CENA 1: Valentim segue a falar.
-Encontrei uma maneira eficaz
de descobrirmos de uma vez por todas se o seu neto está vivo ou
morto.
-Diga, Valentim!
-Então, Raquel... basta
buscar os registros de óbito em Niterói no período correspondente
ao nascimento do seu neto. Claro que o período de pesquisa tende a
se estender até alguns dias depois. Se de fato tiver acontecido o
óbito desse bebê, algum médico, não importa de que hospital, deve
ter assinado o atestado de óbito.
-Sim, Valentim... mas tudo
isso que cê tá me dizendo é um tanto quanto vago. Evidentemente
deve ter acontecido óbitos de recém-nascidos naquele período. Como
você vai efetivamente descobrir alguma coisa baseado somente nessas
informações? Não faz o mínimo sentido, desculpe dizer...
-Raciocine comigo, Raquel: nos
registros de óbito constam a filiação dos falecidos, certo?
Independente de serem bebês ou não, pais vivos ou não... faz parte
do processo, certo?
-Sim... acho que tou começando
a compreender.
-Então, seguindo essa linha
de raciocínio, não havendo registro ou denúncia de abandono de
incapaz naquele período em toda a cidade, isso facilita as coisas...
-Deixa ver se entendi:
facilita porque, se houver um único registro de óbito de
recém-nascido de pais desconhecidos, esse então seria o meu neto, é
isso que entendi?
-Exatamente, Raquel. Não
havendo esse registro em nenhuma documentação, significa então que
seu neto não morreu ao nascer.
-De qualquer maneira, vai
continuar a ser uma informação de pouco valor. Só vamos confirmar
se ele morreu ou não, mas não vamos saber ainda sobre o paradeiro
do menino...
-Engano seu. Claro que durante
algum tempo essa vai ser a única informação de que vamos dispor.
Mas digamos que constatemos que não houve o óbito: qual seria o
próximo passo, naturalmente?
-Ir atrás dos registros dos
orfanatos e das listas de adoção da cidade...
-Bingo! Viu como você tem o
faro de investigadora?
-Certo... mas de qualquer
maneira, como é que a gente chegaria numa informação conclusiva a
esse respeito, Valentim? A probabilidade de haver bem mais de uma
criança nascida em 4 de maio de 1995 deixada em orfanatos é
grande...
-Nesse caso eu deixo para você
pesquisar a árvore genealógica da família do pai da criança.
-O que? Mas onde que os
antepassados do Márcio entrariam nisso? Desculpa, Valentim, mas não
entendi nada agora...
-Simples, Raquel: você e sua
filha são brancas, de origem espanhola, certo?
-Sim, certo... mas não
entendi ainda onde que os antepassados do Márcio entram na jogada.
-Me responda, Raquel: você
sabe a descendência dele?
-Claro que sim... ele descende
de húngaros, belgas e de indígenas. Acho que tou começando a
entender.
-Justamente. Basta a gente
jogar no google qualquer pesquisa de biologia pra concluir que
juntando esses fatores, a gente exclui automaticamente as crianças
de pele escura ou negras, que não poderiam nesse caso, serem o seu
neto.
-Sim, mas isso a gente só vai
poder fazer se ele realmente estiver vivo...
-Espero que descubramos isso
logo, Raquel.
CORTA A CENA.
CENA 2: Em Angra dos Reis, na
manhã do dia seguinte, Rafael acorda Marcelo com um café da manhã.
-Bom dia, meu marido!
-Devo ter morrido e ido pro
céu. Olha bem pro monstro que cê tá criando, Rafa... sou rápido
em ficar mal acostumado. Depois, quando você voltar a trabalhar na
TV, não reclame se eu não sair da sua cola...
-Seu bobo. Tá bom esse café
da manhã?
-Tá ótimo, amor... tudo o
que eu gosto... não é a toa que casei com você.
-E a sua alergia, melhorou?
-Acho que sim... quase não
sinto mais a coceira.
-Hmm... que ótimo! Posso dar
uma olhadinha nos braços e nas costas?
-Claro, amor!
Rafael olha para os braços e
para as costas de Marcelo e fica intrigado.
-Tem certeza que a sensação
de coceira diminuiu, Marcelo?
-Tenho sim... por que?
-Porque as irritações
continuam iguaizinhas a ontem quando a gente saiu do mergulho,
acredita?
-Estranho, Rafa... ainda sinto
coceira, mas nem de longe tão intensa quanto ontem.
-Vamos ver como isso evolui,
né? De repente foi algum fungo, alguma coisa pouca... mas fico
preocupado.
-Para com isso, amor... eu que
estou com essas irritações não estou tão preocupado, você não
deveria ficar assim.
-Ah, Marcelo... me preocupa o
seu bem estar, você sabe disso.
-Mas chega desse papo porque
você não comeu nada ainda e imagino que esteja morto de fome.
Os dois seguem com o café da
manhã. CORTA A CENA.
CENA 3: Horas mais tarde,
Laura está indo para o intervalo de seus ensaios na companhia de
teatro quando se depara com Haroldo.
-Haroldo? É esse o seu nome,
não é? Irmão do Rafa e tudo mais...
-Sim. Você é a Laura, certo?
-Isso mesmo. Sou amiga do
Cláudio e amiga do Marcelo. Não esperava ver você aqui no
teatro...
-Às vezes gosto de passar meu
tempo vendo os atores ensaiando. Acho que lá no fundo eu sempre quis
ser ator, mas como sou péssimo ator, nunca me arrisquei a subir num
palco.
-O que te faz pensar que seria
péssimo? Bem, se não se importa eu vou indo à lanchonete, se
quiser vem comigo...
-Vou sim... enfim, ah... eu
não sei se presto pra ser ator. Morro de aflição de imaginar
aquele público todo olhando pra mim num dia de apresentação, por
exemplo.
-Besteira. A gente passa por
esse nervosismo, mesmo... você devia tentar ver como funciona tudo.
Fazer as dinâmicas de grupo, os exercícios de confiança e tudo
mais... sabia que grande parte de atuar consiste na maneira que
expressamos nossos corpos?
-Nossa... nunca parei pra
pensar por esse lado, sério mesmo.
-Pois não sabe o que perde,
Haroldo. É uma liberação de endorfina equivalente a ir numa
academia...
-Sempre detestei academia,
Laura...
-Mas é aí que vem a vantagem
do que a gente faz nos ensaios... você se exercita sem perceber que
tá se exercitando. Acaba pegando gosto pela coisa, fica meio
dependente dessa endorfina... se torna até mais feliz, sabia?
-Desse jeito que você fala,
tão empolgada e cheia de paixão, dá até vontade de tentar entrar
no grupo de atores da companhia.
-Não seria uma má ideia,
viu? Tenho certeza que você não se arrependeria e ainda descobriria
como é ótimo ser ator...
Os dois se olham, encantados
um com o outro. CORTA A CENA.
CENA 4: Regina e Geraldo
estranham Eva não ter ido ao ensaio.
-Poxa, filha... você mal casa
com a Renata e deixa de ir ao ensaio que vocês sempre costumavam ir
juntas? - fala Geraldo.
-Ah, pai... ando tão
desanimada, tão pra baixo! Não é que eu não ame o teatro, amo
muito! Mas me frustra ter sido esquecida pela emissora... uma ponta
em um seriado já tava valendo!
-Minha filha, você tinha
plena consciência de que isso poderia acontecer a partir do momento
que você tornou público que é lésbica... já conversamos muitas
vezes sobre isso e você entendeu que mais importante que estar na
TV, é ser feliz ao lado de quem você ama... - fala Regina.
-Eu sei de tudo isso, mãe. Eu
sou a mulher mais feliz do mundo em ser casada com a Renata... ela é
a mulher que eu amo hoje e vou amar por todos os dias da minha
vida... mas mesmo assim, poxa! Será que é pedir demais a Deus ter
as duas coisas? Eu amo meu trabalho de atriz... me machuca saber que
estão deixando de me chamar por causa da minha orientação
sexual...
-Filha... sua mãe tem toda a
razão em dizer o que te disse. E depois, tem mais: por um acaso você
deixou de ser atriz? Não! Onde é que você começou tudo, quando
ainda tinha doze anos e insistiu com a gente até a gente deixar você
ir pra companhia de teatro do Procópio? - fala Geraldo.
-É, pai... tudo começou no
teatro.
-E não deveria ser
suficiente? - prossegue Geraldo.
-Eu sei que deveria. Eu
realmente amo o teatro... é onde tudo começou há dez anos... mas
me parte o coração saber que essa é a única opção que tenho de
concreta de agora em diante.
-Eva, minha querida... assim
fica parecendo que você está tratando o teatro com desprezo, como
se fosse uma arte menor que a TV. Sabemos que é o exato oposto
disso... - contemporiza Regina.
-Eu sei disso, gente... juro
que sei! Mas não é fácil abrir mão de um sonho...
-Pensa que você não abriu
mão de nada, querida. Você apenas decidiu entre a fama e o amor.
Você fez a escolha certa... - fala Geraldo.
-Vocês são os melhores pais
do mundo, sabiam disso?
Eva, emocionada, abraça os
pais. CORTA A CENA.
CENA 5: Valentim, em seu
consultório, liga para Raquel.
-Raquel, cê tá podendo vir
aqui o mais rápido possível?
-Claro, Valentim. Alguma
novidade sobre o meu neto?
-Exatamente. Você tem como
estar aqui em no máximo quinze minutos?
-Tenho como, sim. Vou chamar
um uber pelo aplicativo e chego aí em dez minutos.
Raquel chega rapidamente ao
consultório, ansiosa.
-Bom dia, Valentim. Descobriu
o que sobre meu neto, exatamente? Está vivo ou morto?
-Não há registro de óbito
nenhum correspondente a criança de pais desconhecidos. Isso
significa que seu neto não morreu logo após ter nascido, como
mentiu sua filha.
-Eu sabia!
-Agora nosso desafio vai ser
descobrir demais informações sobre seu neto... se ele ainda está
vivo, se ele mora no estado ou no país ou mesmo se ele foi adotado
por algum casal estrangeiro...
-Isso vai ser rápido,
Valentim?
-Não vou te mentir. Na melhor
das hipóteses, tende a levar meses para termos alguma pista de seu
neto.
-Mas pelo menos temos a
vantagem de saber pelo menos por qual tipo étnico procurar...
-Pelo menos isso, Raquel. Mas
ainda assim, essa busca pode ser complicada. Ser branco é algo ainda
muito vago.
-Ah, mas quanto a isso é o de
menos...
-Você que pensa. Precisamos
afunilar até chegar em pelo menos três homens que possam ser seu
neto e a partir disso solicitar os exames de DNA. Só que não é tão
simples quanto parece buscar três possíveis “candidatos” a seu
neto...
Os dois seguem conversando
sobre o caso. CORTA A CENA.
CENA 6: Horas mais tarde, em
Angra dos Reis, Marcelo sente fortes coceiras no quarto da pousada e
Rafael percebe incômodo do marido.
-Nossa, amor... pelo visto
essa irritação voltou com tudo...
-Ai, Rafa... tá insuportável.
Essa coceira tá me deixando louco? Não consigo parar de me coçar,
chega a arder!
-Tenta não coçar tanto,
amor... seus braços já estão ficando muito vermelhos!
-Eu tento não pensar nisso,
mas quanto mais tento me distrair, mais coça!
-Posso dar uma olhada nas suas
costas, que você não para de coçar?
Marcelo tira a camiseta e
Rafael se assusta.
-Amor, pelo amor de Deus! Para
de se coçar agora! Você tá com feridas nas costas, em carne viva!
Precisamos dar um jeito de ir ao dermatologista.
-E voltar pro Rio? Amor, a
nossa lua-de-mel mal começou! Por que a gente não trata isso com
pomadas? É mais vantajoso pegar uma na farmácia e não arruinar
nossa lua-de-mel...
-Você é mesmo teimoso, hein
Marcelo?
-Até parece que você não é
também. Essas feridas vão sarar. Isso deve ter sido algum fungo,
que com a pomada certa, morre...
-Tá certo. Nós vamos à
farmácia... mas se isso não melhorar em uma hora, a gente volta pro
Rio e você não discuta comigo porque nós temos o resto da vida pra
ter quantas luas de mel a gente quiser. O que não posso deixar é
você sofrendo em nome do nosso lazer... agora veste uma camiseta que
a gente vai na farmácia...
Os dois partem da pousada em
direção à farmácia. CORTA A CENA.
CENA 7: Márcio estranha
quietude de Suzanne.
-Nesse silêncio todo que você
tá, sou capaz de apostar que você tá tramando algo...
-Ah, qual foi agora, Márcio?
Não foi você que me disse que não participava mais dos meus
planos? Não devia nem me perguntar o que eu faço ou deixo de fazer.
Não é mais do seu interesse.
-Olha aqui, Suzanne... não é
do meu interesse uma pinoia! Eu ainda sou seu namorado, não sou?
-Você quer dizer amante, não
é?
-Ah, que seja!
-Márcio, na boa... vai catar
o que fazer, vai... e não me enche. Tenho coisas sérias a resolver.
-Se envolver meu filho ou a
mãe dele, pode esquecer.
-Quem você pensa que é pra
tentar me dizer o que devo ou não fazer, Márcio? Até outro dia
você fazia tudo o que eu tramava! Já que você faz tanta questão
de saber, eu te digo: tenho que dar um jeito de tirar Lúcio, o bebê
de ouro, do meu caminho.
Márcio fica perplexo.
-Você enloqueceu? Fazer mal a
um bebê? Você está ficando louca, completamente fora de si. Isso é
crueldade! Ele não tem culpa de nada!
-Ele tem culpa a partir do
momento que por causa dele eu ganho menos dinheiro, mas não se
preocupe. Se não fui capaz de matar nosso filho, eu não mataria
outro bebê... eu vou dar um rumo pra ele. Sem família ele não
fica.
-O que você tá tramando, sua
maluca?
-Já falei demais. Mais do que
devia. Você não se atreva a tentar me impedir que não me custa
nada jogar seus podres no ventilador pro seu amado filhinho...
Márcio se sente impotente
diante da ameaça de Suzanne. CORTA A CENA.
CENA 8: Já com a noite
avançada, Rafael e Marcelo voltam à mansão dos Bittencourt,
deixando todos surpresos.
-Ué... a lua-de-mel de vocês
não era por duas semanas? - espanta-se Haroldo.
-Vocês já brigaram, foi
isso? - pergunta Mariana.
-Gente... se acalmem. Não
brigamos... é que o Marcelo começou com umas irritações horríveis
na pele. Hoje mais cedo viraram feridas nas costas dele. Voltamos pra
podermos ir ao dermatologista se possível amanhã... - esclarece
Rafael.
Riva se preocupa.
-Meu filho... o que será
isso? Será algum fungo, alguma coisa que você comeu?
-Não sei, mãe... só sei que
incomoda demais. Nem a pomada que a gente comprou ajudou. Fico me
segurando pra não coçar...
Vicente se intriga.
-Marcelo... se não for muito
invasivo, posso dar uma olhada nas suas costas? - fala Vicente.
Marcelo tira a camiseta e
Vicente e Mariana observam as feridas nas costas de Marcelo. Riva,
Marion, Ivan, Haroldo e Valquíria preferem não olhar...
-Tá com jeito de ser
psoríase, isso... minha falecida mãe tinha... o que você acha,
Mariana? Você que é a estudante de medicina aqui... - fala Vicente.
-Estudo medicina, mas pouco ou
nada vi da área da dermatologia. Mas baseada no pouco que sei, tem a
característica de ser psoríase, mesmo... de qualquer forma, o
diagnóstico só é confirmado pelo dermatologista... - fala Mariana.
-E o que a gente faz? -
questiona Marcelo.
-Tem meios de aliviar esses
sintomas agora. Amanhã a gente vê isso certinho... - prossegue
Mariana.
CORTA A CENA.
CENA 9: Riva e Vicente vão
com Vicente à uma farmácia próxima à casa deles.
-Poxa, Riva... os meninos não
disseram que já estão com a pomada que compraram em Angra?
-Sim, mas você ouviu o que a
Mari disse... que é preciso pegar mais medicamentos pra suavizar
esses sintomas aparentes... quero cuidar do meu filho, posso?
-Claro que pode, amor... só
fico preocupado com o horário... já passa das onze.
-Relaxa, querido... estamos de
carro e a cinco quadras de casa. Estamos seguros.
Riva termina de falar isso e é
dopada por um homem que chega por trás dela. Vicente tenta reagir
batendo no outro homem que tenta dopá-lo, mas acaba sendo dopado
também. Um sequestrador se dirige ao outro.
-Aonde a gente vai com esses
três, agora? - pergunta o primeiro.
-Pro galpão que a madame
mandou a gente ir... - responde o segundo.
FIM DO CAPÍTULO 64.
Nenhum comentário:
Postar um comentário