CENA 1: Guilherme tenta se
explicar com Cláudio.
-Olha, Cláudio... desculpa.
Você sabe que eu gosto de você. Mas somos acima de tudo amigos, não
somos?
-Somos... mas eu não posso
admitir que você venha com ceninha de ciúme pra cima de mim, sendo
que a gente mal começou a ficar. Isso é tudo o que a gente tem,
além da amizade: a gente fica! Começa e termina por aí.
-Não precisa jogar isso na
minha cara, Cláudio...
-Como que não precisa? Em
questão de dia você dá um piti completamente sem sentido diante de
mim e do Bruno e eu não preciso deixar as coisas claras pra ver se
você entende? Claro que eu preciso dizer! Você acha que o Bruno não
notou nada? Claro que notou... ele ficou tão constrangido quanto eu
fiquei. A diferença é que ele foi elegante e não me disse nada.
Não deu uma palavra. Porque não quis se meter. Assim é como uma
pessoa madura age.
-Você não é a pessoa mais
indicada pra falar de maturidade depois do que fez covardemente com o
Marcelo.
-Guilherme, na boa... vai
embora. Vai embora da minha casa antes que a gente acabe discutindo e
brigando sem necessidade.
-Desculpe, Cláudio... eu não
quis te aborrecer.
-Você nunca quer, né? Não
queria causar climão, mas foi o responsável pelo climão lá na
sala. Não queria me aborrecer mas tocou numa ferida aberta minha.
-Não foi minha intenção...
eu juro.
-Pode não ter sido. Mas sabe
como é aquele ditado clichê, né? De bem intencionado, o inferno tá
cheio. Por favor, Guilherme... eu gosto de você. Tou gostando de
ficar contigo. Não estraga esse lance legal que tá pintando entre a
gente... é melhor você não ficar aqui em casa hoje. Ainda dá
tempo de sair daqui até Copacabana sem susto. Por favor... faça
isso por você, faça isso por mim... por nós.
-Tá certo. A gente se vê
amanhã?
-Eu não sei. Eu te ligo
qualquer coisa. Preciso esfriar minha cabeça desse climão de hoje.
Respeite meu tempo.
Cláudio acompanha Guilherme
até seu carro e Bruno observa. Cláudio volta rapidamente pra dentro
de casa.
-Gente... vocês discutiram?
-Bruno... não precisa se
manter nessa postura defensiva. Você sabe o motivo pelo qual eu
mandei ele embora. Aquele climão que ele criou foi muito sem noção.
Desrespeitoso com você acima de tudo, muito antes de ser comigo. Foi
cena de ciúme besta.
-Concordo. Não tem o mínimo
cabimento. Vocês só ficam. Mesmo que fosse seu namorado, né... pra
que aquela cena?
-Pois é. Achei melhor ele
voltar pra casa dele, pra colocar a mão na consciência e pensar
melhor nas atitudes que toma. Você pode pegar suas coisas que hoje
você dorme no quarto.
Bruno fica feliz e recolhe
suas coisas. CORTA A CENA.
CENA 2: Na manhã do dia
seguinte, Marion desperta e após tomar uma xícara de café, vai ao
quarto de sua mãe.
-Te acordei, mãe?
-Nada, querida. Tava
aproveitando pra ler um livro. Você sabe que me acordo com os
primeiros raios do dia.
-Eu queria conversar com a
senhora... na verdade, te fazer um pedido.
-Fale, minha filha. Que pedido
é esse?
-Antes de te fazer o pedido,
eu queria te dizer que andei pensando melhor em tudo o que a senhora
me disse ontem. Depois de resistir um pouco, confesso que passei a
admitir pra mim mesma que sempre achei a Suzanne um tanto quanto...
bem, artificial.
-Falsa. Não é isso que você
queria dizer?
-Não nessas palavras, mas é
por aí.
-Certo... eu te avisei, minha
filha. Minha intuição não é coisa que falhe, você não lembra
das enrascadas que eu tirei sua falecida irmã e vocês?
-Verdade, mãe... a senhora
sempre sentia quando o rapa tava pra chegar...
-Mas diga logo... qual é o
pedido?
-Não é bem um pedido, é
mais uma orientação. Queria que a senhora buscasse não demonstrar
nenhum tipo de desconfiança ou animosidade com a Suzanne, nem perto
da Riva, muito menos quando a Riva estiver longe...
-Tou entendendo. Você tá com
medo que ela note alguma fragilidade em mim e use isso contra mim,
não é? Com a intenção de criar intrigas e jogar minha neta contra
mim...
-É exatamente isso que
pensei, como é que você sabe, mãe?
-Ah, filha... eu sei das
coisas. Agradeço a sua preocupação. Você espera que eu tenha
cautela e eu vou ter. Não se preocupe. Já vi gente como a Suzanne
antes nessa vida.
-Já? Como assim?
-Ou você tem muita sorte de
nunca ter cruzado com um tipo feito o dela antes, ou não prestou
atenção o suficiente...
-Por que?
-Essa gente tá por toda
parte. Gente falsa, gente que atua na vida o tempo todo. Gente sem
consideração e sentimento. Te conquistam, ganham sua confiança,
pra depois te apunhalarem. Geralmente porque querem grana. Tirar
vantagem... se sentirem grandes.
-Não entendo, mãe... você
fala como se estivesse se referindo a psicopatas.
-Não sei se é esse o nome
que dá. Psicopata não são aquelas pessoas que matam em série?
-Nem sempre, mãe... mas
enfim...
-Que seja. Já parou pra
pensar que de repente ela não é rica como diz? Vocês conhecem
alguém da família dela? Foram atrás de saber dessas coisas?
-Ainda não, mãe. Nem tem
como. A gente falou sobre isso ontem... a senhora concordou que não
seria bom invadir a vida de uma pessoa sem ter provas e nada além de
suposições e desconfianças...
-Verdade. Mas pode ficar
tranquila, filha... da minha parte vou ser bem discreta.
-Obrigada, mãe. Quer descer
pra tomar café da manhã com a gente?
-Claro! - prontifica-se
Valquíria. CORTA A CENA.
CENA 3: Em Melbourne, Rafael
percebe que Marcelo continua com uma expressão triste.
-O que foi agora, amor? Não
tá gostando da viagem, do país?
-Não, amor... tou adorando
tudo. Tou amando a Austrália, tudo me parece realmente bom aqui. Não
é isso... é que às vezes bate uma tristeza.
-É por causa do Cláudio,
acertei?
-Nem que eu queira eu consigo
esconder as coisas de você, né Rafa?
-Não consegue. Seu olhar fala
demais por você...
-Eu tou muito triste, chateado
e decepcionado com tudo isso. Me corta o coração saber que o
Cláudio teve a capacidade de agir do jeito que agiu comigo. Sempre
acreditei que nessa vida nunca tinha dado motivos pra ninguém sentir
inveja, despeito e recalque de mim. Não é fácil perceber que
desperto isso em alguém, muito menos quando esse alguém é quem eu
considerava meu melhor amigo.
-Eu sei o quanto tudo isso tá
doendo de verdade em você... mas me pergunto se vale a pena você
ficar nessa coisa de remoer essa história toda. Enquanto você fica
remoendo tudo isso, a gente tá deixando de aproveitar nossos
momentos aqui. Viajamos pra isso, não foi? Pra gente poder passar
esse tempo vivendo nosso amor sem medo, sem ter que se esconder...
-Claro que foi. Eu quero tirar
isso da cabeça. Mas sabe por que não consigo? Você pode até achar
que sou ingênuo... mas lá no fundo eu tenho a esperança que a
gente ainda volte a ser amigo.
-Você passaria uma borracha
em tudo? Ele precisa se responsabilizar pelas merdas que fez, amor...
-Eu sei. Vamos ver como as
coisas vão se resolver com o tempo. Se um dia a gente voltar a ser
amigo, não vai ser do dia pra noite. Feridas foram deixadas abertas
e elas doem um bocado...
-Fica bem, meu amor... não
gosto de te ver assim...
Rafael consola Marcelo, que se
tranquiliza em seus braços. CORTA A CENA.
CENA 4: Mateus encontra
“Chefe” onde ele costuma se encontrar costumeiramente. Aparece a
silhueta do “Chefe” e sua voz abafada.
-Surpresa ver você aqui,
Mateus. E que ousadia, eu diria. Vir assim... sem nem me ligar antes,
sem se anunciar... quem é que podia te garantir que eu já tava
aqui? Eu podia estar em casa numa hora dessas... ou em outro lugar.
-Conheço seus hábitos,
chefe. Eu vim aqui porque preciso esclarecer algumas coisas.
Esclarecer e sugerir.
-Fale logo, Mateus. Não tenho
o dia todo e tenho estado meio sobrecarregado ultimamente.
-Dá pra ver pelas suas
olheiras, mas enfim... eu tou com medo que a polícia esteja na minha
cola, chefe... e por isso eu não sei se quero aceitar ser o novo
cobrador. Prefiro me manter mais invisível, caso eu realmente esteja
sendo investigado.
-Você é um rato ou um homem,
Mateus? Você não tem opção. Ou você assume a posição que eu te
impus, ou vai sobrar pra você, pra Laura e pra muito mais gente.
-Isso é uma ameaça, chefe?
-Você sabe que é. Nem sei
por que pergunta. Você morre se não fizer o que mandei. Você
também sabe que não preciso sujar minhas mãos com o sangue de
ninguém, sempre tenho quem faça o serviço por mim.
-Mas chefe... você não podia
considerar alguma outra função menos arriscada pra mim dentro da
organização?
-Mateus, não tem conversa.
Esquece disso. Não tem outra alternativa. Depois, os meus outros
homens só servem pra obedecer ordens, mas não tem inteligência o
suficiente pra conduzir... você sabe, operações mais complexas.
Preciso de você. Você não pode simplesmente abandonar esse barco,
senão muita gente afunda com você.
Mateus se dá por vencido e
vai embora. CORTA A CENA.
CENA 5: Rodrigo está no
apartamento do Rio em que morou, terminando de arrumas suas malas e
pegar as coisas que lhe pertencem e olha para o apartamento,
pensativo.
-Quem diria! Já tava até me
acostumando com essa vidinha mais ou menos aqui... e agora esse ciclo
tá se fechando na minha vida. Se fechando pra nunca mais se abrir...
Rodrigo pega sua agenda e
começa a escrever seus pensamentos:
“Estou num misto de
sentimentos, lembranças e sensações. É doido dizer isso agora,
mas nunca pensei que sentiria saudade desse apartamentinho que me
acolheu quando eu não tinha mais pra onde ir nem por onde me
esconder. O ciclo que se fecha hoje também fecha uma página
lamentável da minha vida, da minha história, da qual sempre hei de
me envergonhar. Por outro lado, deixo pra trás Cláudio... um grande
amor que sei que não vou mais poder viver. Errei demais querendo
acertar. Fui vítima de mim mesmo ao me deixar envolver pelo “Chefe”.
E esse danado desse “Chefe” mesmo tendo a minha vida e a vida de
tanta gente nas mãos, nunca mostrou a cara. Nunca soube quem ele é.
Talvez nunca saiba. Mas só posso agradecer aos céus por ele ter me
libertado. Muitas foram as vezes que pensei que jamais me livraria
dessa teia de crimes, intrigas e conspirações. Mas hoje eu posso
dizer que depois de muito tempo, eu estou me reencontrando comigo
mesmo. Espero me encontrar ainda diante do espelho”.
Rodrigo fecha sua agenda,
coloca em uma de suas malas e vai embora definitivamente do
apartamento. CORTA A CENA.
CENA 6: Na companhia de
teatro, antes de chegarem os atores, Procópio questiona Mara e
Valentim.
-Vocês falaram dia desses
sobre essa tal organização... facção, sei lá... o que vocês
sabem de concreto sobre ela? - pergunta Procópio.
-Até onde eu e Valentim
pudemos chegar até o momento, essa facção não age de agora. Está
ativa há pelo menos quarenta anos. Só que antes funcionava de uma
forma mais discreta, compreende? A situação passou a se tornar
insustentável quando o dono da empresa de fachada morreu em 2011,
gerando uma série de eventos estranhos nos meses e nos anos
seguintes. Cerca de quatro ou cinco meses depois da morte dele, que
foi comprovada depois ser assassinato, a empresa, mal administrada
por seu substituto, entrou em concordata. Tudo indicava para o
caminho da falência, mas foi então que o mais esquisito passou a
acontecer: doações anônimas de dinheiro. Quantidades exorbitantes
de um dinheiro que não é declarado, cuja procedência só pode ser
ilegal. - fala Mara.
-Isso sem mencionar que por
trás da empresa foi descoberto que sempre houve tráfico de armas e
agiotagem. Há a suspeita, que ainda não confirmamos, de que o
falecido dono da empresa era delator na época da ditadura militar.
Andei pesquisando e somente na sua turma na época da universidade,
pelo menos quatro de seus colegas foram capturados e torturados.
Somente um deles sobreviveu pra contar história. Um deles teve a
morte confirmada e os outros dois desapareceram e nunca mais deram
notícias. - complementa Valentim.
-Vocês não acham que devem
ir atrás desse sobrevivente? - pergunta Procópio.
-É o que estamos tentando.
Mas antes temos outras coisas a resolver... - fala Mara.
-Acho melhor a gente encerrar
o assunto por aqui. Os atores já estão começando a chegar... -
alerta Valentim.
Todos fingem que estavam
apenas conversando sobre amenidades. CORTA A CENA.
CENA 7: Durante o café da
manhã, Bruno resolve falar sobre Guilherme com Cláudio.
-Você parece ainda estar
incomodado com aquela cena que o Guilherme aprontou ontem...
-E tou incomodado mesmo,
Bruno. Mais que isso... eu diria que fiquei um pouco assustado,
talvez decepcionado.
-Por que?
-Vou ser sincero com você. O
Guilherme nunca foi uma pessoa fácil nessa vida.
-Como assim?
-Na época que nós estudamos
juntos e eu me apaixonei por ele, ele sequer tinha capacidade de
admitir que gostava de meninos. Até aí não tem nada demais, mas
ele se juntou justamente com a turma dos caras homofóbicos, que
ficavam humilhando e perseguindo eu e outros gays e lésbicas no
colégio... e eu tinha que ver ele todo dia porque a gente estudava
na mesma turma. Ele chegou ao cúmulo de, mais ou menos na metade
daquele ano, aparecer com uma colega nossa, de mãos dadas com ela,
dizendo que ela era a namorada dele. Aquilo ali terminou de me
arrasar por dentro, porque eu já vinha me sentindo um bosta por
conta das merdas que ele fazia. A Fernanda, que era essa colega,
percebeu que eu fiquei mal. No final da aula, naquele mesmo dia, ela
me confessou que não estava com ele coisa nenhuma... que ela havia
feito tudo a pedido dele, mas que ao me ver daquele jeito, todo
abalado, tinha se arrependido e que não ia mais compactuar com
aquela mentira.
Bruno fica perplexo.
-Cláudio... isso que você tá
me contando é muito grave. Ele passou por cima dos sentimentos que
você tinha por ele. Não mediu as consequências disso! Isso foi,
desculpe falar, de uma crueldade absurda.
-Eu sei que foi, Bruno. Quando
aquele ano acabou e o outro ano letivo começou, levantei as mãos
pros céus que ele havia trocado de colégio. Ajudou a cicatrizar
muitas feridas que ele deixou dentro de mim. Anos depois ele surge
atrás de mim, na rua. Completamente fora de si. Parecia perturbado.
Se ajoelhou diante de mim pedindo perdão, confessou que sempre me
amou e que queria uma chance comigo. Respondi que tava namorando na
época e isso não era mentira. Eu estava namorando o Fernando, meu
primeiro namorado. Ele saiu atordoado dali. Fiquei assustado com o
estado dele, sinceramente...
-Não é pra menos. Mas perto
do que ele já foi, até que ele já tá bem mais controlado, não?
-Isso é, Bruno... mas não
sei. Ainda fico com medo...
Os dois seguem conversando.
CORTA A CENA.
CENA 8: Vicente e Riva estão
descendo para o café da manhã quando Riva sente uma forte tontura e
se apoia em Vicente. Os dois quase caem da escada.
-Viu, Riva? Eu falei que a
gente não devia ter dormido tanto. Já é quase meio dia... tá se
sentindo melhor? - fala Vicente, preocupado.
-Vou voltar pro quarto. Tou me
sentindo muito tonta. Você traz o café da manhã pra mim? Tou com
medo de cair... - fala Riva.
Vicente leva Riva ao quarto e
vai à cozinha preparar o café da manhã dos dois. Instantes depois,
retorna ao quarto com o café da manhã dos dois. Riva come um pouco
e começa a se sentir enjoada.
-Ai amor... deve ter sido algo
que comemos ontem. Nem a comida tá descendo direito. Acho que vou
vomitar...
Riva começa a passar mal e
Vicente a leva ao banheiro da suíte. CORTA A CENA.
CENA 9: Valquíria demonstra
preocupação com Riva diante de Marion, Ivan e Mariana.
-Ai gente... tou com medo pela
Riva... lembro que a mãe dela tinha uma saúde frágil... - desabafa
Valquíria.
-Ih mãe, nem se preocupa.
Esqueceu que essa daí é taurina? Deve ter passado mal de tanto que
comeu de noite. Você não lembra que ela sempre foi de assaltar a
geladeira? - fala Marion.
As duas riem.
-Ah, isso é verdade. E vivia
passando mal por causa da gula... Não engorda porque tem sorte.
De repente, a campainha toca.
Marion estranha.
-Hoje não é dia da Suzanne
vir. Quem pode ser uma hora dessas? Pode ir olhar pra gente, Ivan?
Ivan abre a porta e toma um
susto.
-Haroldo! É você! - FIM DO
CAPÍTULO 40.