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sexta-feira, 17 de junho de 2016

CAPÍTULO 29

CENA 1: Suzanne tenta beijar Vicente, que a segura firmemente pelos braços e a impede de beijá-lo.
-Fala o que você fez com a Riva, fala, sua infeliz!
-Se acalma, viu, maridinho perfeito? Foi só um sonífero leve, não tem risco de acontecer nada além dela dormir feito uma pedra durante a noite. Vem comigo, eu sei que você quer, eu que você me quer, que deseja meu corpo todo pra você...
Vicente se revolta.
-Eu devia contar pra Riva a bela biscate que você é. Eu devia contar pra todo mundo.
-Experimenta! Ela não ia acreditar em você. Ninguém ia... os meninos que eram o problema estão no exterior. Sem eles eu posso fazer o que quiser.
-Não pode, não. E você se engana: nem que você fosse a mulher mais atraente do mundo inteiro eu iria te desejar. Você não entende que eu amo a Riva?
-Pra cima de mim com esse papo mole, Vicente? Essa daí é uma ex merendeira, vivia de vender quentinha na praia, mal sabe falar o português direito, uma pobretona, uma coisinha pouca, mixa, parte da ralé. Eu sou mulher pra você, não essa fruta podre aí...
-Você não entende, né, Suzanne? Nunca vai entender. Amor é amor. Você nunca vai saber o que é amar... porque nunca amou ninguém além de si mesma.
-E não é o que as pessoas deviam fazer? Esse mundo é feio, Vicente. Só se dá bem quem se impõe.
-Mas não passando a perna nos outros, não traindo as pessoas que você chama de amigos. Você não presta, Suzanne. Você nunca vai me ter. Nunca! Nem um cafajeste te mereceria, porque com certeza um cafajeste tem mais caráter que você.
-Você ainda vai se arrepender de cada palavra que tá me dizendo agora, Vicente, pode apostar...
-Isso é uma ameaça?
-Não. Ainda não. Mas você vai acabar mordendo a língua. Sei que vai me querer. Eu sou linda, essa daí é comum, você encontra uma Riva em qualquer esquina...
-Você é muito segura de si, Suzanne. Mas isso não vai acontecer, não mesmo!
-Não vai? O tempo vai dizer, querido. Isso aqui é só o começo.
Vicente perde a paciência.
-Chega, Suzanne, chega dessa sua cena deplorável. Estou exausto e preciso dormir...
-Vem dormir comigo, Vicente. Aposto que você vai gostar.
-Sai daqui, Suzanne. Sai agora!
Vicente empurra Suzanne para fora do quarto e ela ri debochadamente do lado de fora.
-Tolinho... - fala Suzanne, partindo ao quarto de hóspedes. CORTA A CENA.

CENA 2: Cleiton encara Adelaide contrariado pela atitude de sua esposa.
-Eu não acredito que você teve capacidade de desligar na cara da nossa filha. Você não parou pra pensar que ela tá sofrendo por ter terminado com a Eva?
-Pra mim deveria ter acabado antes, aliás, nem devia ter começado. Onde já se viu mulher com mulher? É nojento, repulsivo.
-Sabe o que tá sendo repulsivo? Esse seu comportamento, Adelaide. Não lembra nada a menina doce, gentil e livre que eu conheci e me apaixonei há mais de vinte anos. Onde foi que você perdeu a sua doçura, Adelaide? Quando que você inventou essa sua máscara intransigente, conservadora e controladora?
-Fácil pra você falar, não é, Cleiton? Não foi você que descobriu no alto dos seus vinte e dois anos que não poderia jamais ter filhos porque nasceu com uma síndrome rara. Sabe o que é você ser mulher e ser criada acreditando que vai casar e ter filhos, de repente se vendo diante do fato que sequer tem os órgãos reprodutores internos? Você sabe o tanto que eu sofri por isso? Sabe quantas vezes não me senti mulher o suficiente por causa disso? Não sabe! E ainda tem a pachorra de questionar meu amor de mãe com a nossa filha? Você não sabe de nada, Cleiton! Nada!
-Tem razão, Adelaide. Não sei de nada. Nem sei sobre você. Talvez eu tenha deixado de te conhecer. Nós escolhemos a Renata pra ser a nossa filha quando decidimos pela adoção. Assumimos o compromisso de dar uma família, uma casa, um lar cheio de amor e compreensão. E o que você fez? Se aboletou na primeira igreja evangélica pra justificar seus preconceitos com a nossa menina...
-Pare com isso, Cleiton. Você sabe que sempre acreditei em Deus. Você queria que nossa filha fosse uma lésbica?
-Não queria. Mas não cabe a nós decidir a vida dos nossos filhos, você não entende isso?
-Não se esqueça que você também é evangélico. Não entendo é essa sua postura agora. Tá achando tranquilo aprovar o que a palavra de Deus condena e diz mais de uma vez que é abominável?
-Sou evangélico sim, mas não perdi o meu senso crítico. Você que se perdeu.
-Me perdi? Nossa Renata liga pra cá uma hora dessas querendo desabafar com a gente sobre o namoro fracassado dela com outra mulher e você acha isso normal? Você acha correto manter uma lésbica debaixo do nosso teto?
-Ela é nossa filha, Adelaide! - berra Cleiton.
-Não grita comigo! É nossa filha, mas não seguiu o caminho que nós decidimos pra ela.
-O caminho que você decidiu, você quer dizer, não é?
-E haveria de ser de outra forma? Você sempre foi fraco, sem pulso. Deixava a Renata fazer sempre tudo o que ela quis. Não deu limites. Se tem algum culpado por ela ter se tornado o que se tornou, a culpa é sua, Cleiton.
-Você é uma covarde. Não assume responsabilidades e joga a culpa nos outros. Se eu não te amasse o tanto que te amo, já tinha me separado de você.
-E por que não separa de uma vez? Tá esperando o que?
-Não me provoca, Adelaide. Estou com a paciência por um fio...
Os dois se encaram tentando encontrar uma solução. CORTA A CENA.

CENA 3: Na manhã do dia seguinte, Riva se acorda sentindo indisposição e Vicente percebe.
-Tá com sono ainda, amor?
-Não sou de ter bobeira desse jeito, Vicente. Parece que passou um trator em cima de mim, ou que tou de ressaca...
-Você quer um café reforçado? Eu vou lá em baixo e preparo pra você, tá?
-Ai amor, vou querer sim, se não for muito abuso da minha parte.
-Abuso nenhum, querida. Essa indisposição vai passar e o dia hoje está lindo!
Vicente deixa o quarto e está prestes a descer as escadas quando Suzanne o aborda.
-Suzanne, agora não. Por sua causa a Riva se acordou indisposta. Por causa daquela porcaria de sonífero que você deu pra ela tomar e tentar me seduzir.
-Você tem alguma prova disso, Vicente? Acho que não. Gravou alguma confissão? Hmmm... deixa ver... acho que também não. Então baixa bem tua bolinha que você só vai criar problema se falar essas merdas pra qualquer um nessa casa.
-Você é baixa Suzanne. Nem deveria estar aqui, essa aqui não é sua casa.
-Nem sua, queridinho.
-Mas eu vou casar com a Riva, sua tonta. Agora sai da minha frente que eu vou preparar o café da minha mulher, dá licença.
-Será que vai mesmo casar com ela? Não teria tanta certeza, galã de meia idade...
-Pare com essas suas charadinhas. Em mim você não mete medo, Suzanne. Dá licença.
-Pode passar, senhor... - debocha Suzanne, permitindo a passagem de Vicente. CORTA A CENA.

CENA 4: Mara e Valentim estão no consultório dele antes que ele seja aberto falando sobre diversos assuntos.
-Conseguiu convencer o Diogo a colaborar nas investigações, Valentim?
-Olha, Mara... acho que consegui, sim. Resta saber até onde ele está disposto a ir ou se ele está preparado pro que for sendo descoberto.
-Acho que ele tem uma postura sensata. Estou certa? Você que é psiquiatra pode dizer melhor sobre o comportamento do Diogo, não pode?
-Ele é um sujeito introvertido, apesar de boêmio. Tem uma postura que eu definiria como elegante, mas não é essa a palavra. Depois, acho que não é hora de tergiversar sobre isso.
-Parece que você leu meus pensamentos, viu Valentim? Me acordei hoje lembrando dos velhos tempos, veja você que coisa doida! Mais de trinta anos se passaram desde que estudamos juntos e...
-E nos apaixonamos, não é isso que você ia dizer, Mara?
Mara está claramente constrangida.
-É... mas já faz tanto tempo. Achei melhor não falar dessa parte. Depois, eu acabei me apaixonando também pelo Procópio e ele foi um ótimo marido durante os anos que fui casada com ele. Só lamento nunca ter tido filhos, mas no fim das contas eu não sei se eu seria uma boa mãe. Acho que não nasci pro ofício de dona de casa, sabe? Minha vocação começa e termina na cozinha, mas nenhum homem nunca me deu ordens...
-É desse atrevimento que eu gosto. Você nunca se rebaixou a nenhum homem, sempre reafirmou seu valor. Ah, Mara... se você soubesse o quanto me doeu quando você se casou com Procópio... claro que sempre estive ao lado de vocês e ele sempre foi meu melhor amigo, mas fico aqui pensando se as coisas fossem diferentes...
-Você me deixava insegura, Valentim. Todas as meninas da universidade queriam sair com você. Depois, eu não esqueci daquela noite que você me deixou plantada na porta do cinema te esperando, enquanto você tava se acabando com a Fernanda num motel.
-Mara, eu já te expliquei que naquela noite eu me esqueci do que tínhamos marcado.
-Não diminui o fato de ter esquecido de mim. Minha sorte foi que o Procópio acabou pintando no cinema naquela noite. Acho que foi ali que eu acabei vendo que ele era um homem melhor pra mim. Você, apesar de ser esse grande amigo nosso, nunca me deu certeza de nada. Com você eu só tinha dúvidas, inseguranças. Logo eu que nunca fui ciumenta, senti vontade de quebrar a cara daquela Fernanda... onde já se viu? Mulheres brigando por causa de macho?
-Mas você ainda sente falta, não sente? Porque eu sinto, Mara. Pra mim você nunca deixou de existir. Acho que nunca deixei de te amar.
-Isso tá ficando perigoso, Valentim... melhor a gente parar por aqui.
Valentim beija Mara. CORTA A CENA.

CENA 5: Bruno está no banho e percebe que esqueceu de seu barbeador. Resolve gritar para que Cláudio o escute.
-Amor, pega na minha mochila meu barbeador? Acabei esquecendo antes de entrar no banho...
-Em que parte da mochila tá, Bruno? Me diz que eu vou lá e pego.
-Tá dentro de um estojo dentro do bolso interno.
Cláudio vasculha a mochila de Bruno à procura do estojo com o barbeador e se depara com uma foto. Curioso, resolve ver quem está na foto e se choca com quem vê.
-Não é possível... Mateus? O Bruno conhece o Mateus? Calma, Cláudio... você deve estar entendendo errado, de repente é alguém muito parecido... respira, Cláudio... deve haver uma explicação pra isso... - fala Cláudio consigo mesmo.
Cláudio encontra o estojo e retira de dentro dele o barbeador, batendo na porta do banheiro para Bruno pegar.
-Tá aqui, amor. Vem pegar o barbeador.
Bruno abre a porta do banheiro e tenta dar um beijo para agradecer Cláudio, porém ele se esquiva.
-Eita, Cláudio... só queria agradecer!
-É que não tomei banho ainda, estou sujo... - desconversa Cláudio.
-É só isso mesmo, Cláudio? Sua cara tá estranha.
-Volta pro banho, Bruno... depois eu vou pro meu, ok?
Bruno volta ao banho e Cláudio tenta descobrir uma maneira de saber a verdade sobre a foto. CORTA A CENA.

CENA 6: No final da manhã, Mara e Valentim estão a caminho da companhia de teatro quando, passando em frente ao hotel onde “Chefe” se esconde, Valentim se depara com uma figura suspeita.
-Mara, é ele, de novo. Sempre com as mesmas roupas pretas e escondendo o rosto com esse óculos gigante. Se eu for atrás dele agora, ele vai desconfiar. Você pode descer do carro e tentar descobrir onde ele está indo?
-Claro, Valentim. Faz parte do meu trabalho. Eu vou ligar pro seu celular agora e manter essa ligação pra te informar dos passos do “Chefe”.
Mara desce do carro e segue “Chefe”, que está deixando o hotel naquele momento, a uma distância segura.
-Estou no rastro dele, Valentim. Ele acabou de dobrar à esquerda.
-Ótimo. Não deixe ele perceber que você o segue, certo? Mantenha uma distância segura.
-Claro...
Mara, no entanto, percebe que “Chefe” entra numa loja de atacado, onde há uma multidão de pessoas.
-Más notícias, Valentim. Ele entrou no atacadão.
-Fique mais perto dele, Mara. Com uma multidão no mesmo lugar ele não vai se perceber seguido tão facilmente.
-Vou tentar.
No entanto, “Chefe” entra no banheiro masculino com sua mochila e Mara fica frustrada.
-Valentim, não deu. Acho que ele tem um padrão diário ao deixar o hotel. Sem o disfarce eu não posso sair abordando cada homem que sair do banheiro masculino.
-Droga. Mais uma vez perdendo o rastro desse cara... está certo, Mara, você fez o que pode. Volte pro carro que ainda temos de ir pro teatro.
Valentim desliga o telefone, frustrado. CORTA A CENA.

CENA 7: Diogo percebe que Victor está com uma expressão preocupada.
-O que foi agora, Victor? Tou te sentindo tenso, preocupado.
-É medo, Diogo... medo de não ser homem suficiente pra você.
-Já te falei pra não se preocupar com isso. Você acha que eu não sei que você está fazendo o que pode para dominar esse seu transtorno? Eu sei que um transtorno mental é subestimado pelas pessoas porque não pode ser visto de longe, como uma mazela física, mas eu não sou assim, amor... eu sei que você se esforça, eu tenho empatia.
-Não é só isso, amor... claro que eu tenho medo que você se canse das minhas variações, das minhas recaídas... mas Diogo, meu medo é maior que isso.
-Fala, Victor. Eu sei que é importante pra você nesse momento.
-Eu tenho medo de que você acabe voltando com o Cláudio em algum momento.
-Mesmo que eu quisesse, meu amor, coisa que não quero, nossas vidas tomaram rumos diferentes... eu não vou mentir pra você: procurei ele sim, há algum tempo, quando não sabia que suas crises eram esse seu transtorno. Mas sabe qual foi nossa conclusão? Que a vida nos mudou. Se há um espaço hoje na vida um do outro, esse espaço só pode ser preenchido pela amizade. Você sabe que não sou desleal, Victor. Se eu achasse que existisse uma possibilidade mínima de haver um relacionamento com o Cláudio, eu diria. Mas sinceramente, desisti disso tem algum tempo. Eu amo você, Victor. De verdade.
-Mas no final das contas você mentiu pra ele... mentiu pra salvar a pele de vocês. Ele não sabe desse detalhe, pensa que você traiu ele.
-No que depender de mim vai continuar pensando. O que está feito está feito. Por favor, Victor... não vamos mais falar sobre isso hoje, tá?
Diogo abraça Victor e o acaricia.
-Vai ficar tudo bem, eu prometo. - arremata Diogo. CORTA A CENA.

CENA 8: Já no teatro, Mara e Valentim chamam Procópio para conversar antes de que os atores cheguem.
-Procópio, meu amigo... precisamos conversar com você. - fala Valentim.
Os três se dirigem à sala de Procópio.
-Pois bem, digam o que precisam dizer que já tou me corroendo de curiosidade. - fala Procópio.
-Seguinte, Procópio: estamos com dificuldades de seguir o rastro do “Chefe”. Queremos saber se você poderia colaborar conossco... - fala Mara.
-Mas como que posso colaborar? Eu não sou investigador como vocês, meus amigos...
-Mas foi casado com uma investigadora, cara! Você sabe o que fazer, não sabe? - questiona Valentim.
-Sei. Mas por que vocês querem que eu entre nessa investigação?
-Porque o “Chefe” parece estar ciente de que estamos no rastro dele. Se esquiva sempre. De você ele não desconfiaria, entendeu agora? - esclarece Mara.
Os três seguem conversando sobre as estratégias. CORTA A CENA.

CENA 9: Ao anoitecer, Cláudio chega novamente em casa e Bruno percebe que ele o trata secamente.
-Amor... que cara é essa? Fiz aquela lasanha que você gosta...
-Não estou com apetite hoje, Bruno.
-Você tá estranho, Cláudio. Desde hoje pela manhã tá estranho comigo e ainda me diz que não é nada.
-Ué, você não faz a mínima ideia do motivo? Achei que você fosse mais inteligente.
-Do que cê tá falando, cara? Não sou bom com charada, fala logo.
Cláudio pega de seu bolso a foto de Mateus e a mostra a Bruno, que fica atônito.
-Tem como me explicar como é que a foto do Mateus foi parar na sua mochila, Bruno? FIM DO CAPÍTULO 29.

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