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quarta-feira, 12 de outubro de 2016

CAPÍTULO 129

CENA 1: Suzanne se finge de desentendida.
-Não sei do que cê tá falando, mãe. Não acredito que você veio me perturbar a essa hora da noite pra me falar de um absurdo desses.
-Chega, Suzanne. Não adianta negar nada pra mim. Você foi amante do Altamir sim!
-Você já está começando a ficar maluca, dona Raquel. O que te deu pra afirmar uma coisa dessas, mãe? Sabia que eu podia mover um processo contra você, se você tivesse feito essa acusação diante da polícia?
-Não vou cair no seu jogo agora. Sabe como que eu descobri? Porque Valentim investigou e chegou ao nome do Altamir. Descobriu que o homem que foi o responsável pelo seu enriquecimento não passava de laranja dele. Percebe como não existe crime perfeito, Suzanne? Você pode não ter deixado furos, mas o laranja do Altamir deixou!
-E só por causa disso você veio aqui, mãe? Ora, tenha paciência! Você é praticamente uma senhora sexagenária, deveria estar na sua casa dormindo ou tricotando, fazendo coisa de velha!
-Eu exijo que você me diga como conheceu esse cara! Ele era o fundador da facção que o Guilherme se tornou chefe anos depois. Você me deve explicações sobre isso.
-Desde quando eu te devo alguma coisa? Eu só falo diante de um juiz, isso se eu chegar a julgamento, o que eu duvido muito. Como eu sei que você é impulsiva, é meio previsível que você tenha vindo aqui sem sequer um único mandado.
-Mas ainda sou sua mãe. Ou agora deixei de ser sua mãe?
-E por qual motivo eu te contaria qualquer coisa se eu sei que você, minha própria mãe, está conspirando pra me colocar na cadeia?
-Não se superestime, Suzanne. Ninguém conspira contra você. O que você chama de conspiração, eu chamo de justiça. Conhece? Ela é pra todo mundo, não pense que pelo fato de você estar rica algo vai mudar. Os rigores da lei são para todos.
-Isso é lindo na teoria, mãe... mas na prática só fica pobre na cadeia. Preto e pobre. Eu sou branca e rica, não vou mofar na cadeia, pode apostar!
-Você não se envergonha de nada? Não se envergonha de ser racista?
-De onde que você tirou que eu sou racista? Só falei de como funcionam as leis nesse país. O pobre e o preto sempre se fodem. É alguma mentira?
-Vamos mudar o foco. Você foi ou não foi amante do Altamir?
-Fui.
-E o que exatamente você sabe dessa facção?
-Tudo o que eu sei é que ela foi fundada ainda nos anos setenta, quando Altamir não passava de um jovem empresário pra sociedade.
-Ah, então quer dizer que a empresa dele sempre serviu de fachada pra facção, é isso?
-Deve ser. Eu não era nem nascida na época que tudo começou, então né? É aquele ditado, vamos fazer o que?
-Aff, minha filha, você não ouse citar Inês Brasil num momento sério como esse. Você teve ou não teve participação nessa facção?
-Não tive, mas a senhora parece sem a mínima disposição de acreditar em qualquer coisa que eu diga.
-E por acaso eu teria algum motivo pra acreditar em você depois de tantas mentiras? Eu tou te dando a oportunidade de me falar a verdade pelo menos uma vez na vida. Você trabalhou pra facção ou não?
-Mãe, sério: eu sei que menti pra cacete pra senhora. Reconheço isso. Mas tou falando a verdade quando eu digo que não tenho nada a ver com essa facção. Só sei que existiu durante mais de quarenta anos. Isso é tudo o que eu sei.
-E como é que você conseguiu enriquecer tanto depois de ser amante do Altamir? Foi você que matou ele ou mandou matar?
-Pare, dona Raquel! A única pessoa que eu matei foi meu pai. Acabou por aí, nos meus doze anos.
-E você diz isso ainda com essa cara lavada.
-Queria que eu dissesse como? Com cara de lamentação? Já foi, é passado, já prescreveu o crime. Já era.
-Você é um caso perdido, mesmo...
-Então o que veio fazer aqui? Jogar esse moralismo na minha cara? Dá licença que eu estou de saída.
-Pra que? Pra aplicar mais golpes em caras que estejam emocionalmente frágeis? Ou será que você vai fazer a melhor amiga da madame em crise dessa vez? Hora dessas você encontra uma pessoa mais esquentadinha e vai estar ferrada na mão dela!
-Não te interessa o que eu vou fazer ou deixar de fazer. O que você chama de golpe eu chamo de trabalho. E tem mais: bem ou mal, eu sou consultora de etiqueta e tenho isso a meu favor. Então faz um favor, dona Raquel? Vai embora pra sua casa tricotar, fazer palavra cruzada ou caducar, mas me deixa sair.
-Eu só saio depois que você me garantir que nunca trabalhou pela facção.
-Você acha mesmo que eu vou te garantir alguma coisa? Pode esquecer. Eu já disse que não trabalhei pra essa gente. Podia ter trabalhado? Claro que podia! Convites nunca faltaram. Mas eu jamais aceitaria por um único motivo, sabe qual?
-Qual?
-Lá naquela merdinha, todo mundo aceitava ordens, era submisso. Eu nasci pra liderar, pra mandar, não pra obedecer. Espero que esteja satisfeita com minhas respostas. Agora me deixa em paz.
-Eu vou embora, mas você vai acabar sendo pega. Essa informação que o Valentim descobriu vai direto pro seu inquérito.
-Ui, tou tremendo de medo!
-Dispenso seu deboche. Aguarde e verá.
-Vai embora de uma vez!
-Não precisa pedir duas vezes.
Raquel vai embora e Suzanne ri, debochada. CORTA A CENA.

CENA 2: No dia seguinte, Márcio visita a mansão dos Bittencourt e conversa com Marcelo.
-Pena, filho... achei que ia encontrar seu irmão aqui.
-Nada! Aquele ali não para quieto. Deixou o Bruno e os pais dele aqui e foi correr atrás de emprego.
-Só ele, mesmo... nem precisa trabalhar com essa urgência toda, mas mesmo assim procura...
-É que ele é bem orgulhoso, sabe? Então melhor nem tentar dissuadir Cláudio de qualquer coisa quando ele enfia na cabeça que vai fazer. De um jeito ou de outro, ele faz.
-Você fala como se não fosse orgulhoso também, né? Vocês puxaram um pouco isso de mim, admito...
-Enfim... sabe, pai... eu fiquei sabendo pelo Valentim que a Suzanne foi amante do pai do Guilherme. É até bom que o Cláudio não esteja aqui agora...
-Verdade, filho. Seu irmão não tolera que seja tocado no nome da mãe biológica dele e com toda a razão, diga-se de passagem, porque ela realmente não presta, mas... por que esse assunto, agora?
-Então, pai... eu nem sei como te dizer, mas a verdade é que eu... bem, eu...
-Você quer saber o que eu sei sobre isso?
-É... quer dizer, não é bem isso. Não é só isso.
-E o que seria, filho?
-Eu queria saber primeiro tudo o que você sabe sobre ela ter sido amante desse pai do Guilherme... depois, se puder me dizer o que sabe a mais sobre o passado dela, sobre a maneira que ela enriqueceu, pode falar, tá?
-Filho, não me leva a mal... mas tem certas coisas que eu nem sei como dizer. Não consigo dizer algumas coisas e outras eu ainda não quero dizer. Não entenda isso como se eu estivesse escondendo alguma coisa de você, não é isso...
-Você ainda ama essa mulher, não ama? Pai, você devia ter entendido que não adianta nada disso...
-Eu sei que chega a ser atrevido da minha parte te pedir pra me respeitar, mas eu não gostaria de falar sobre ela agora, sério.
-Que isso... você tem todo o direito de me pedir que eu te respeite. Só não entendo porque você ainda insiste em proteger quem só te ferrou.
-Um dia, meu filho, eu vou conseguir falar tudo o que sei sem me sentir imensamente culpado. Até lá eu peço respeito e paciência...
CORTA A CENA.

CENA 3: Vicente acompanha a finalização das obras do complexo de estúdios de sua futura produtora e conversa com Riva a respeito.
-Estou impressionado com a competência desses profissionais que a gente contratou. Ágeis, seguiram o projeto e a planta à risca e ainda vão entregar a obra pronta amanhã! É bom demais ver o sonho da gente se tornar realidade tão rápido desse jeito... - divaga Vicente, satisfeito com tudo.
-E eu fico muito realizada de ver tudo isso acontecendo na vida da gente. De verdade. Imaginar que até menos de dois anos, eu era uma vendedora de quentinha que ralava de sol a sol pra não obrigar meu filho a trabalhar enquanto ele estudava pra ser alguém nessa vida. E veja onde eu tou agora... essa vida, esse seu amor, o nosso Lúcio que só nos enche de alegria. Tudo isso é lindo demais, sabe? Não é pelo dinheiro, porque pouco me importa ser rica ou ser pobre. É ter a sorte de um amor tranquilo com uma família que eu amo ao meu lado. Todas as contas do passado zeradas...
-Menos a conta da Suzanne, mas essa daí é caso perdido. E duvido que você considere essa sujeita como parte da família.
-Não considero e nunca vou considerar. Somos irmãs por puro acidente biológico, nada além disso. Ela nunca vai saber o que é amar, nem o que é ser mãe. Ela jogou tudo isso fora porque quis e fez tudo errado.
Os dois seguem a conversar. CORTA A CENA.

CENA 4: Horas depois, Rafael e Marcelo estão no quarto e Rafael lê uma notícia em um site.
-Olha isso, amor! Vem cá ver essa notícia!
-O que foi, Rafa? Prenderam o usurpador, foi?
-Antes fosse. Mas não é algo bom.
Marcelo lê a notícia em voz alta.
-“Defensores da maior emissora do país se revoltam contra Marion Bittencourt e sua família, postando nas redes sociais ameaças de depredação à mansão da família. Em uma das mensagens deixadas na página oficial da emissora, um usuário diz que sabe o endereço da mansão dos Bittencourt e convoca os defensores da emissora a vandalizar a mansão de Marion e sua família. Os usuários mais exaltados justificam que antes amavam Marion Bittencourt, mas que agora a odeiam porque ela teria difamado a emissora por despeito. Alegam também que a família de Marion só a apoia nisso porque alguém os deve ter comprado”... ai, amor, fecha essa notícia, não quero nem continuar a ler. Que coisa horrorosa! Que gente é essa? Eles estão realmente defendendo uma empresa capitalista que sequer dá espaço para negros e minorias? Ai, meu edy...
-Teve mais coisa que você não leu. Tem prints dessas mensagens de ódio na notícia e... bem, teve um grupo de pessoas que falou merda sobre a gente, dizendo que gay é do inferno, que o salário do pecado é a morte, aquela ladainha toda.
-Ai, nem precisava ter dito isso, amor, pra não me deixar mais revoltado ainda. Gente bem a toa... vamos ouvir uma música, esquecer dessas coisas, por favor...
CORTA A CENA.

CENA 5: Mara conta a Valentim sobre reação furiosa de defensores da emissora e conservadores.
-Cê viu que situação absurda? Não bastasse a Marion ter passado por aquele desgaste de ter quase sido processada pelo filho do dono da emissora, agora mais essa: os defensores da emissora estão ameaçando vandalizar, depredar a mansão, vê se pode!
-Tinha lido a respeito disso mais cedo. Isso já ultrapassa todos os limites do absurdo, definitivamente
-Se bem que nesses casos, esses cães ficam só a ladrar mesmo... morder, que é bom, nada.
-Mas não se esqueça que há mais gente no meio disso.
-Tinha que ter esses religiosos conservadores, pra variar. Sobrou até pros meninos o discurso de ódio. Homofobia da maneira mais nojenta de ser mostrada.
-Então você começou a perceber a dimensão da gravidade disso...
-Na verdade, não vejo onde que essa situação possa se tornar grave, Valentim. Sinceramente eu não sei.
-Você não percebe que uma multidão cheia de ódio pode realmente fazer coisas horríveis?
-Mas não acredito que seja o caso dessa vez, Valentim.
-Parece que o jogo virou, não é mesmo? Dessa vez sou eu que tou sentindo que é melhor proteger todos.
-Posso saber como?
-Solicitando proteção policial, simples assim.
-Você tá pensando em manter a mansão cercada de policiais e vigiada por causa de ameaças de internet, Valentim? Francamente...
-Francamente digo eu, parece que você não sabe do poder da internet.
-Continuo achando tudo isso um exagero sem tamanho, mas se você acha mais prudente, vai fundo.
-É exatamente isso que eu vou fazer amanhã: solicitar proteção para eles.
CORTA A CENA.

CENA 6: Horas depois, Haroldo vai à mansão e conversa com o pai.
-Nossa, pensei que tinha esquecido que tinha uma família aqui. - brinca Ivan.
-Você sabe, pai... tá tudo numa correria só. Eu morando com a Laura, vivendo esse relacionamento com ela e com Mateus, nossa peça recém-saída do forno e já virada num sucesso instantâneo...
-Aliás, da próxima vez trata de avisar antes pra gente viajar com vocês, viu?
-Pode deixar, pai. Aviso sim... mas basicamente é isso... muita correria, tudo acontecendo rápido que não dá nem tempo de pensar direito, quanto mais vir aqui visitar vocês...
-Sei. Enfim... na verdade eu ando com outra coisa matutando na minha cabeça e eu gostaria que você não levasse a mal minha pergunta...
-Lá vem bomba. Pode falar, pai.
-O filho que a Laura tá esperando... é seu ou do Mateus?
-Como é que é, sue Ivan? Por que isso te interessa? Nós três estamos juntos, tanto faz de quem essa criança é filha, mas se você quer saber, a criança é minha, porque a Laura engravidou pouco antes do Mateus começar a namorar com a gente. Satisfeito?
-Desculpa, filho... não queria deixar você assim.
-Não fiquei bravo, só fiquei perplexo com a sua curiosidade. Por que isso te interessaria, pai?
-Porque eu queria saber se realmente vou ser avô, só isso.
-Você seria avô de qualquer maneira, fosse esse filho biológico ou não.
-Desculpa, Haroldo... de verdade, eu fui um tolo.
-Não precisa pedir desculpa, pai... só achei desnecessária essa sua pergunta. Mas tá tudo certo. Já foi respondida a sua dúvida.
Os dois seguem conversando. CORTA A CENA.

CENA 7: Riva e Marion estão ajudando Valquíria a preparar o jantar.
-Nossa, vó... fazia um bom tempo que eu não te via cozinhar... - fala Riva.
-Verdade, mãe... o que te deu pra meter a barriga no fogão hoje? Geralmente somos eu e a Riva que nos encarregamos disso... - fala Marion.
-Precisava me distrair um pouco, meninas. Ando me sentindo esquisita. - fala Valquíria.
-É alguma coisa com o aneurisma, vó? - preocupa-se Riva.
-Não... de saúde eu estou maravilhosa. É um aperto no peito, mesmo. Não sei dizer porque... parece um mau presságio, mas não sei dizer do que se trata e nem quero deixar vocês ou qualquer um nessa casa com medo. - fala Valquíria.
-Ih, Riva... lembra como a dona Valquíria tinha dessas coisas o tempo todo lá em Barra de São João? Relaxa, mãe... essas coisas estão todas na sua cabeça. Estamos todos aqui em casa, em segurança. Nada pode nos acontecer. Já que você decidiu fazer o jantar hoje, bora se concentrar na comida que a gente te ajuda. - fala Marion.
-Eu queria ter essa certeza que vocês tem de que vai ficar tudo bem... - fala Valquíria.
-Será que você não está ansiosa pra ver o complexo de estúdios pronto? Se for isso, é até compreensível. - fala Riva.
-Claro que estou animada pra ver tudo pronto, minha neta... mas não é isso. Eu realmente não sei dizer o que é. Não é uma sensação boa. - fala Valquíria.
-Ai gente, vamos esquecer disso, vai ser melhor pra todas nós... - fala Marion.
As duas ajudam Valquíria na cozinha. CORTA A CENA.

CENA 8: Após o jantar, estão na sala da mansão Cláudio, Bruno, Setembrino, Marion, Mariana, Ivan, Vicente, Riva, Valquíria, Marcelo e Rafael. Todos conversam entre si sobre diversos assuntos quando Cláudio escuta um grito ao longe.
-Ei, gente... pera. Vocês não ouviram um grito lá fora? Será que assaltaram alguém? - alerta Cláudio.
-Não ouvi nada... - fala Bruno.
-Acho que só você ouviu, mano... - fala Marcelo
-Cês tem que ver como o Cláudio fica alerta com tudo. Às vezes, no meio da noite, ele dá cada salto na cama que acaba assustando a gente junto... - fala Bruno.
Os gritos, no entanto, ficam mais alto e todos podem ouvir.
-Agora eu ouvi! - fala Riva, indo à janela e se deparando com um grupo de pessoas na frente da mansão a gritar insultos e ameaças.
-Morte aos gays! O salário do pecado é a morte! Morte aos gays! - gritam as pessoas. FIM DO CAPÍTULO 129.

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