CENA 1: Valentim fica admirado
com a coragem de Raquel.
-Confesso que não estava
esperando por essa resposta, Raquel. Fiz a proposta porque de fato eu
vi a vocação em você, mas essa sua decisão corajosa me
surpreendeu positivamente. Essa sua postura fala mais sobre você do
que você possa imaginar. Pelo visto terei uma brilhante colega em
breve! - se anima Valentim.
-Pensei muito em tudo antes de
dormir. Inclusive demorei a pregar o olho, de tanto que fiquei
pensando na proposta. Comecei a considerar todas as vezes que eu
ajudei as minhas vizinhas a solucionar pequenos casos, mistérios,
essas coisas. E entendi que eu nasci pra isso. Vai ser algo
completamente novo na minha vida, ainda mais a essa altura...
-Você se prende demais nesse
conceito de idade. O que importa é que você é jovial, bem disposta
e parece ter muita vontade de aprender.
-Sim. Mas nem sei por onde
começar, Valentim.
-Não se preocupe. Você vai
ser devidamente instruída por mim.
-Por mim, eu começava hoje
mesmo. Como sei que as coisas levam mais tempo que isso, quero poder
começar a colaborar com você o quanto antes.
-Falta ainda eu te apresentar
para Mara, que é minha companheira na Polícia Federal. Grande
investigadora, por sinal.
-Já estou ficando curiosa.
-Depois disso a gente vai te
passando outras instruções.
-Certo. Mas não tem nenhuma
instrução que você possa me passar agora?
-Eu posso te dar umas dicas,
pra ser sincero.
-Vou querer ouvir cada uma
delas.
-Você é mesmo porreta,
mulher! Vamos lá... primeira coisa é que você vai se colocada em
“teste”, para ver se você consegue solucionar alguns casos meus
que deixei arquivados aqui. Não vou te dar as respostas, óbvio, vou
separar o material que contém apenas as pistas e então você vai
chegando às suas conclusões. Passando por essa fase inicial, que
espero que seja com sucesso, você vai a campo comigo e com a Mara...
ou sem a gente, mas orientada por nós e com um distintivo provisório
que tenho como conseguir pra você dentro da lei. Se você for bem em
tudo isso e tiver a convicção de que quer continuar, vai ser mamão
com mel pra você passar no concurso depois...
-Eu tou achando tudo isso
muito interessante, de verdade!
Valentim segue a passar
orientações sobre os primeiros passos de Raquel como investigadora.
CORTA A CENA.
CENA 2: Já de volta em casa,
Rafael e Marcelo vão à edícula e encontram Haroldo pensativo por
lá.
-Ué, mano... o que te deu?
Parece que tá com cara de velório... - constata Rafael.
-Rafa tem razão, Haroldo...
você parece triste... - concorda Marcelo.
-Vocês se importam se eu
desabafar um pouco com vocês? Tou realmente precisando... - fala
Haroldo.
-Que isso, mano... sempre! -
fala Rafael.
-Eu me arrependo muito de tudo
que acabei fazendo o Cláudio passar... ele não merecia ter sido
feito de idiota. Mas eu não menti pra ele porque eu quis...
simplesmente não tive saída e, por mais que eu explique isso a ele,
acho que ele nunca vai acreditar ou entender. E o pior disso é que
eu não tiro a razão dele. Quem é que acreditaria? Eu nunca consigo
falar toda a verdade sobre tudo o que me aconteceu nesses dois
anos...
Haroldo começa a chorar.
Marcelo e Rafael o afagam.
-Deixa disso, cunhado... -
tenta consolar Marcelo.
-Vocês foram lá, não foram?
- pergunta Haroldo.
-Fomos... - fala Rafael.
-Ele perguntou por mim?
Mencionou alguma coisa sobre eu ter levado ele e o Bruno de volta pra
casa?
-Haroldo, meu mano véio...
vou ser sincero: ele mencionou só por cima. Ficou agradecido pela
carona. Mas parou por aí. O Marcelo até deu uma insistida, mas o
Cláudio pediu pra gente mudar de assunto quando o seu nome foi
tocado. - esclarece Rafael.
-Eu imaginei. Ele tem
dificuldade de passar uma borracha por cima das coisas. Também não
é pra menos... ele pensava que eu me chamava Rodrigo Bernardes.
Pensava que eu trabalhava fora e viajava a trabalho. Quando na
verdade eu estava... bem, acho melhor parar por aqui. Tem algumas
coisas que eu prefiro não falar, nem pra vocês. Tenho medo de
colocar a gente em risco por causa das burradas do passado.
-Você fica com essas meias
palavras, mano... o tempo todo. Só me responde uma coisa: você não
consegue falar tudo porque tem alguém te ameaçando ou ameaçando a
gente se você abrir a boca e contar toda a verdade? - questiona
Rafael.
Haroldo faz sinal afirmativo
com a cabeça.
-E o pai sabe disso? -
prossegue Rafael.
-Sabe até onde contei. Claro
que não dava pra falar muita coisa. Você não conhece nosso pai? Na
primeira oportunidade ele ia entregar tudo pro Valentim... e nós
somos os únicos além do Procópio que sabemos que a Mara e o
Valentim são da Polícia Federal. Por mais que eles sejam amigos
nossos e bem intencionados, imagina o estrago que isso poderia fazer
nas nossas vidas se eles, investigando tudo com uma delação minha,
falassem demais e isso chegasse em quem pode colocar a vida de todos
nós em risco? Eu não falo pra me proteger, mas acima de tudo, pra
proteger a todos nós. Esse é um dos motivos pelo qual eu fugi...
Rafael abraça o irmão,
comovido. CORTA A CENA.
CENA 3: Márcio percebe que
Suzanne está com expressão de desconfiança.
-Que bicho te mordeu? Desde
que sua mãe saiu você ficou com essa cara...
-É justamente por isso,
Márcio. Que tanto que a minha mãe fica saindo todo dia?
-Quem sabe porque ela tem vida
própria além de ficar nesse apartamento de hotel?
-Você sempre defendendo a
dona Raquel. Desde garoto que é assim, impressionante como você não
muda o discurso.
-É o mínimo que devo.
Gratidão a quem me acolheu como uma mãe na casa dela, quando meus
próprios familiares me viraram as costas por causa dos delitos que
cometi. Ela acreditou em mim quando ninguém mais acreditava. Dona
Raquel é a mãe que eu sempre quis ter.
-Pega ela pra você, então...
ela é toda sua. Será que você não percebe que ela pode estar indo
atrás de coisas que podem prejudicar a gente? Isso nem passa pela
sua cabeça, né Márcio?
-Na boa? Acho que você tá
pirando demais. Sua mãe não pode ter a vida dela? A independência
de sair e voltar a hora que bem quiser?
-Ela pode. Mas ela nunca diz
direito pra onde vai. Sempre fica nessa coisa de que vai dar uma
volta e tudo mais. Parece que tá sempre escondendo alguma coisa de
mim.
-Não meça ela pela sua
própria régua. Quem enganou sua mãe, desde garota, foi você.
-Não precisa me jogar essas
coisas na cara, Márcio.
-Suzanne, sinceramente eu acho
sem sentido desconfiar dela.
-Não sei... meu sexto sentido
diz que não é tão sem sentido assim...
-E desde quando você tem
sexto sentido? Sempre riu de quem dizia que tinha...
-Ai, Márcio... vai cagar,
vai! Você é burro assim mesmo ou faz esforço pra ser mais ainda?
Você entendeu perfeitamente o que eu quis dizer... não é que eu
sinta. Mas não é preciso ser gênio nenhum pra constatar que essas
saídas dela, tão constantes, são no mínimo esquisitas...
-E você queria o que? Que ela
ficasse aqui presa o tempo inteiro? Você acha que ela não deixou
amigos em Curicica?
-Credo, tá difícil ter
qualquer conversa com você hoje, Márcio. Quem vai dar uma volta sou
eu, isso sim, pra me poupar de olhar pra essa sua cara!
Suzanne sai, impaciente. CORTA
A CENA.
CENA 4: Laura resolve aparecer
de surpresa na casa de Cláudio e Bruno a atende.
-Oi, Laura... veio ver o
Cláudio? Ele já saiu pra trabalhar.
-Putz... me enganei. Podia
jurar que hoje era o dia de folga dele.
-Não, Laura... foi ontem.
-Mas não vou perder a viagem
agora, né... você se importa de eu te fazer companhia hoje enquanto
o Claudinho não chega? Não tenho ensaio hoje...
-Vai ser um prazer, Laura. Eu
gosto de você... e sinto muito por tudo o que te fiz passar no
passado.
-Você não foi responsável
por nada. Eu não te julgo... vamos colocar uma pedra nesse assunto.
Não existe Mateus hoje, ok?
-Tudo bem, acho melhor assim.
Você quer um café?
-Vou aceitar sim.
Bruno serve o café para Laura
e para ele.
-Está uma delícia. Sabe,
Bruno... eu nem sei se devia confidenciar uma coisa dessas a você,
mas eu sinceramente preferia que o Cláudio estivesse ainda namorando
com você. Espero que não leve a mal...
-Eu também sinto falta dele
como namorado. Mas é a vida... a gente paga pelos erros que comete.
-Sinceramente espero que o
Cláudio um dia consiga ver que o homem certo pra ele é você. Você
tem algo de especial... não sei se é pelo olhar, mas você me
transmite uma coisa muito boa.
-Assim você me envergonha...
- fala Bruno, enrubescido.
-Desculpe... mas é que eu
gosto de você de graça, é de coração. Já aquele outro, o
Guilherme... aquele lá é outra história. Nunca fui muito com a
cara dele, ele me dá arrepios!
-Mas o Cláudio disse que no
começo você apoiava ele e o encorajava pra se declarar pro
Guilherme...
-Fiz isso por amor ao meu
amigo e porque não sabia quem era direito o Guilherme. Depois que o
Cláudio se declarou, aquele ano passou a ser o pior pesadelo já
vivido pelo Cláudio. Aconteceu de tudo... e o Guilherme maltratou
demais o Claudinho! Não entendo o que motiva ele a estar junto dele
agora... ficando com o Guilherme, depois de tudo. Sabe síndrome de
Estocolmo? Acho que só isso explica.
-Sabe, Laura... te confesso
que não gosto desse Guilherme também. Você promete que não conta
pra ninguém, nem pro Cláudio, uma coisa que preciso te confessar?
-Fala, querido. Pode confiar
em mim que eu sou leal.
-O Guilherme tentou me ameaçar
num momento que o Cláudio tinha ido pro banho. Não me deixei
intimidar. Ele queria que eu me afastasse o quanto antes do Cláudio.
-Sério, isso? Tou chocada! E
você iria pra onde? Porque pra peça ali do lado não dá mais, já
foi ocupada.
-Justamente, Laura... é claro
que eu não me deixei ser intimidado, mas achei completamente absurdo
ele chegar ao ponto de me ameaçar só por causa do suposto amor que
ele diz sentir pelo Cláudio.
-Sabe do pior? Acho que esse
Guilherme realmente ama o Cláudio. Só não sei se isso é
saudável...
Os dois seguem conversando.
CORTA A CENA.
CENA 5: Mateus vai ao
esconderijo de “Chefe” por ordens dele. Como habitual, a voz de
“Chefe” é ouvida abafada e apenas sua silhueta aparece.
-Eu disse que te queria aqui
em quinze minutos, você levou dezessete minutos pra chegar aqui.
-O que são dois minutos de
atraso, chefe? Você ao menos me disse o motivo dessa chamada...
-Você está cansado de saber
que não tolero atraso entre meus subordinados. Tem de ser
pontualidade, senão eu vou penalizar. Como foram só dois minutos,
dessa vez vou pegar leve.
“Chefe” dá um soco no
estômago de Mateus.
-Vê se agora não se atrasa
mais esses “dois minutinhos”, viu?
-Isso doeu, sabia?
-Foi pra doer mesmo, Mateus.
Eu te chamei aqui porque andei sabendo que a sua namoradinha anda
descobrindo coisas demais. Dê um jeito de parar ela.
-Parar ela? A Laura não é
uma investigadora. Tudo o que ela soube foi de meu caso com Bruno no
passado, nada além disso. Além, claro, da minhas pequenas armações
pra conseguir destaque na TV, mas ela parou por aí.
-Você me dá sua palavra?
-E por que não daria, chefe?
Alguma vez já te falei alguma mentira?
-Olhando por esse lado...
realmente não. E é bom que ela fique quieta. Se ela não ficar, dê
um jeito de ela ficar quieta. Senão já sabe: eu mando matar vocês
dois e isso é uma ameaça bem real, não me subestime. Pode ir.
Mateus vai embora, assustado.
CORTA A CENA.
CENA 6: Horas mais tarde, já
pela noite, Diogo está se arrumando e Victor o chama.
-Tá pensando em sair hoje,
amor?
-Faz tempo que eu não saio
para beber e curtir a noite. Por que você não vem comigo? Você vai
gostar.
-E que graça teria eu ir, se
nem beber eu ando podendo?
-Existem outras formas de se
divertir.
-Ah, é mesmo? Então por que
quando você sai, você sempre chega fedendo a bebida, se não é
preciso beber pra se divertir? Você sabe se divertir sem beber?
Então por que bebe? Ah, já sei... pra esquecer o Cláudio... - fala
Victor, claramente entrando em crise.
-Você está entrando em
crise, amor. Tente se controlar, respira fundo... eu já te trago o
medicamento.
-Claro, né? Assim você me
deixa mansinho e sai pra beber todas sem sentir culpa!
-Tá, Victor. Eu não vou mais
sair hoje. Não posso te deixar aqui em casa nesse estado.
-Pelo menos um pingo de
consideração ainda te resta...
-Victor... sério. Não entra
nessa trip errada. Por favor. Você vai jogar fora tudo o que a gente
tá conseguindo evoluir com o tratamento?
-Pra você é fácil falar,
não é você que convive com esse transtorno limítrofe...
-Não, amor... não foi isso
que eu quis dizer. Mas tenta se tranquilizar! Toma aqui o seu
medicamento.
Victor toma um comprimido e
volta a falar.
-Se não fosse o Cláudio ter
passado na sua vida, você não teria se tornado esse cara boêmio
que se tornou.
-Eu não acredito que você tá
colocando a culpa nele de novo! Você o conheceu! Viu o quanto ele é
gente boa.
-Mimimi, gente boa, mimimi...
tá, ele é legal. Mas e daí? Não exclui o fato de que vocês
namoraram e ele só acabou contigo porque acreditou na mentira da
traição.
-Victor... vai dormir, sério.
Você já tá falando merda.
Diogo vai à geladeira pegar
um copo de água. CORTA A CENA.
CENA 7: Bruno nota que Cláudio
está melancólico.
-Que cara é essa de quem tá
em qualquer lugar, menos no presente?
-Você sempre consegue me ler,
Bruno... tou meio melancólico, relembrando o passado.
-Algo me diz que você está
transportado pra algum momento que deve ser há uns cinco ou seis
anos, estou certo?
-Sim, Bruno. Eu fico lembrando
de tudo. Daqueles primeiros meses no colégio... eu via o Guilherme
todos os dias, diante de mim, na carteira da frente... ele era o
garoto mais bonito da minha turma, do colégio inteiro, sabia?
-Imagino... até hoje ele é
bem bonito, mesmo.
-Não é? Eu ficava encantado
por ele. Logo me apaixonei... mas não sabia como me declarar. Mal
sabiam que sou gay naquela época e sempre fui tímido e
introvertido. Só a Laura sabia... e me encorajava pra me declarar, o
que levei uns quatro meses pra conseguir fazer.
-E foi aí que começou o
tormento, né? Dele se fingir de hetero, essas coisas...
-Não foi fácil. Mas estamos
aqui. Chegamos onde chegamos. Eu amei muito esse homem, Bruno. Amei
tanto que doeu muito dentro de mim ver cada crueldade que ele fez
comigo pra manter intacta a imagem de hetero.
-E ainda ama?
-Não sei. Eu sinto que ele me
ama. Mas ao procurar esse amor dentro de mim, não sei se consigo
reencontrar. Sinto que ele precisa mais de mim do que eu dele...
então faço um esforço pra encontrar esse amor dentro de mim.
-Talvez ele tenha morrido,
Cláudio.
-Talvez tenha. Mas eu preciso
tentar encontrar dentro de mim antes, pra me certificar com cem por
cento de certeza. Não posso deixar ele só... eu vejo que ele tem
problemas, que precisa de compreensão e não de julgamentos.
-Eu admiro a sua generosidade
com ele. Só espero que não se arrependa nem tome decisões
precipitadas.
-Vou tentar agir da melhor
forma possível, meu amigo...
Os dois se olham com
cumplicidade. CORTA A CENA.
CENA 8: Suzanne chama sua mãe
para conversar.
-Tá tudo bem com a senhora
ultimamente?
-Tá sim, Suzanne... por que
essa pergunta, filha?
-Notei que você anda saindo
todos os dias... quase sempre nos mesmos horários.
-E o que isso tem demais?
Gosto de andar por aí... pensar na vida. Ficar presa aqui nesse
apartamento de hotel não faz muito meu estilo.
-Por que será que não
acredito nessa sua desculpa, mãe?
-Isso é jeito de falar
comigo, Suzanne Farina Lopes?
-Não me chame pelo nome
completo que isso não me mete medo. Fala de uma vez com que tipo de
coisa a senhora tá envolvida, fala! - fala Suzanne, confrontando a
mãe.
FIM DO CAPÍTULO 48.
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