CENA 1: Marcelo e Rafael se
animam.
-Peraí... isso significa que
todos vocês estão se desligando da emissora? Foi isso mesmo que eu
entendi? - questiona Marcelo.
-Eu já estava desligada, meu
bisneto... meu contrato era por obra e acabou no dia que terminou a
novela... - fala Valquíria.
-Eu tenho contrato de longa
duração, mas estou disposta a pagar a multa rescisória. - afirma
Marion.
-O mesmo se aplica a mim. Vai
ser uma multa alta? Vai, mas nem de perto vai deixar a gente
quebrado... - fala Vicente.
-Eu não tinha pensado nisso,
gente... mas meu contrato também é de longa duração... vai ser
uma multa e tanto, mas... ando tão desgostoso com o rumo que a
emissora anda tomando que pago o dinheiro que for preciso pra me
desligar dela... - fala Rafael.
-Que sorte, a minha... no
final eu fico de boas, que nem a bisa... - fala Marcelo.
-Eu é que vou encontrar
problemas, acho... - fala Riva.
-Ah, gente... nós temos tudo
para nos sairmos super bem dessa. Não digo nem que vai ser volta por
cima porque a gente sequer vai afundar. Na verdade... eu vim
amadurecendo uma ideia faz algum tempo e ela voltou a martelar na
minha cabeça depois da conversa de mais cedo... - fala Vicente.
-E que ideia é essa que você
faz tanto mistério e nem contou pra mim ainda? - pergunta Riva.
-Pois agora vou contar a todos
vocês: na realidade, é um sonho antigo. Como vocês sabem, sempre
me interessei por esse universo de entretenimento, de fazer
televisão, dirigir, produzir... como a internet anda crescendo
vertiginosamente nos últimos tempos, principalmente depois da
popularização dos serviços de streaming, é meio notório que as
emissoras da velha mídia estão sofrendo uma espécie de
derretimento na audiência, o que é um processo natural, diga-se de
passagem... assim foi quando a própria TV surgiu e passou a ameaçar
o império do rádio. Os grandes empresários, donos de verdadeiros
impérios e ligados à ultra direita quase que via de regra, fizeram
de tudo para boicotar a TV. Por outro lado, a própria chegada da TV
aqui no Brasil, como vocês sabem, foi uma ação visionária e muito
bem paga pelo Assis Chateaubriand, que era um sujeito milionário. A
TV, nos seus primórdios, começou por um capricho, aqui nesse país.
Só que com a internet esse caminho foi completamente diferente...
embora seja algo que existe há décadas e décadas, a popularização
se mostrou democrática e espontânea, reflexo do crescimento num
geral, do aumento do poder de aquisição das camadas da sociedade
que eram, até então, excluídas. Bem... desculpem por falar esse
monte de coisa pra explicar, mas tudo isso foi pra deixar bem claro
qual é meu projeto: eu quero abrir uma produtora independente de
conteúdo dramatúrgico. Pode ser aqui no terreno da nossa casa
mesmo, já que ele é gigantesco e há um imenso espaço inutilizado.
Penso num pequeno complexo de estúdios. Sem concessão pública, sem
nada disso: o investimento inicial sai dos nossos bolsos... a gente
vai produzindo na medida do possível, esperando que a coisa dê
certo. - explica Vicente.
Todos se empolgam com a ideia.
-É brilhante isso, amor! -
vibra Riva.
-Sempre confiei no potencial
do meu grande amigo! - afirma Marion.
-E eu tou super empolgado com
isso, Vicente! Seria um sonho produzirmos conteúdo dramatúrgico sem
passar por censura nenhuma! - fala Rafael.
Todos seguem conversando sobre
a ideia de Vicente. CORTA A CENA.
CENA 2: Márcio chega em casa
junto com Raquel e ela o recebe com um abraço.
-Nossa, pensei que não morava
mais nessa casa. Me fala, meu filho... foi bom passar esses dois dias
lá no meu neto?
-Maravilhoso e emocionante.
Ele me chamou de pai pela primeira vez, acredita? Todo cheio de amor,
me pergunto se mereço tudo isso.
-Claro que merece, meu
querido. Merece todo o amor do mundo. E espero muito que você
encontre uma mulher boa pra você, que te faça esquecer de uma vez
por todas da Suzanne.
-Queria ter essa certeza, mas
vou ser sincero com você, mãezinha... acho que nunca vou encontrar
uma mulher que me encante. Já desisti disso.
-Você tá moço ainda,
querido. Entrando recém nos quarenta... tem uma vida linda pela
frente. Não é justo você se privar de amar dessa maneira.
-Vai por mim, dona Raquel...
todo o amor que existe dentro de mim já se concentra pelos meus
filhos e pela Suzanne. Os meus filhos eu posso amar sem sofrer, já a
sua filha...
-Não é justo com você isso,
Márcio. Definitivamente não é. Você sempre foi uma pessoa boa, de
bom coração. Eu sempre enxerguei isso, mesmo quando todos duvidaram
de você.
-E eu vou ser eternamente
grato por isso... de verdade. Eu não sei até onde vai minha
capacidade de amar, mas eu sinceramente não estou interessado em
encontrar alguém.
-Pois deveria estar, meu
filho... eu vejo estampado no seu rosto que você sofre por causa
disso...
-Eu escolhi esse sofrimento
quando aceitei me deixar envolver pela Suzanne.
-Continuo a te dizer que nada
disso é justo com você mesmo. Você não pode passar a vida inteira
se maltratando por um amor fadado ao fracasso. Você amou e isso
basta.
-E ainda amo. Não tenha
dúvidas disso.
-Mas esse amor não te faz
bem, meu querido. Amor só é bom se nos fizer sorrir...
-Independente do que a Suzanne
é... eu não sei deixar de amá-la.
-Isso é amor incondicional.
Viva com esse sentimento se quiser, meu filho. Mas não permita que
esse sentimento seja qualquer coisa maior do que sua própria
dimensão, tá me ouvindo? Você pode escolher não sofrer, se não
quiser mais sofrer. Quando o amor é amor, o simples fato de amar já
basta. Lembre-se disso, tá? E não se esqueça de amar a si mesmo em
primeiro lugar.
-Eu tento, dona Raquel... mas
ainda é tão difícil, sabe?
-Ninguém disse que a vida era
fácil... não é para amadores. Mas você já provou que é forte.
Cedo ou tarde, vai superar tudo isso.
-O seu otimismo me contagia,
mãezinha...
-E é pra contagiar, mesmo.
Onde já se viu um homem bonito desses sofrendo por causa de uma
mulher que não vale nada? Dá cá um abraço, vai!
Márcio abraça Raquel. CORTA
A CENA.
CENA 3: Na manhã do dia
seguinte, Mara acorda e estranha ver Valentim acordado antes dela,
tomando uma caneca de café e pensativo na sala.
-Nunca te vi se levantar antes
de mim, querido... e com essa cara de quem tá pensando na morte da
bezerra, posso apostar cem reais que você tá com alguma coisa
martelando forte na sua cabeça...
-E tou, Mara... eu me acordei
com esse pensamento. Na realidade, mal dormi. Eram umas quatro da
manhã quando eu comecei a pensar nisso...
-Do que se trata, Valentim?
-Fiquei pensando sobre a fuga
do Guilherme.
-Depois sou eu que insisto
nesse assunto. Tá vendo como eu tinha razão? Só não peço palmas
porque eu mereço o Tocantins inteiro...
-Sem gracinha, sagitariana
piadista. Eu tou começando a crer que ele tenha deixado o país.
-Baseado no que você acredita
nisso? Porque olha, por mais que eu seja uma excelente observadora
por cacoete profissional, o psiquiatra aqui ainda é você, então
pode falar que eu quero entender suas teorias...
-Bem, querida... não são
exatamente teorias. São observações do padrão comportamental
dele. O Alceu me passou algumas informações há algum tempo.
-E do que se trata essas
informações?
-Basicamente falam sobre o
comportamento escapista do Guilherme.
-Até aí, novidade nenhuma...
a negação da realidade é meio comum em vários momentos na vida de
um esquizofrênico, não?
-Não é só isso, Mara... o
Alceu relatou que, durante alguns surtos, Guilherme inventava novas
realidades.
-E numa dessas ele poderia
tomar a decisão de se mandar e recomeçar a vida... é isso?
-Exatamente.
-Espero mesmo que você esteja
certo. Vai ser melhor pra todos. Agora quer fazer o favor de me
acompanhar no café da manhã?
Valentim se diverte com Mara.
CORTA A CENA.
CENA 4: Suzanne é acordada
pela campainha tocando.
-Mas que merda! Se for alguém
daquela família chata de comercial de margarina eu juro que meto a
mão na cara e ainda chamo a segurança! - esbraveja Suzanne,
vestindo um robe e indo à porta.
Ao abrir a porta, depara-se
com um homem.
-Bom dia. Quem é você? -
pergunta Suzanne.
-Sou Gustavo Marcolino,
oficial de justiça. - fala o homem.
-Ih, lá vem bomba. Qual é a
bronca, Gustavo?
-Você está sendo intimada a
comparecer na delegacia para prestar esclarecimentos ao delegado às
dezesseis horas. Aqui na intimação estão todas as informações
que você precisa saber. É sobre suas contas no exterior, dona
Suzanne. Esteja na delegacia pontualmente às dezesseis horas, pois
caso contrário você será conduzida coercitivamente. - fala
Gustavo.
-Não precisa se preocupar...
Gustavo é seu nome, né?
-Isso.
-Fique sossegado. Não sou
mulher de fugir da raia. Estarei lá antes mesmo da hora marcada.
Passar bem, rapaz.
Suzanne fecha a porta e fica
apreensiva. CORTA A CENA.
CENA 5: Antes de saírem para
ensaiar, Laura, Mateus e Haroldo acertam os últimos detalhes para a
gravação de um novo vídeo, dessa vez com a participação dos três
e não somente de Laura, para o canal dela.
-Tá tudo ok, meninos? -
pergunta Laura.
-Quase lá, amor. Mateus,
senta ao lado dela que eu sento do outro lado e confiro aqui depois
se o enquadramento pegou todo mundo... - fala Haroldo.
Mateus se senta de um lado e
Haroldo do outro. Rapidamente Haroldo confere que está tudo certo.
-Então é isso, queridos...
gravando! Depois a gente edita isso tudo aqui. Prontos? - fala
Haroldo.
Laura começa a falar.
-Oi galerinha do bem! Espero
que não tenham sentido muita saudade de mim. Prometo que vou levar
menos tempo pro próximo vídeo. Como vocês podem ver, hoje ao meu
lado estão Mateus e Haroldo, os homens da minha dúvida. Assim, não
que vocês precisem ser apresentados a Mateus Viveiros, mas na
dúvida... - fala Laura, descontraída.
-Pois é, pessoal! Vocês me
conhecem da TV e aqui estou eu falando abertamente sobre o
relacionamento que tenho com Laura e Haroldo. Sim, eu namoro os dois!
- afirma Mateus, se sentindo à vontade.
-E eu sou o Haroldo, a outra
ponta desse triângulo. Amo esses dois de um jeito que nem vale a
pena tentar comparar. É algo indescritível. Pra quem não sabe, sou
o filho mais velho de Ivan Bittencourt e, consequentemente, irmão de
Rafael Alves. - fala Haroldo.
-Bem, feita essa apresentação
dos amores da minha vida, queria falar sobre um outro amor que está
surgindo nas nossas vidas. Antes que vocês, safadinhos, pensem que
tem mais alguém com a gente, se engana: eu descobri recentemente que
estou grávida. Isso mesmo, galerinha do bem! Vou ser mãe! Porém, é
importante a gente falar sobre a legalização do aborto: não é
porque eu decidi levar essa gravidez adiante que me torno contrária
à legalização. Como bem sabemos, a legalização é uma questão
urgente e de saúde pública...
Laura segue falando. CORTA A
CENA.
CENA 6: Horas depois, Márcio
liga para Cláudio.
-Que surpresa você me ligar!
Tudo bem com você, pai?
-Tudo indo, né filho... eu
sei que você não gosta que eu fale na Su...
-Nem continua, por favor. A
única coisa que aquela mulher fez por mim foi me colocar nesse mundo
e eu não quero falar sobre ela.
-Tá certo. Liguei pra saber
como estão as coisas por aí, como vai a sua sogra.
-Graças a Deus a dona Vânia
não teve mais nenhuma crise renal das bravas. Mas mesmo assim
estamos procurando uma maneira de colocá-la na diálise novamente,
mas essa mulher é teimosa...
Vânia escuta Cláudio.
-Ei! Eu ouvi isso, meu genro!
Sou teimosa mesmo, sou teimosa pra caramba! - grita Vânia.
-Tá vendo? Mas é esse humor
que você pode ver pessoalmente. Uma delícia de se ter por perto.
-Sabe, filho... queria saber
se você me perdoou de coração por tudo...
-Estou aprendendo a lidar com
tudo, pai. Eu não tenho o que perdoar. Nós dois fomos vítimas esse
tempo todo. Você pela sua omissão causada pelo amor cego e eu por
ter sido abandonado. Mas águas passadas não movem moinhos.
-Verdade, Cláudio...
-Bem, eu vou precisar desligar
agora que eu acho que a máquina de lavar tá com problema. A gente
vai se falando, pai. Beijo!
-Te amo, filho.
-Eu também, pai.
CORTA A CENA.
CENA 7: O delegado ouve
Suzanne depor e depois de alguns instantes, faz as últimas
perguntas.
-Então está certo, dona
Suzanne. Até o momento não chegamos a nada que te incrimine de
fato. - diz o delegado.
-Eu estou dizendo a verdade,
delegado. Minhas contas no exterior, a maior partes dela na Suíça,
são inteiramente legais. Não tem nada de ilícito porque elas
sempre foram declaradas.
-De fato, Suzanne. Desde que
foi inciada a investigação, pudemos averiguar que a procedência
dessas contas aparentemente é legal.
-Não teria motivos pra não
ser. Assim como eu não teria motivos para mentir para um homem
bonito como você...
-Por favor, dona Suzanne,
contenha-se. Estou trabalhando.
-Tá bem, seu delegado... era
só um elogio, não precisa ficar ofendido.
-Prossigamos... bem, apesar de
nada apontar para algo de ilícito, o inquérito não será fechado.
Você permanecerá a ser investigada.
-E as minhas contas bancárias?
-Uma vez provado até segunda
ordem que não há nada de ilegal, suas contas bancárias serão
desbloqueadas.
-Menos mal. E o meu
passaporte?
-Esse continuará retido. Você
não tem permissão para deixar o território nacional.
CORTA A CENA.
CENA 8: No consultório de
Valentim, Mara conversa com ele sobre Guilherme.
-Eu sei que você tem seus
motivos para acreditar que o Guilherme foi pra longe, mas...
-Mas o que, Mara?
-Eu não sei se ele realmente
teria feito isso. Talvez você esteja subestimando a inteligência
dele.
-De forma alguma. Eu sei que
ele é extremamente articulado e inteligente. Dissimulado também.
-Justamente, querido... você
mesmo admite tudo isso. Você não acha que ele pode estar preparando
o bote? Desculpa falar, mas acho que esse silêncio nos dá mais
motivos pra preocupação do que qualquer outra coisa.
-O pior é que você pode
estar certa. Mas vamos tentar ser otimistas.
-Ninguém nessa vida é mais
otimista que eu. Só que otimismo não combina com nossa profissão e
muito menos vai mudar o caráter de um bandido.
-Eu sei de tudo isso, Mara...
me expressei mal. Você sabe que eu não seria imprudente.
-Mas está a um passo de ser,
se mantiver as coisas imóveis como estão. E a proteção pros
meninos, que ainda não foi solicitada?
-Eu vou providenciar isso,
querida... fique sossegada.
CORTA A CENA.
CENA 9: Horas mais tarde, a
imprensa chega à mansão dos Bittencourt, convocada por Marion.
-Vem por aqui, queridos... no
salão de habitualmente. - indica Marion.
Os jornalistas, repórteres e
fotógrafos se acomodam no salão de festas da mansão. Marion começa
a falar.
-Bem... já que todos já
estão aqui presentes, eu gostaria de fazer um comunicado importante.
Aliás, não somente eu, como meu filho Rafael, meu amigo Vicente,
minha sobrinha Riva e minha mãe Valquíria. - fala Marion.
-E sobre o que seria esse
comunicado? - pergunta uma jornalista.
-Circulam rumores de que você,
Marion, anda estremecida com o pessoal da emissora. É verdade? -
pergunta outro jornalista.
-Não passam de boatos. Sempre
tive uma boa relação com todo o pessoal. No entanto, chamei vocês
aqui hoje para comunicar que nós todos estamos nos desligando da
emissora.
Cria-se um burburinho entre a
imprensa. FIM DO CAPÍTULO 118.
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