CENA 1: Rafael está em
desespero e Marcelo tenta conter o namorado.
-Amor... respira fundo. A
gente não pode perder a calma agora.
-Como é que eu não vou
perder a calma? Essa situação saiu de controle! Eu não tive tempo
de chamar a imprensa pra falar tudo antes. Daí chega essa imprensa
marrom e lança a informação na frente! Você tem noção do quanto
isso é prejudicial e tem potencial destrutivo? Olha a linguagem
baixa e cheia de preconceitos que essa gente nojenta usa! Eu estou
acabado...
-Rafa... eu não sei se você
percebeu um pequeno detalhe nisso tudo. Um detalhe que eu te avisei,
inclusive, mas receio que tenha sido tarde demais...
-Que detalhe é esse, Marcelo?
-Para e pensa, Rafael... quem
é a única pessoa que sabia dos seus planos de contar tudo pra
imprensa?
-O Mateus... mas você acha
que ele faria isso?
-Às vezes a sua ingenuidade
me surpreende e não é de forma positiva, amor... você esqueceu que
foi o Mateus que mexeu os pauzinhos dele dentro da emissora pra ficar
com o papel que era pra ser seu? Quem faz isso, faz muito mais...
-Mas ele já conseguiu o que
queria. Não faz sentido ele fazer isso.
-Tem certeza que não faz
sentido? Eu esperava mais do seu raciocínio, Rafael...
-Você está insinuando que
ele... teria feito isso pra me tirar do caminho dele de vez? Pra
conseguir o destaque dele na TV e não me ter como ameaça? Se ele
fez isso, esse cara não tem um pingo de caráter!
-Você ainda duvida disso,
amor? Ele já provou que é um ser invejoso e recalcado, que só
consegue alguma coisa derrubando quem ele considera ameaça.
-Claro! E ele me considerou
ameaça desde sempre.
-Com certeza. Ele sempre teve
inveja. Devia ficar com raivinha porque você é filho da Marion, que
já nasceu famoso, com o que ele considera facilidade. Ele ignora o
seu talento... pensa que você só chegou onde chegou porque é da
família que é... enquanto ele saiu quase criança da Bahia e teve
de lutar sozinho pra chegar onde chegou.
-Mas não entendo onde o
caráter desse infeliz do Mateus se perdeu. Pensei que todo esse
esforço, toda essa luta pra superar as dificuldades iniciais
pudessem fazer dele uma pessoa que reconhece o valor de lutar pra se
chegar onde se quer.
-Você às vezes é tão
ingênuo, Rafael... não percebe que algumas pessoas tem o caráter
torto de largada. Elas se revelam quando ganham a primeira mínima
dose de poder nas mãos.
-Eu vou dar um jeito de dar
uma lição nesse babaca. Mas ao contrário dele, eu não preciso
prejudicar ele. Um dia ele vai acabar se queimando por conta própria.
-Ainda bem que você entendeu
isso, amor... mas o que exatamente você pretende fazer sobre o
Mateus?
-Isso eu vou terminar de
decidir amanhã, Marcelo... mas não vamos perder nosso sono por
isso...
-Isso mesmo, amor... não
vamos dar esse gostinho pra ele. Vamos dormir o sono dos justos...
-Amanhã esse infeliz vai se
ver comigo. Pode escrever!
-Tá, Rafael... vamos tentar
esquecer disso agora... precisamos descansar.
Os dois tentam dormir. CORTA A
CENA.
CENA 2: Na manhã do dia
seguinte, Mateus está se preparando para ir para as gravações
quando Laura o surpreende.
-Nunca te vi acordar tão
cedo, Laura... caiu da cama?
-Nem dormi. Sabe por que?
Porque eu vi aquela palhaçada que foi publicada no site de fofocas
sobre o Rafael e o Marcelo.
-E daí? Não é verdade? Eles
estão juntos! Querem se casar... se esse pessoal da imprensa marrom
descobriu antes, paciência.
-Você deve estar achando que
sou alguma espécie de anta, não é possível. Eu sei que foi você
quem fez isso!
-Você tá maluca, Laura? Como
é que eu ia fazer isso? Eu tinha gravações ontem.
-Só depois das dez da manhã.
E eu lembro direitinho quando você veio me contar cheio de ironia
que os “pombinhos” iam se casar antes de ir pra emissora.
-Ah, claro, Laura... e eu ia
me arriscar a chegar atrasado nas gravações pra falar com o pessoal
desse site?
-Tenho certeza de que você
pensou no álibi antes. Não tenho a mínima dúvida de que foi você
o responsável por esse vazamento lamentável.
-Você pode provar? Não pode.
Agora dá licença que eu preciso me arrumar, sabe como é... não
gosto de chegar atrasado no meu trabalho.
-Aos outros você pode
enganar, mas não a mim, Mateus. Eu te conheço. Você realmente não
tem noção das coisas, né? Parece ignorar que coisas como essa tem
consequências, cedo ou tarde.
-Ué... deu pra falar de lei
do retorno agora, Laura? Me poupe, se poupe, nos poupe! Você nem
acredita em Deus...
-Você não percebe que essa
cachorrada que você fez com o Rafael pode acontecer um dia com você?
-Não vai acontecer. Sabe por
que? Porque eu sou precavido.
-Você não é precavido. É
um covarde, um ladino, traiçoeiro. Saiba que isso pode acontecer com
você sim. Você não sabe quantos ali na emissora agem dessa mesma
forma suja que você agiu. E ao que me consta, você tem tantas
coisas a esconder quanto o Rafael tinha... ou mais ainda. Um dia,
tudo isso pode se voltar contra você e daí, meu querido, quem vai
ter a carreira acabada é você. E vai ser justo, porque você só
vai estar colhendo o que você mesmo plantou.
-E o que você vai fazer,
posso saber? Protestar no teatro? Chamar a imprensa? Falar com o
Rafael que fui eu? Pode falar! Quero mais é que ele saiba. Na
posição que eu tou dentro da emissora, com a novela prestes a
estrear, eu não tenho como perder o que conquistei. Vai em frente,
faça o que você quiser.
-Você já perdeu há muito
tempo a dignidade. Não deve ter mais nada a perder, mesmo. E o que
você conquistou não foi por mérito... foi na desonestidade, na
base de golpe, na base de intriga.
-Laura... você realmente não
entende. Nada foi fácil pra mim na vida. Saí da Bahia praticamente
criança e nunca mais vi meus pais.
-E onde é que o Rafael entra
nisso? Suas desculpas pra ter inveja do que ele conquistou são
patéticas. Mas vai, termina de se arrumar aí... afinal, você não
pode se atrasar pro seu trabalho, não é mesmo?
Laura deixa o quarto furiosa.
CORTA A CENA.
CENA 3: Horas mais tarde,
Suzanne e Haroldo passeiam pelo Jardim Botânico.
-Achei ótima a sua ideia de
virmos aqui, Haroldo... esse lugar é tão inspirador!
-Não é, Suzanne? Gosto da
paz que consigo encontrar aqui. Você já ficou aqui nos dias que
chove? É mágico. Dá vontade de sair rodopiando, dançando,
abraçando essa natureza toda...
-Nossa, Haroldo... você me
surpreende. Tem sensibilidade. Pra te ser sincera, nunca fui de vir
muito aqui... nunca estive em dias de chuva no Jardim Botânico. Mas
imagino que seja ótimo diante de tanto verde.
-É algo único, inigualável.
Palavras não podem descrever. Um dia eu ainda te trago aqui quando
estiver pra chover. Você vai sentir como a força da natureza é
incrível. Vai sentir como a terra se comunica com a gente e nos
revela coisas sobre nós mesmos que quase sempre ignoramos...
-Nossa... deve ser incrível,
mesmo. Mas sabe o que mais eu acho daqui?
-Diga, Suzanne.
-Que esse lugar é romântico.
-Ah, isso também é...
principalmente pela manhã. Esse ar fresco, ainda sem sentir o
calorão do resto do dia... dá uma sensação de renovação na
gente... como os sentimentos que se renovam entre os apaixonados.
Os dois se beijam.
-Você tá se apaixonando por
mim ou eu tou ficando doida? Porque tou começando a gostar de você.
-Suzanne... não. Eu preciso
ser claro contigo: não temos nada sério. E não pretendo ter nada
sério com você.
-Por que? Tem algo de errado
comigo?
-Não tem nada de errado com
você. Só não estou preparado pra me apaixonar por alguém agora.
Ainda não superei completamente o Cláudio. Não abri mão dele por
vontade própria, fui obrigado a isso. Preciso do meu tempo pra
digerir tudo isso.
-Mas e se não tivesse
existido o Cláudio antes, você se apaixonaria por mim?
-Não sei dizer. Não costumo
tergiversar sobre o que poderia ter sido. Não foi assim que as
coisas aconteceram na minha vida. Talvez eu me apaixonasse, talvez
não. Mas não se iluda comigo, Suzanne... nós não vamos passar
dessas ficadas e passeios eventuais. Não tenho estrutura emocional
pra encarar um romance agora. Não sei quando vou conseguir. Você
ainda é jovem, um pouco menos que eu... não deve esperar por mim.
Você merece alguém que esteja entregue. E eu não vou estar
entregue a você tão cedo... desculpe a franqueza.
-Imagina, Haroldo... aprecio
sua sinceridade. Podemos ser grandes amigos ainda assim...
Suzanne esconde sua raiva de
Haroldo. CORTA A CENA.
CENA 4: Adelaide e Cleiton
chegam à casa de Regina e Geraldo.
-Demoramos, queridos? - fala
Adelaide.
-Chegaram em boa hora. As
meninas já saíram pra trabalhar... - fala Regina.
-Bem, como vocês devem saber,
eu sou a Adelaide e esse é meu marido Cleiton, somos os pais da
Renata.
-Entrem, por favor... -
convida Geraldo.
-Bem, na verdade eu só vim
acompanhando a Adelaide. A conversa que ela precisa ter com vocês
foi iniciativa dela. Então não se espantem se eu não me manifestar
muito... - fala Cleiton.
-Está certo. Sentem-se, por
favor. - fala Regina.
-Sabe, gente... eu vim
conversar com vocês porque ainda tou encontrando dificuldades em
lidar com tudo. Sei que não devia, mas foi uma vida inteira
acreditando em muitas coisas que alimentavam meus preconceitos em
relação a gays e lésbicas... - começa a falar Adelaide.
-Nós aceitamos receber vocês
porque queremos ajudar. Não se acanhe em dizer sobre suas dúvidas,
dores e tudo o que quiser nos dizer. Nós sempre aceitamos a
homossexualidade de Eva porque entendemos que não devemos aceitar,
mas sim respeitar a individualidade de nossa filha, mas sabemos
perfeitamente que nós não somos ensinados, nem pelos nossos
próprios pais, a acolher a diferença no nosso seio familiar. É
preciso que saibamos romper com os “valores” que na realidade são
preconceitos que nos são repassados, muitas vezes de forma impensada
e automática, ao longo das gerações... - fala Regina.
-É mais ou menos sobre isso
que eu queria desabafar, sabe Regina? Tem sido uma dificuldade muito
grande pra eu conseguir me desfazer desses “valores” que absorvi
desde sempre. Mais difícil ainda porque sou da igreja e fico
morrendo de medo da reação do pastor...
Todos seguem a ouvir o relato
de Adelaide.
CENA 5: Rafael e Marcelo
chegam à companhia de teatro no intervalo para lanche dos atores.
Marcelo fica a conversar com Cláudio e Rafael chama Laura para uma
conversa.
-Então, Laura... nós
precisamos falar sobre o Mateus.
-Eu já sei do que se trata,
Rafael... ainda bem que terminei com ele. Eu vi aquela notícia
lamentável no site de fofocas.
-E sabe que foi ele, não
sabe?
-Sei. Se você tinha alguma
dúvida sobre isso, Rafael... pode ficar sem dúvida nenhuma. Tive
uma discussão feia com ele hoje pela manhã. Não consegui pregar o
olho depois que li a notícia ainda ontem à noite. Sabia que aquilo
tinha dedo do Mateus.
-E o que você fez?
-Ele tá ciente de que eu
confirmaria a você. E se você não me procurasse aqui no teatro, eu
mesmo te procuraria ainda hoje. Cansei dessas mentiras, dessas
intrigas. A coisa ficou insustentável nos últimos tempos. Ele
também gosta de meninos e devia pensar duas vezes antes de fazer
essas merdas que fez contra você. E sabe do pior? Ele fez isso foi
pra te derrubar mesmo, por inveja e despeito.
-Ele só não contava, Laura,
que eu fosse me manter firme. Eu disse que vou assumir minha
sexualidade e o relacionamento com Marcelo pra imprensa e vou! Mas
antes disso... acho que vou querer levar um papinho com ele.
-Por mim você pode fazer o
que quiser. Minha casa tá aberta a qualquer hora. Ele precisa ouvir
poucas e boas, mesmo... talvez assim caia na real.
CORTA A CENA.
CENA 6: Horas depois, Cláudio
chega em casa depois do ensaio no teatro e encontra um bilhete de
Bruno.
“Fui ao supermercado.
Guilherme está dormindo e medicado. Teve uma crise, mas logo ficou
tranquilo. Volto antes das nove.
Beijos, Bruno.”
Cláudio vai até o quarto e
encontra Guilherme profundamente adormecido, coberto por um edredom.
Cláudio senta-se ao lado dele e acaricia seus cabelos.
-É, seu meninão... acho que
tou aprendendo a te amar...
Cláudio pensa em Bruno. Seu
pensamento ganha voz.
“Mas não consigo deixar de
pensar no Bruno... eu sinto falta do que a gente teve... essa dúvida
ainda vai me deixar maluco...”
CORTA A CENA.
CENA 7: Marion e Valquíria
chegam em casa mais cedo. Marion vai direto ao quarto de Rafael e
Marcelo para conversar com o filho.
-Oi queridos.
-Chegou cedo em casa hoje,
mãe... - constata Rafael.
-Eu consegui liberação pra
mim e pra sua avó irmos embora mais cedo, porque não estávamos
conseguindo nos concentrar... você deve imaginar porque, filho.
-Então, mãe... eu tava
conversando agora com o Marcelo sobre isso. Eu tou pensando em falar
com a imprensa amanhã mesmo. Faria isso de qualquer jeito. Mas
antes, eu tou pensando em fazer uma visitinha a quem vazou essa
informação, que eu sei quem é...
-Você acha que precisa? O
site de fofoca que não devia ter publicado, filho. Vou processar
esse site.
-Mãe, você tá louca? Não
faz o mínimo sentido. Geralmente o site é processado por espalhar
mentiras e boatos. Minha sexualidade e meu amor por Marcelo não são
mentira. Processar o site de fofocas não faz sentido...
-Você tá certo, meu filho.
Às vezes esqueço que você decidiu mesmo se assumir pra imprensa
toda.
-Agora eu preciso tomar um
banho, mãe...
-Tudo bem...
Marion deixa o quarto. CORTA A
CENA.
CENA 8: Instantes depois,
Rafael sai do banho e começa a se arrumar.
-Você tem certeza de que vai
mesmo ir lá na casa da Laura?
-Claro que tenho, Marcelo.
Antes de falar à coletiva de imprensa, eu preciso falar umas
verdades na cara daquela bicha infeliz.
-Tenho medo que você perca a
cabeça.
-E daí se eu perder? Mateus
faz as merdas e cedo ou tarde vai acabar pagando por isso. Se eu
antecipar esse pagamento, o que é que tem?
-O que é que tem? Você
realmente tá me perguntando isso a sério? Eu te respondo, Rafael:
se você perder a razão, ele pode virar o jogo a favor dele. Já
tivemos provas de que ele é ardiloso o suficiente pra isso.
-Tá... eu sei disso. Eu
prometo que vou me controlar.
-Eu só vou acreditar que você
realmente consegue se controlar diante desse infeliz vendo com meus
próprios olhos. Você só vai se eu for com você.
-Ah, não... negativo. Esse
papo é entre eu e Mateus. Não se mete, meu amor... por favor.
-Eu já tou metido nisso desde
aquela notícia no site de fofocas.
-É, mas já tá ficando tarde
e eu não quero demorar muito pra chegar lá.
-Eu tomo um banho rápido, mas
eu vou com você.
-Marcelo, eu tou te pedindo.
Confia em mim...
-Eu confio em você. Não
confio é nesse Mateus. Se esqueceu que eu conheço esse daí de
outros carnavais? Estudamos no mesmo colégio... vai por mim, Rafa...
-Já vi que não tem jeito
mesmo. Tá, você vem comigo... no fim eu até prefiro que seja
assim. Eu não sei como eu vou reagir quando olhar para aquela cara
lavada do Mateus.
-Eu tou dizendo...
-Então se apressa e vai pro
banho, amor. Já tá ficando tarde.
-Tá. Não demoro nem cinco
minutos no banho, eu prometo.
Marcelo parte para o banho.
CORTA A CENA.
CENA 9: Rafael e Marcelo
chegam ao prédio onde Laura e Mateus moram e estacionam. Marcelo
nota que Rafael está tremendo de raiva.
-Procura se conter, amor! Tou
vendo você tremendo de longe...
-Tá... vou respirar fundo.
Os dois caminham e chegam ao
apartamento de Laura e tocam a campainha. Laura abre.
-Olá, meninos... Mateus,
visita pra você!
-Quem será? Não lembro de
ter chamado ninguém... - fala Mateus, se levantando. Ao chegar na
porta, se depara com Rafael e Marcelo.
-Seu desgraçado! - fala
Rafael, nocauteando Mateus com um soco. FIM DO CAPÍTULO 56.
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