CENA 1: Suzanne tenta beijar
Vicente, que a segura firmemente pelos braços e a impede de
beijá-lo.
-Fala o que você fez com a
Riva, fala, sua infeliz!
-Se acalma, viu, maridinho
perfeito? Foi só um sonífero leve, não tem risco de acontecer nada
além dela dormir feito uma pedra durante a noite. Vem comigo, eu sei
que você quer, eu que você me quer, que deseja meu corpo todo pra
você...
Vicente se revolta.
-Eu devia contar pra Riva a
bela biscate que você é. Eu devia contar pra todo mundo.
-Experimenta! Ela não ia
acreditar em você. Ninguém ia... os meninos que eram o problema
estão no exterior. Sem eles eu posso fazer o que quiser.
-Não pode, não. E você se
engana: nem que você fosse a mulher mais atraente do mundo inteiro
eu iria te desejar. Você não entende que eu amo a Riva?
-Pra cima de mim com esse papo
mole, Vicente? Essa daí é uma ex merendeira, vivia de vender
quentinha na praia, mal sabe falar o português direito, uma
pobretona, uma coisinha pouca, mixa, parte da ralé. Eu sou mulher
pra você, não essa fruta podre aí...
-Você não entende, né,
Suzanne? Nunca vai entender. Amor é amor. Você nunca vai saber o
que é amar... porque nunca amou ninguém além de si mesma.
-E não é o que as pessoas
deviam fazer? Esse mundo é feio, Vicente. Só se dá bem quem se
impõe.
-Mas não passando a perna nos
outros, não traindo as pessoas que você chama de amigos. Você não
presta, Suzanne. Você nunca vai me ter. Nunca! Nem um cafajeste te
mereceria, porque com certeza um cafajeste tem mais caráter que
você.
-Você ainda vai se arrepender
de cada palavra que tá me dizendo agora, Vicente, pode apostar...
-Isso é uma ameaça?
-Não. Ainda não. Mas você
vai acabar mordendo a língua. Sei que vai me querer. Eu sou linda,
essa daí é comum, você encontra uma Riva em qualquer esquina...
-Você é muito segura de si,
Suzanne. Mas isso não vai acontecer, não mesmo!
-Não vai? O tempo vai dizer,
querido. Isso aqui é só o começo.
Vicente perde a paciência.
-Chega, Suzanne, chega dessa
sua cena deplorável. Estou exausto e preciso dormir...
-Vem dormir comigo, Vicente.
Aposto que você vai gostar.
-Sai daqui, Suzanne. Sai
agora!
Vicente empurra Suzanne para
fora do quarto e ela ri debochadamente do lado de fora.
-Tolinho... - fala Suzanne,
partindo ao quarto de hóspedes. CORTA A CENA.
CENA 2: Cleiton encara
Adelaide contrariado pela atitude de sua esposa.
-Eu não acredito que você
teve capacidade de desligar na cara da nossa filha. Você não parou
pra pensar que ela tá sofrendo por ter terminado com a Eva?
-Pra mim deveria ter acabado
antes, aliás, nem devia ter começado. Onde já se viu mulher com
mulher? É nojento, repulsivo.
-Sabe o que tá sendo
repulsivo? Esse seu comportamento, Adelaide. Não lembra nada a
menina doce, gentil e livre que eu conheci e me apaixonei há mais de
vinte anos. Onde foi que você perdeu a sua doçura, Adelaide? Quando
que você inventou essa sua máscara intransigente, conservadora e
controladora?
-Fácil pra você falar, não
é, Cleiton? Não foi você que descobriu no alto dos seus vinte e
dois anos que não poderia jamais ter filhos porque nasceu com uma
síndrome rara. Sabe o que é você ser mulher e ser criada
acreditando que vai casar e ter filhos, de repente se vendo diante do
fato que sequer tem os órgãos reprodutores internos? Você sabe o
tanto que eu sofri por isso? Sabe quantas vezes não me senti mulher
o suficiente por causa disso? Não sabe! E ainda tem a pachorra de
questionar meu amor de mãe com a nossa filha? Você não sabe de
nada, Cleiton! Nada!
-Tem razão, Adelaide. Não
sei de nada. Nem sei sobre você. Talvez eu tenha deixado de te
conhecer. Nós escolhemos a Renata pra ser a nossa filha quando
decidimos pela adoção. Assumimos o compromisso de dar uma família,
uma casa, um lar cheio de amor e compreensão. E o que você fez? Se
aboletou na primeira igreja evangélica pra justificar seus
preconceitos com a nossa menina...
-Pare com isso, Cleiton. Você
sabe que sempre acreditei em Deus. Você queria que nossa filha fosse
uma lésbica?
-Não queria. Mas não cabe a
nós decidir a vida dos nossos filhos, você não entende isso?
-Não se esqueça que você
também é evangélico. Não entendo é essa sua postura agora. Tá
achando tranquilo aprovar o que a palavra de Deus condena e diz mais
de uma vez que é abominável?
-Sou evangélico sim, mas não
perdi o meu senso crítico. Você que se perdeu.
-Me perdi? Nossa Renata liga
pra cá uma hora dessas querendo desabafar com a gente sobre o namoro
fracassado dela com outra mulher e você acha isso normal? Você acha
correto manter uma lésbica debaixo do nosso teto?
-Ela é nossa filha, Adelaide!
- berra Cleiton.
-Não grita comigo! É nossa
filha, mas não seguiu o caminho que nós decidimos pra ela.
-O caminho que você decidiu,
você quer dizer, não é?
-E haveria de ser de outra
forma? Você sempre foi fraco, sem pulso. Deixava a Renata fazer
sempre tudo o que ela quis. Não deu limites. Se tem algum culpado
por ela ter se tornado o que se tornou, a culpa é sua, Cleiton.
-Você é uma covarde. Não
assume responsabilidades e joga a culpa nos outros. Se eu não te
amasse o tanto que te amo, já tinha me separado de você.
-E por que não separa de uma
vez? Tá esperando o que?
-Não me provoca, Adelaide.
Estou com a paciência por um fio...
Os dois se encaram tentando
encontrar uma solução. CORTA A CENA.
CENA 3: Na manhã do dia
seguinte, Riva se acorda sentindo indisposição e Vicente percebe.
-Tá com sono ainda, amor?
-Não sou de ter bobeira desse
jeito, Vicente. Parece que passou um trator em cima de mim, ou que
tou de ressaca...
-Você quer um café
reforçado? Eu vou lá em baixo e preparo pra você, tá?
-Ai amor, vou querer sim, se
não for muito abuso da minha parte.
-Abuso nenhum, querida. Essa
indisposição vai passar e o dia hoje está lindo!
Vicente deixa o quarto e está
prestes a descer as escadas quando Suzanne o aborda.
-Suzanne, agora não. Por sua
causa a Riva se acordou indisposta. Por causa daquela porcaria de
sonífero que você deu pra ela tomar e tentar me seduzir.
-Você tem alguma prova disso,
Vicente? Acho que não. Gravou alguma confissão? Hmmm... deixa
ver... acho que também não. Então baixa bem tua bolinha que você
só vai criar problema se falar essas merdas pra qualquer um nessa
casa.
-Você é baixa Suzanne. Nem
deveria estar aqui, essa aqui não é sua casa.
-Nem sua, queridinho.
-Mas eu vou casar com a Riva,
sua tonta. Agora sai da minha frente que eu vou preparar o café da
minha mulher, dá licença.
-Será que vai mesmo casar com
ela? Não teria tanta certeza, galã de meia idade...
-Pare com essas suas
charadinhas. Em mim você não mete medo, Suzanne. Dá licença.
-Pode passar, senhor... -
debocha Suzanne, permitindo a passagem de Vicente. CORTA A CENA.
CENA 4: Mara e Valentim estão
no consultório dele antes que ele seja aberto falando sobre diversos
assuntos.
-Conseguiu convencer o Diogo a
colaborar nas investigações, Valentim?
-Olha, Mara... acho que
consegui, sim. Resta saber até onde ele está disposto a ir ou se
ele está preparado pro que for sendo descoberto.
-Acho que ele tem uma postura
sensata. Estou certa? Você que é psiquiatra pode dizer melhor sobre
o comportamento do Diogo, não pode?
-Ele é um sujeito
introvertido, apesar de boêmio. Tem uma postura que eu definiria
como elegante, mas não é essa a palavra. Depois, acho que não é
hora de tergiversar sobre isso.
-Parece que você leu meus
pensamentos, viu Valentim? Me acordei hoje lembrando dos velhos
tempos, veja você que coisa doida! Mais de trinta anos se passaram
desde que estudamos juntos e...
-E nos apaixonamos, não é
isso que você ia dizer, Mara?
Mara está claramente
constrangida.
-É... mas já faz tanto
tempo. Achei melhor não falar dessa parte. Depois, eu acabei me
apaixonando também pelo Procópio e ele foi um ótimo marido durante
os anos que fui casada com ele. Só lamento nunca ter tido filhos,
mas no fim das contas eu não sei se eu seria uma boa mãe. Acho que
não nasci pro ofício de dona de casa, sabe? Minha vocação começa
e termina na cozinha, mas nenhum homem nunca me deu ordens...
-É desse atrevimento que eu
gosto. Você nunca se rebaixou a nenhum homem, sempre reafirmou seu
valor. Ah, Mara... se você soubesse o quanto me doeu quando você se
casou com Procópio... claro que sempre estive ao lado de vocês e
ele sempre foi meu melhor amigo, mas fico aqui pensando se as coisas
fossem diferentes...
-Você me deixava insegura,
Valentim. Todas as meninas da universidade queriam sair com você.
Depois, eu não esqueci daquela noite que você me deixou plantada na
porta do cinema te esperando, enquanto você tava se acabando com a
Fernanda num motel.
-Mara, eu já te expliquei que
naquela noite eu me esqueci do que tínhamos marcado.
-Não diminui o fato de ter
esquecido de mim. Minha sorte foi que o Procópio acabou pintando no
cinema naquela noite. Acho que foi ali que eu acabei vendo que ele
era um homem melhor pra mim. Você, apesar de ser esse grande amigo
nosso, nunca me deu certeza de nada. Com você eu só tinha dúvidas,
inseguranças. Logo eu que nunca fui ciumenta, senti vontade de
quebrar a cara daquela Fernanda... onde já se viu? Mulheres brigando
por causa de macho?
-Mas você ainda sente falta,
não sente? Porque eu sinto, Mara. Pra mim você nunca deixou de
existir. Acho que nunca deixei de te amar.
-Isso tá ficando perigoso,
Valentim... melhor a gente parar por aqui.
Valentim beija Mara. CORTA A
CENA.
CENA 5: Bruno está no banho e
percebe que esqueceu de seu barbeador. Resolve gritar para que
Cláudio o escute.
-Amor, pega na minha mochila
meu barbeador? Acabei esquecendo antes de entrar no banho...
-Em que parte da mochila tá,
Bruno? Me diz que eu vou lá e pego.
-Tá dentro de um estojo
dentro do bolso interno.
Cláudio vasculha a mochila de
Bruno à procura do estojo com o barbeador e se depara com uma foto.
Curioso, resolve ver quem está na foto e se choca com quem vê.
-Não é possível... Mateus?
O Bruno conhece o Mateus? Calma, Cláudio... você deve estar
entendendo errado, de repente é alguém muito parecido... respira,
Cláudio... deve haver uma explicação pra isso... - fala Cláudio
consigo mesmo.
Cláudio encontra o estojo e
retira de dentro dele o barbeador, batendo na porta do banheiro para
Bruno pegar.
-Tá aqui, amor. Vem pegar o
barbeador.
Bruno abre a porta do banheiro
e tenta dar um beijo para agradecer Cláudio, porém ele se esquiva.
-Eita, Cláudio... só queria
agradecer!
-É que não tomei banho
ainda, estou sujo... - desconversa Cláudio.
-É só isso mesmo, Cláudio?
Sua cara tá estranha.
-Volta pro banho, Bruno...
depois eu vou pro meu, ok?
Bruno volta ao banho e Cláudio
tenta descobrir uma maneira de saber a verdade sobre a foto. CORTA A
CENA.
CENA 6: No final da manhã,
Mara e Valentim estão a caminho da companhia de teatro quando,
passando em frente ao hotel onde “Chefe” se esconde, Valentim se
depara com uma figura suspeita.
-Mara, é ele, de novo. Sempre
com as mesmas roupas pretas e escondendo o rosto com esse óculos
gigante. Se eu for atrás dele agora, ele vai desconfiar. Você pode
descer do carro e tentar descobrir onde ele está indo?
-Claro, Valentim. Faz parte do
meu trabalho. Eu vou ligar pro seu celular agora e manter essa
ligação pra te informar dos passos do “Chefe”.
Mara desce do carro e segue
“Chefe”, que está deixando o hotel naquele momento, a uma
distância segura.
-Estou no rastro dele,
Valentim. Ele acabou de dobrar à esquerda.
-Ótimo. Não deixe ele
perceber que você o segue, certo? Mantenha uma distância segura.
-Claro...
Mara, no entanto, percebe que
“Chefe” entra numa loja de atacado, onde há uma multidão de
pessoas.
-Más notícias, Valentim. Ele
entrou no atacadão.
-Fique mais perto dele, Mara.
Com uma multidão no mesmo lugar ele não vai se perceber seguido tão
facilmente.
-Vou tentar.
No entanto, “Chefe” entra
no banheiro masculino com sua mochila e Mara fica frustrada.
-Valentim, não deu. Acho que
ele tem um padrão diário ao deixar o hotel. Sem o disfarce eu não
posso sair abordando cada homem que sair do banheiro masculino.
-Droga. Mais uma vez perdendo
o rastro desse cara... está certo, Mara, você fez o que pode. Volte
pro carro que ainda temos de ir pro teatro.
Valentim desliga o telefone,
frustrado. CORTA A CENA.
CENA 7: Diogo percebe que
Victor está com uma expressão preocupada.
-O que foi agora, Victor? Tou
te sentindo tenso, preocupado.
-É medo, Diogo... medo de não
ser homem suficiente pra você.
-Já te falei pra não se
preocupar com isso. Você acha que eu não sei que você está
fazendo o que pode para dominar esse seu transtorno? Eu sei que um
transtorno mental é subestimado pelas pessoas porque não pode ser
visto de longe, como uma mazela física, mas eu não sou assim,
amor... eu sei que você se esforça, eu tenho empatia.
-Não é só isso, amor...
claro que eu tenho medo que você se canse das minhas variações,
das minhas recaídas... mas Diogo, meu medo é maior que isso.
-Fala, Victor. Eu sei que é
importante pra você nesse momento.
-Eu tenho medo de que você
acabe voltando com o Cláudio em algum momento.
-Mesmo que eu quisesse, meu
amor, coisa que não quero, nossas vidas tomaram rumos diferentes...
eu não vou mentir pra você: procurei ele sim, há algum tempo,
quando não sabia que suas crises eram esse seu transtorno. Mas sabe
qual foi nossa conclusão? Que a vida nos mudou. Se há um espaço
hoje na vida um do outro, esse espaço só pode ser preenchido pela
amizade. Você sabe que não sou desleal, Victor. Se eu achasse que
existisse uma possibilidade mínima de haver um relacionamento com o
Cláudio, eu diria. Mas sinceramente, desisti disso tem algum tempo.
Eu amo você, Victor. De verdade.
-Mas no final das contas você
mentiu pra ele... mentiu pra salvar a pele de vocês. Ele não sabe
desse detalhe, pensa que você traiu ele.
-No que depender de mim vai
continuar pensando. O que está feito está feito. Por favor,
Victor... não vamos mais falar sobre isso hoje, tá?
Diogo abraça Victor e o
acaricia.
-Vai ficar tudo bem, eu
prometo. - arremata Diogo. CORTA A CENA.
CENA 8: Já no teatro, Mara e
Valentim chamam Procópio para conversar antes de que os atores
cheguem.
-Procópio, meu amigo...
precisamos conversar com você. - fala Valentim.
Os três se dirigem à sala de
Procópio.
-Pois bem, digam o que
precisam dizer que já tou me corroendo de curiosidade. - fala
Procópio.
-Seguinte, Procópio: estamos
com dificuldades de seguir o rastro do “Chefe”. Queremos saber se
você poderia colaborar conossco... - fala Mara.
-Mas como que posso colaborar?
Eu não sou investigador como vocês, meus amigos...
-Mas foi casado com uma
investigadora, cara! Você sabe o que fazer, não sabe? - questiona
Valentim.
-Sei. Mas por que vocês
querem que eu entre nessa investigação?
-Porque o “Chefe” parece
estar ciente de que estamos no rastro dele. Se esquiva sempre. De
você ele não desconfiaria, entendeu agora? - esclarece Mara.
Os três seguem conversando
sobre as estratégias. CORTA A CENA.
CENA 9: Ao anoitecer, Cláudio
chega novamente em casa e Bruno percebe que ele o trata secamente.
-Amor... que cara é essa? Fiz
aquela lasanha que você gosta...
-Não estou com apetite hoje,
Bruno.
-Você tá estranho, Cláudio.
Desde hoje pela manhã tá estranho comigo e ainda me diz que não é
nada.
-Ué, você não faz a mínima
ideia do motivo? Achei que você fosse mais inteligente.
-Do que cê tá falando, cara?
Não sou bom com charada, fala logo.
Cláudio pega de seu bolso a
foto de Mateus e a mostra a Bruno, que fica atônito.
-Tem como me explicar como é
que a foto do Mateus foi parar na sua mochila, Bruno? FIM DO CAPÍTULO
29.
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