que eu não posso deixar de criticar suas
contradições.
-Quem você pensa que é pra
me criticar, Cláudio? Se eu vim aqui até sua casa, foi justamente
pra explicar algumas coisas e mostrar o tanto que mudei. Somos ou não
somos amigos?
-E é justamente por sermos
amigos que eu me sinto na liberdade de apontar o que estou apontando.
Você foi outra pessoa naquele tempo que a gente ficava junto.
-Eu tive meus motivos,
Cláudio... e hoje você sabe perfeitamente quais foram.
-Tá... que seja. Não foi
fácil viver sob as ameaças do Guilherme sem nem saber que era ele o
cara que te ameaçava, eu entendo isso. Mas será que você não vê
que todo aquele seu discursinho de fidelidade de corpos era
hipócrita? Olha onde você tá agora!
-Mas você condena minha
relação com eles?
-Claro que não! Eu acho
lindo! Mas você precisa reconhecer que a vida tá te mostrando que
as coisas não são binárias do jeito que você pensava.
-Tá certo... eu reconheço.
Não quero continuar essa discussão, mesmo. Chama o Bruno!
-Chamo sim. Aliás, quer ficar
pra almoçar?
-Vou pensar no seu caso, seu
taurino cheio de teimosia...
CORTA A CENA.
CENA 3: Adelaide conta a
Cleiton sobre convite que acaba de receber pelo telefone.
-Quem era no telefone, amor?
-Você não vai acreditar.
-Se você não me disser, aí
mesmo que não tenho como acreditar.
-Sabe a presidente do partido
Socialismo e Diversidade?
-Ah, a Larissa Gama? Claro que
sei! Ela é uma das melhores políticas desse país! Não vai dizer
que foi ela que ligou, foi?
-Ela mesma, Cleiton. Dá pra
crer?
-Difícil, mas se você tá
dizendo...
-Pois então. Ela quer que eu
me filie ao Socialismo e Diversidade e faça parte da militância a
favor das pautas LGBT no partido.
-E você está bem animada,
pelo que posso perceber.
-Tou animada demais, amor!
Sabe o que isso significa? Que a nossa luta pela igualdade pode ser
estendida para muito mais longe do que a gente sonhou. Isso é
fantástico!
-Você vai se filiar?
-Claro, evidente que vou! Já
simpatizava com a esquerda desde sempre, mesmo antes de desconstruir
meus preconceitos.
-Eu também vou me filiar.
Nesse momento, quanto mais a esquerda crescer, maior será a
prevalência da justiça social.
-Fico feliz que você queira
entrar nessa junto. E tem mais uma coisa, Cleiton... ela quer que eu
me candidate a vereadora... para as eleições de 2020.
-Sério?
-Seríssimo! Não é uma
maravilha? Vamos ter esses anos pra eu me preparar, conhecer a
militância a fundo, ir pra rua, pressionar as autoridades, enfim...
aprender a lutar e conhecer o valor dessa luta!
Os dois comemoram. CORTA A
CENA.
CENA 4: Horas depois, Haroldo
está de volta à casa de Laura e conversa com ela e Mateus sobre a
conversa de mais cedo com Cláudio.
-Como é que é? Sério que o
Cláudio teve a capacidade de dizer que você foi hipócrita? Por que
ele não olha para as contradições dele antes de apontar as suas ou
as de qualquer pessoa? - revolta-se Laura.
-Calma, gente... o Haroldo já
disse que eles se entenderam e ele até almoçou lá. Não entendo o
motivo dessa revolta, Laura. - fala Mateus.
-Me revolto com o fato de que,
entra ano e sai ano, mesmo o Cláudio passando por perrengues que
praticamente forçam ele a amadurecer, ele não perde essa mania
absurda de apontar o dedo pras atitudes dos outros e não olha pras
próprias. Vejam bem, meus amores... não tou apontando o dedo pra
ele nem remoendo o passado, mas poxa vida! Eu tenho memória! Eu
lembro que não tem tanto tempo assim e ele despirocou legal, brigou
com o Marcelo a troco de nada, foi invejoso e teve uma tremenda
dificuldade de admitir as próprias falhas! Vocês estão entendendo
o que me revolta nisso? O Cláudio já melhorou e amadureceu em
muitos aspectos, mas ainda precisa aprender a deixar de ser
intransigente e dono da verdade. Ele precisa entender que as pessoas
mudam, mentem, hesitam... poxa vida! Somos humanos, sabe? Mas ele não
perde essa mania de apontar os dedos pra todo mundo e de ser ao mesmo
tempo autocondescendente consigo. - fala Laura.
-Bem... nesse caso eu concordo
com você, amor. E depois, eu sei como foi complicado o tempo que eu
namorei com ele e nem foi pelos segredos que eu guardava. Foi pela
infantilidade, mesmo. Ele acha que as pessoas nunca podem mentir,
sendo que ele mesmo já mentiu pra proteger. É como se ele pensasse
“eu posso, mas vocês não podem”. Assim fica realmente
difícil... - fala Haroldo.
Os três seguem a conversa.
CORTA A CENA.
CENA 5: Haroldo vai à mansão
dos Bittencourt e conversa com o pai a sós na edícula.
-Preciso conversar sobre algo
sério com você, pai. Não é que seja assim, algo tão sério ou
grave... mas é algo sobre mim, sobre minha vida, que eu queria muito
poder compartilhar com você e pedir para que você tente não
julgar.
-Pode falar, Haroldo... você
sabe que não sou sujeito de julgar.
-Sabe o que é, pai? Eu não
tou mais só com a Laura.
-Como é que é? Me explica
isso melhor... vocês não se amam?
-Claro que nos amamos, pai...
mas eu não terminei com ela. Eu estou com ela e com o Mateus ao
mesmo tempo.
-Nossa, filho... me desculpe
falar, mas... isso me deixa no mínimo perplexo.
-Tenta não me julgar, pai...
eu amo os dois. E sinto que eles me fazem felizes e posso fazer os
dois felizes.
-Eu não estou te julgando,
meu filho. Meu medo é que vocês acabem sendo agredidos por pessoas
amargas, conservadoras... essas coisas, sabe?
-Fico feliz que me compreenda,
pai. Por incrível que pareça, já fomos duramente criticados por
amigos, como o Cláudio, por exemplo.
-É mesmo? Como é que foi
isso?
-Vou explicar, pai... a
história é meio longa...
Haroldo explica o que
aconteceu a Ivan. CORTA A CENA.
CENA 6: Suzanne sai do banho e
ainda percebe muitas marcas da surra que levou de Riva.
-Essa ex-merendeira. Não nega
mesmo a alma de pobretona. Me lanhou inteira, essa desgraçada! Essa
maluca tinha era que me pagar um estojo novo de maquiagem, isso sim!
Suzanne, revoltada, se maquia
para disfarçar as marcas da surra.
-Preciso dar um jeito de virar
esse jogo. Não posso entregar os pontos logo agora. Se nada der
certo por aqui, eu preciso dar um jeito de sair desse país sem ser
pega. Agora mais essa: não posso nem sair do país sem ser presa. A
polícia na minha cola... como eu fui burra de subestimar o tonto do
Márcio! De tonto ele só tem a cara. Me abandonou. E agora eu nem
posso mais me vingar da Riva... mas deixe estar. Quem esperou mais de
vinte anos pode esperar um pouquinho mais. Só preciso do caminho
livre pra enganar outros patos. Sem isso, minha grana acaba e eu fico
pobre. E eu não vou ficar pobre de novo por causa daquela ex
pobretona merendeira, mas não vou mesmo!
Suzanne consegue terminar de
se maquiar com sucesso e permanece falando consigo mesma.
-Me aguardem, seus patos. Se
não for com vocês, vai ser com outros. Tem sempre um pato dando
sopa, esperando pra conhecer uma mulher simpática, cheia de carisma,
de charme... que fala exatamente o que eles esperam ouvir. Vocês são
tão previsíveis, humanos... posso não sentir emoções, mas vocês
me ensinaram direitinho a atuar. E a saber exatamente os pontos
fracos de cada um. Não vai ser difícil... isso, Suzanne! Confiança!
O jeito é pensar na próxima cena de pobre vítima pra comover os
patos... ai, eu sou o máximo, mesmo!
Suzanne sorri maliciosamente.
CORTA A CENA.
CENA 7: Adelaide e Cleiton
visitam Eva e Renata e contam sobre o convite que Adelaide recebeu.
-Mãe, isso é maravilhoso!
Vou te confessar uma coisa: nunca te imaginei sendo de esquerda, mas
tou super amando essa nova Adelaide! - vibra Renata.
-Boba... essa Adelaide sempre
esteve aqui. Mesmo nos tempos que eu era da igreja, eu sempre me
senti mais de esquerda que qualquer outra coisa. Mas posso dizer uma
coisa? Tou me borrando de medo dessa nova jornada... - fala Adelaide.
-Entendo a razão do medo,
minha sogra. O desconhecido deixa a gente assim de vez em quando. Mas
você tem o nosso apoio total e irrestrito. Conte conosco pro que
precisar, mesmo porque já somos filiadas ao Socialismo e
Diversidade. - fala Eva.
-Vou precisar mesmo de algum
apoio, instruções... ih, meninas! Vou dar é um trabalhão pra
vocês e pro pessoal do partido. Até a Larissa Gama vai acabar
enjoando da minha cara com o tanto de pergunta que eu vou fazer
quando a gente for às ruas... - fala Adelaide.
-Ah, isso é verdade,
meninas... essa daí é virginiana ao cubo desde que conheci. Cheia
de perguntas, curiosidade, quer saber como cada coisa funciona nos
mínimos detalhes. Enfim, uma chata útil! - brinca Cleiton.
-É... e é com essa chata que
você tá casado há vinte e cinco anos. Quem não te conhece que te
compre, Cleiton! Quem olha pra essa sua carinha de calmo, de
santinho, não sabe o demônio que você é se alguém deixa alguma
coisa desarrumada! - revida Adelaide, marota.
-Disso eu sou testemunha
ocular e posso afirmar: seu Cleiton quase tem um troço se alguma
coisa for deixada fora do lugar! - continua Renata.
-Cês querem parar com essa
besteira? Olha que eu fico magoadinho! - brinca Cleiton.
-Sabe, gente... eu tou feliz
de verdade. Nunca pensei que a essa altura da vida as coisas fossem
tomar esse rumo. Dá um frio na barriga, mas esse friozinho me faz
sentir tão mais viva! Dá gosto de viver e sonhar, pensar num futuro
melhor e que de alguma forma todas nós podemos ajudar a construir
esse futuro, tijolinho por tijolinho... - divaga Adelaide,
emocionada.
Eva e Renata se olham e olham
para Cleiton, que entendem o comando do olhar das duas.
-Montinho! - gritam os três
ao mesmo tempo, abraçando Adelaide. CORTA A CENA.
CENA 8: Rafael e Marcelo
conversam com Cláudio por conversa em vídeo através do computador.
-Que feio, mano... criticando
o Haroldo e apontando o dedo pra ele... eu fiquei sabendo disso e não
gostei nem um pouco de saber. - repreende Marcelo.
-Eu já expliquei ao Haroldo
que o que critiquei foi a hipocrisia dele. O relacionamento a três
eu acho sensacional, lindo de verdade. - justifica-se Cláudio.
-Cláudio, acontece que você
tá falando do meu irmão. E eu vou ser bem direto contigo: você não
é ninguém pra apontar o dedo pra qualquer pessoa, ainda mais depois
daquela briga bem desnecessária que você teve com o Marcelo ano
passado, quando a gente tava em Melbourne. Isso sem mencionar o que
você fez quando tava cego de raiva... preciso nem dizer, você sabe
muito bem. - fala Rafael, firme.
-Eu já me arrependi de tudo
isso, gente... eu mudei. E agora eu sei que o Marcelo é meu irmão.
Vocês podiam pegar mais leve comigo. - reclama Cláudio.
-O problema é justamente
esse, mano. Você não pensa duas vezes antes de pegar pesado com as
pessoas e acaba sempre sendo autocondescendente. Não tolera
críticas, leva pro pessoal. Se sente agredido e atacado. Não
estamos te agredindo, entenda isso... só estamos querendo que você
abra os olhos e pare de ser injusto desse jeito. Não é só sobre o
Haroldo, é sobre a Laura também... ela é sua melhor amiga e mesmo
que não tenha sido sua intenção, você acabou atacando ela. Pensa
nisso. - fala Marcelo.
Os três seguem a conversa em
vídeo. CORTA A CENA.
CENA 9: Instantes depois,
Marcelo e Rafael estão na sala com Riva, Vicente, Ivan, Marion,
Mariana e Valquíria. De repente, a campainha toca.
-Mas que inferno! Será que
essa casa virou a casa da Mãe Joana? Toda hora aparecendo alguém
aqui! - impacienta-se Valquíria.
-Eita, vó! Fazia tempo que eu
não te via incomodada! - fala Riva.
-Não tou incomodada,
querida... só acho inconveniente. São quase dez! - esclarece
Valquíria.
-Bem, se vocês vão ficar
nessa lenga lenga aí, eu vou atender. - prontifica-se Rafael, indo
até a porta e abrindo, para deparar-se com Suzanne.
-Você? Mas é muita cara de
pau, mesmo...
-Eu preciso explicar minha
versão dos fatos. Vocês não podem fechar a porta na minha cara
desse jeito. - fala Suzanne. FIM DO CAPÍTULO 107.
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