CENA 1: Suzanne faz expressão
de arrependimento e Márcio fica em dúvida, sem nada dizer.
-Vamos, Márcio... eu preciso
que você me dê um voto de confiança. Eu mudei.
-Mudou como da outra vez, logo
que eu saí da prisão? Lembra que fui preso por sua culpa? E que
seis meses depois da minha libertação você já tava me envolvendo
de novo nos seus golpes? Qual motivo eu teria pra acreditar em você,
Suzanne?
-E qual motivo teria pra não
acreditar? A gente se amou tanto! Me deixa entrar, por favor...
-Tá certo. A casa é da sua
mãe, não é minha. Mas como é que você tem coragem de falar em
nosso amor? Eu fui o único que te amou, desde o primeiro dia. Você
nunca amou ninguém nessa vida além do seu pai. E você matou ele...
eu já sei de tudo.
-Eu não tenho mais motivos
pra te esconder nada. Eu vou provar que estou mudada te contando toda
a verdade.
-Vá em frente...
-Sim, a única pessoa que eu
amei de todo meu coração foi meu pai. E ele me traiu, me mentiu. Eu
era uma criança, Márcio, você tem noção disso? Não deve ter,
porque você não estava lá ainda. Eu não admitia mentiras... meu
pai sempre me dizia que o único caminho era a verdade, sempre. E ele
mentiu pra mim com a cara mais lavada dizendo que eu era a única
filha, quando eu já sabia da bastarda. Essa bastarda era a Riva,
como você sabe. Eu nunca me senti tã traída na vida como naquele
momento... meu herói era uma farsa, uma mentira. Morreu pra mim.
Então eu resolvi que ele tinha de morrer, dessa vez de verdade. Não
suportei saber que não era mais a única. E é por isso que eu quis
tudo o que é da Riva. Ela tem uma vida que deveria ser a minha. Ela
roubou de mim o maior tesouro que eu tinha, que era a confiança no
meu pai. Mas eu tou cansada de tudo isso... cansada de dar murro em
ponta de faca e só me ferrar por isso. Quero deixar a vida de golpes
pra trás e não estou mentindo... eu já sou rica e agora minhas
contas estão desbloqueadas. Se tudo der certo, logo eu posso deixar
o país.
-Muito comovente todo esse
discurso, Suzanne... mas algo me diz que você só veio fazer esse
discurso cheio de apelo emocional pra me induzir a retirar a queixa
contra você. Desiste, Suzanne... mesmo que eu retire a queixa agora,
o inquérito contra você já corre independente disso.
-Eu pago pelo que for preciso.
Vou presa se for o caso. Mas eu quero aprender a amar de novo... e
você sempre me amou, não me amou?
-Amei e amo, Suzanne. Mas
nesses mais de vinte anos, quem se fodeu nessa história fui eu. Você
sempre cheia de ardis, de truques... escapou todas as vezes de ser
pega. Não houve sequer numa queixa contra você. Você permitiu que
eu fosse preso por crimes que você cometeu. Eu assumi a culpa pra te
proteger, por amor a você. Tenho motivos de sobra pra não acreditar
nessa sua súbita mudança. Já vi esse filme antes e sei exatamente
como ele termina.
Nesse momento, Raquel chega em
casa.
-Suzanne, o que cê tá
fazendo aqui? Não te chamei! - fala Raquel, espantada.
-Saudade de você também,
mãe... como vai a senhora? - ironiza Suzanne.
-Não venha com suas
gracinhas, Suzanne. Estou exausta de mais um dia de trabalho e sem a
mínima paciência. Ponha-se daqui pra fora. - fala Raquel.
-Isso mesmo, Suzanne. Você
ouviu sua mãe: vá embora. E não volte a nos incomodar. Eu não
acredito mais em uma palavra que você diga... - fala Márcio.
Suzanne vai embora.
-Muito bem, querido. Nada de
cair no jogo dela outra vez! - fala Raquel.
CORTA A CENA.
CENA 2: Rafael e Marcelo
contam a Riva e Marion sobre vídeo gravado por Rafael denunciando as
ações arbitrárias do filho do dono da emissora.
-Gente, o negócio foi o
seguinte: eu ajudei o Rafa a gravar um vídeo que deve ser colocado
no ar ainda hoje. - fala Marcelo.
-Mas até aí não tem nada
demais, vocês já fizeram isso antes... - fala Riva.
-Ocorre, prima, que esse vídeo
que eu gravei foi denunciando todas as arbitrariedades do João
Bernardo Salinas Filho... - esclarece Rafael.
-Ai, meu filho. Pra que
comprar essa briga que nem sua é? Essa briga é minha... - fala
Marion.
-Não podia ficar parado, não
sabendo que essa tentativa de te processar é completamente
arbitrária. A intenção é jogar pra todo mundo saber, inclusive o
pai dele, que deve estar por fora de tudo isso. - fala Rafael.
-No começo eu fiquei
preocupado, porque as coisas que o Rafa disse foram nitroglicerina
pura, mas depois que a gente conversou eu compreendi que esse pode
ser um bom meio de fazer aquele atirador de ovos podres se colocar no
seu devido lugar. - complementa Marcelo.
-Peraí... o que exatamente o
Rafael disse nesse vídeo? Não vai dizer que falou de todos os
podres dele... - assusta-se Marion.
-Um por um. Enumerei todas as
barbaridades que ele faz, de jogar frutas estragadas e ovos podres
por “diversão” em mendigos e travestis a dar em cima das atrizes
jovens, prometendo destaque na emissora, enquanto a mulher dele, a
coitada da Andréa Fagundes, finge que não vê nada disso, mas sofre
calada. Falei mesmo porque tenho como provar cada palavra que digo. -
fala Rafael.
-Você tem noção que com
essas informações jogadas pro Brasil e pro mundo inteiro, você
pode acabar sendo processado também? - questiona Marion.
-Não parei pra pensar muito
nisso. O que eu não podia era permanecer calado diante dessa
arbitrariedade que ele tá fazendo com você, mãe. Usando do nome,
da influência e do dinheiro para comprar a justiça. Isso não é
coisa que se faça. E eu falei sobre os erros judiciais desse
processo no vídeo também porque andei lendo bastante sobre leis e
direitos. - fala Rafael.
-Querido, eu entendo que sua
intenção seja ótima, mas você não acha que isso pode acabar
queimando a imagem da sua mãe e ainda por cima acabar queimando a
sua própria imagem? - questiona Riva.
-Imagem por imagem a gente já
tá bem distante do joguinho de aparências que um dia foi vivido
dentro dessa casa. O que vier, positivo ou negativo, é consequência
das nossas próprias escolhas. Somos adultos o suficiente pra saber
disso. - fala Marcelo.
-A gente conversa melhor sobre
isso depois, tá? Agora eu já tou meio derrotado de cansaço e
preciso dormir. - fala Rafael.
Marion e Riva deixam o quarto
dos dois. CORTA A CENA.
CENA 3: Na manhã do dia
seguinte, Marcelo e Rafael visitam Cláudio.
-Oi, mano! Ansioso esperando a
alta do Bruno e da mãe dele? - fala Marcelo.
-Nem me fala, mano... morrendo
de ansiedade. Entrem, seus viados lerdos, não vão ficar a vida toda
aí parados feito dois entregadores na minha porta, né? - fala
Cláudio.
Marcelo e Rafael entram.
-Não era pro seu Setembrino
estar aqui? - pergunta Rafael.
-Era sim, mas ele pegou um
táxi assim que amanheceu pra visitar o Bruno e a dona Vânia, daí
já viu... fiquei eu aqui cuidando da casa, nada que eu já não
esteja bem acostumado... - fala Cláudio.
-Mas então quer dizer que a
senhora tá se dando super bem com nosso pai agora? Que viada mais
ladina, Deus do céu, nem chama a viada irmã pra participar desses
momentos... mas tenho meus informantes... - brinca Marcelo.
-Se enxergue, mulher! Tá
achando que sou bagunça? Sou toda trabalhada no perdão, segura essa
marimba! - segue Cláudio, na brincadeira.
-Mereço! Vocês quando se
encontram não conseguem segurar o deboche, mesmo... - fala Rafael,
rindo.
-Não mesmo! Viaaaado, se tu
soubesse de cada uma que essa viada que casou contigo já causou na
vida! A última antes de vocês se apaixonarem foi deixar a dona Riva
dar uma surra maravilhosa do Ricardo, o ex dela, que tava traindo ele
pra todo mundo ver na praia de Copacabana. Babado, confusão e
gritaria até não poder mais! - fala Cláudio.
-Aliás... mano, você já se
deu conta que com essa confusão toda sobre a sua mãe biológica,
esquecemos de concluir uma coisa meio óbvia? - questiona Marcelo.
-O que, que a Riva é minha
tia? Eu já tinha pensado nisso. Mas é tanta coisa acontecendo ao
mesmo tempo que eu fico toda Zileide: “me perdi aqui, desculpe,
vamos tentar” - fala Cláudio.
Os três seguem conversando.
CORTA A CENA.
CENA 4: Poucas horas depois,
Mara e Valentim estão no consultório de Valentim.
-Não adianta, Mara. Por mais
que eu tenha mandado vários homens, não há nenhum rastro de onde o
Guilherme possa estar.
-Pra mim é mais que certo que
na cidade ele está. E mais perto do que a gente imagina.
-Eu tenho certeza disso,
Mara... mas o grande desafio aqui tá sendo tentar descobrir
esconderijos possíveis.
-No apartamento que era dele,
será que ele não se esconderia?
-Meio impossível, querida.
Está interditado pela polícia.
-Disso eu sei, mas queria
saber quando foi a última vez que a perícia esteve lá. Mais de
duas semanas, não é? Desde então aquele apartamento ficou fechado,
porque já recolheram de lá computadores, anotações, tudo o que
seria do nosso interesse investigativo. Enquanto o imóvel não for
novamente colocado a venda, poderia perfeitamente servir de
esconderijo pra ele, sim.
-Você não acha que está
indo um pouco longe demais, Mara? Eu sei que você é bem intuitiva e
quase sempre soluciona os casos, mas o Guilherme não seria burro de
fazer uma coisa dessas. A não ser que ele esteja debochando da nossa
cara, subestimando nossa inteligência.
-Me diga você, Valentim, como
psiquiatra: você acha que ele teria esse traço no comportamento?
-Não sei, Mara... isso ainda
precisa ser revisto...
Os dois seguem conversando
sobre o possível paradeiro de Guilherme. CORTA A CENA.
CENA 5: Procópio chama Laura,
Haroldo e Mateus para conversar.
-Queridos, acabei de receber
as críticas do pessoal que assistiu vocês aquela noite. - comunica
Procópio.
-E então, o que eles
disseram? - pergunta Laura.
-Foram só elogios ao texto
que nós criamos juntos e sobre a maneira como foi feita a abordagem
sobre o tema. Flaviana Maltarolli, a mais conceituada crítica de
teatro, disse que o ponto forte da peça foi tratar sobre a poligamia
de uma maneira simples e natural, como a coisa deveria ser encarada
pelas pessoas, sem as viseiras do conservadorismo influenciando em
opiniões sobre a obra, que deve ser encarada como uma inovação
artística, mesmo nos dias de hoje. E ela foi mais longe ainda: se
rasgou em elogios à interpretação do Haroldo! - afirma Procópio.
-Que? Como é que é? Justo eu
que nunca fui ator antes? - espanta-se Haroldo.
-Flaviana disse que sua
característica principal é ser orgânico sobre o palco. Enalteceu e
elogiou sua entrega na pele de Maurílio. E destacou sua personagem
como o grande fiel da balança que media os conflitos entre Sandra e
Valter... - continua Procópio.
-Gente... eu sabia que voltar
a fazer teatro seria bom, mas isso é maravilhoso! - vibra Mateus.
-E tem mais, gente: vocês,
Mateus e Laura, foram elogiadíssimos por todos pela entrega aos
papeis de Valter e Sandra. Flaviana destacou que seu personagem,
Laura, parecia estar sempre à beira de um ataque de nervos,
exatamente como o texto pedia. - fala Procópio.
-Só falta definir a estreia
da nossa peça, dessa vez pra valer! Ai gente, eu fico muito feliz de
ver que tudo foi tão bem! Espero que também seja um sucesso de
público! - fala Laura.
CORTA A CENA.
CENA 6: Riva desabafa com
Vicente.
-Riva, pode me falar o que tá
se passando pela sua cabeça, amor... eu tou vendo que a preocupação
está estampada no seu rosto...
-Fico preocupada com a
Suzanne, amor.
-Mas por que? Ela não foi
desmascarada?
-Não é por isso, Vicente. É
por tudo o que a gente acabou descobrindo antes e depois dela ser
desmascarada. A cisma dela comigo é algo que vem desde a infância e
eu nem sabia quem ela era... mas ela sabia quem eu sou... e o que eu
represento. Na cabeça dela, eu represento a prova da traição do
pai dela. Ela matou o pai por causa disso...
-Frederico também era seu
pai, amor...
-Não o reconheço como tal,
mas enfim. Meu medo é que ela não tenha desistido de me destruir. E
que agora queira mais vingança ainda, depois da humilhação que eu
fiz ela passar.
-Sossega... ela pode ser
qualquer coisa, menos burra. Ela já tá sendo investigada e não
pode deixar o país. Não seria o momento mais favorável pra ela
tentar nada.
-Tomara que você esteja
certo, amor...
-Certo ou errado, não quero
te ver assim.
-Prometo que vou tentar tirar
isso da cabeça. Essa maluca já fez muita merda com a minha vida e
com a vida do Cláudio, que no final das contas, veja você, é meu
sobrinho...
-Não podemos esquecer do
Márcio, a maior vítima dela.
-Verdade...
-Vem cá, amor... vem cuidar
do nosso filho comigo.
CORTA A CENA.
CENA 7: Horas depois, Laura,
Mateus e Haroldo se preparam para deixar a companhia de teatro e
Procópio novamente os chama.
-Eu sei que vocês devem estar
apressados, afinal de contas o Mateus tem o que fazer ainda hoje, mas
gostaria de passar pra vocês ainda hoje sobre a estreia da peça:
ela vai acontecer depois de amanhã e não vai ser aqui no Rio... -
comunica Procópio.
-Como assim não vai ser aqui?
A gente vai viajar com a peça logo na estreia? - espanta-se Haroldo.
-Sim, gente. Nossa estreia vai
ser no Theatro Municipal de São Paulo. - fala Procópio.
-Gente, que delícia! Eu
sempre quis atuar lá! - vibra Laura.
-É o sonho de todo ator! -
fala Mateus.
-Mas não é só isso,
queridos... a ideia é que depois de uma semana em São Paulo sigamos
para outros teatros pelo Brasil, de acordo com o desenrolar das
coisas, vai depender de quem vai se interessar pela apresentação da
peça... - fala Procópio.
-Eu tou entendendo direito ou
na minha estreia como ator a gente já vai sair em turnê pelo
Brasil? É isso mesmo? - pergunta Haroldo.
-Exatamente, amor. Agora você
nos dê licença, Procópio... estamos muito felizes, mas o Mateus
tem pressa pra resolver a questão dele hoje... - fala Laura.
Os três saem empolgados do
teatro. CORTA A CENA.
CENA 8: Laura, Mateus e
Haroldo estão em casa.
-E aí, querido... conseguiu
mandar o e-mail pra emissora? - pergunta Laura.
-Acabei de terminar. Tou
mandando. - fala Mateus.
-Você pode ler pra nós,
amor? - pergunta Haroldo.
-Claro! Eu escrevi o seguinte:
“Boa noite, pessoal da emissora. Hoje eu mando esse e-mail
anunciando que estou me desligando da emissora e estou disposto a
arcar com toda a multa por rescisão antes do término oficial do
vínculo empregatício. Queria deixar aqui meu agradecimento a todos
os amigos que fiz ao longo desses anos na emissora, mas esse ciclo na
minha vida chegou ao fim. Foi importante para meu crescimento como
ser humano e como ator, mas não posso mais permanecer numa emissora
que esconde da grande mídia pessoas que, como eu, são LGBT.
Acredito que vocês também não queiram mais ter minha imagem
associada à empresa de vocês, já que assumi publicamente meu
relacionamento com um homem e uma mulher ao mesmo tempo. Mas não é
esse o único motivo pelo qual estou me desligando da emissora: estou
me desligando porque desde que sofri a tentativa de assassinato,
passei a reavaliar muitas coisas na minha vida. Eu amo a arte de
atuar, de encantar pessoas. Mas não é a fama que eu busco...
durante muito tempo foi o que eu busquei. Tive um ego desmedido, mas
hoje não vejo mais necessidade de me reafirmar diante de mim mesmo.
Redescobri meu amor ao teatro e é nisso que estou investindo nesse
momento. Meus sinceros agradecimentos a todos os autores que me
concederam papeis maravilhosos na TV. Desejo uma vida longa e
próspera à emissora. Mas hoje, nesse momento da minha vida, minhas
prioridades são outras. Assim que possível, comparecerei no RH para
acertar meu desligamento.
Boa sorte pra quem fica,
Mateus Viveiros”... enfim,
amores... foi isso. O que acharam?
-Você tá de parabéns,
Mateus! - fala Laura.
Haroldo e Laura abraçam
Mateus, em apoio à sua decisão. CORTA A CENA.
CENA 9: Marion chega à
emissora e alguns ex-colegas a cumprimentam.
-Queridos, eu adoraria passar
um tempinho conversando com vocês aqui, mas tou com bastante pressa
e vim aqui resolver um assunto sério. - fala Marion.
Marion segue pelos corredores
da emissora em passos firmes.
-Se aquele filhinho de papai
pensa que eu vou deixar ele vencer aquele maldito processo contra
mim, é porque ele ainda não conheceu a Marion Bittencourt
enfurecida, mas não conheceu mesmo! - diz Marion a si mesma.
Marion bate na porta do dono
da emissora.
-Pode abrir! - fala o dono da
emissora.
Marion entra.
-Que bom te ver aqui, querida!
-Eu vim aqui falar algumas
coisas sobre o seu filho. - sentencia Marion.
FIM DO CAPÍTULO 124.
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