CENA 1: Eva tenta se livrar do
homem, que a agarra com força e a deixa sem saída.
-Eu vou gritar, seu tarado!
-Isso, grita! Grita mesmo!
Grita que você leva furo! - ameaça o homem, levando Eva à cabine.
Renata está dançando quando
é acometida de um mau presságio e resolve ir ao banheiro. Renata
estranha não encontrar Eva fora das cabines.
-Eva? Amor, você ainda tá
aqui?
Eva tenta responder, mas o
homem que a agarra faz sinal de que vai machucá-la se ela falar
qualquer coisa.
Renata fica preocupada, mas
resolve sair do banheiro em busca de Eva. Ao chegar à porta, um
homem lhe dá um soco na cara, deixando-a desnorteada.
-O que é isso, cara? Misturou
alguma droga com a bebida? Esse aqui é o banheiro das mulheres, o
dos homens é do outro lado! Me machucou, seu louco!
Renata tenta sair do banheiro
e o homem a agarra.
-O que é isso? Rapaz, eu sou
lésbica e tou procurando minha mulher! Você me largue! - fala
Renata, tentando golpear o segundo homem, sem sucesso.
O homem arrasta Renata, com a
mão em sua boca, impedindo que ela grite, para outra cabine vazia. O
homem tranca a cabine, exatamente como o outro homem fez com Eva. Na
tela aparecem ambos abaixando as calças de Eva e Renata e em seguida
abaixando suas próprias calças. Renata se desespera.
-Você vai aprender a gostar
de homem na marra! - fala o homem, estuprando Renata.
-Não gosta de caralho, sua
vadia? Pois vai aprender a gostar! - fala o outro homem, estuprando
Eva.
Instantes se passam e os homem
abandonam as cabines. Renata, traumatizada, é a primeira a deixar a
cabine. Eva vê a mulher e sai da cabine. As duas se abraçam,
desconsoladas.
-Olha o que eles fizeram com a
gente, Renata! - grita Eva, desesperada.
-A gente podia ter morrido na
mão desses estupradores! - constata Renata, apavorada.
As duas desabam no chão e se
encostam na parede do banheiro.
-Cê tá muito machucada,
amor?
-Tou mais machucada por
dentro, Eva... o que esses homens malditos fizeram vai marcar nossas
vidas pra sempre! - fala Renata, chorando.
-Eu tava acuada. Ouvi quando
você chegou aqui no banheiro, mas o cara me ameaçou de morte. Eu
nunca pensei na vida que seria estuprada... - fala Eva, em estado de
choque.
-E justo dentro da nossa boate
preferida! Esses maníacos se infiltraram num local LGBT! Só podem
ser aqueles infelizes conservadores que pregam o estupro corretivo
das lésbicas... - constata Renata, tentando se acalmar, mas chorando
muito.
As duas tentam gritar por
socorro, mas ninguém escuta.
-Onde foram parar os
funcionários dessa boate, meu Deus? A gente precisa de um médico! -
desespera-se Eva.
As duas se abraçam,
desesperadas. CORTA A CENA.
CENA 2: Instantes se passam e
uma mulher entra no banheiro feminino e estranha ver duas mulheres
sentadas no chão do banheiro, em estado de choque. A mulher vai até
um funcionário da boate avisar do ocorrido.
-Querido... você poderia vir
comigo no banheiro das mulheres? Algo de muito errado aconteceu com
duas garotas ali dentro... elas estão aparentemente em estado de
choque...
O funcionário segue a mulher
e encontra Eva e Renata trêmulas no banheiro. Eva reage.
-Não toca em mim, homem
imundo! - grita Eva.
Renata percebe que se trata de
Leonardo, funcionário da boate.
-Desculpe, Leonardo... minha
mulher está em estado de choque... - fala Renata.
-E você não parece estar
nada bem também... - observa o funcionário.
-Nós fomos estupradas por
dois caras... - fala Renata, começando a chorar.
A mulher que acompanhou o
funcionário até o banheiro vai até as duas.
-Vocês estão machucadas? O
que esses caras fizeram exatamente com vocês? - fala a mulher,
preocupada e assustada.
-Estamos inteiras,
fisicamente... mas destruídas, emocionalmente... - fala Renata.
-Aqueles dois caras que saíram
ainda agora da boate! Não consumiram nada além de duas cervejas e
foram embora com pressa! A caixa chegou a comentar comigo que não
entendeu a pressa deles! Foram eles, só podem ter sido eles! Eram
dois, não eram? - fala Leonardo, o funcionário.
-Eram dois, sim. De estatura
mediana, mas bem fortes. O que me estuprou é levemente acima do
peso... - fala Eva, recuperando-se do choque.
-Vamos dar um jeito de pegar
esses caras. Eles não parecem ter vindo aqui antes e eu vou falar
com o pessoal que cuida das câmeras de segurança da boate... - fala
Leonardo.
-Vocês precisam de um médico!
Eu vou ligar pro pronto-socorro! - fala a mulher que está junto
delas.
-Por favor moça, faça isso
agora mesmo. Vocês precisam sair daqui desse banheiro. Eu acompanho
vocês até a saída da boate. Se quiserem, nós vamos com vocês ao
pronto atendimento. Basta que eu avise a gerente da boate. -
prontifica-se Leonardo.
-A gente aceita que vocês
venham com a gente... - fala Renata.
O funcionário e a mulher
ajudam Eva e Renata a se levantarem e saírem do banheiro. Os quatro
seguem à porta da boate e Leonardo explica o ocorrido à gerente,
que o libera.
-Está feito, meninas. A
gerente ficou de avisar a todos os presentes aqui hoje do ocorrido e
a festa acaba aqui. Ninguém mais entra nessa boate essa noite. -
fala Leonardo.
CORTA A CENA.
CENA 3: Na manhã do dia
seguinte, Raquel chega apressada ao pronto atendimento, depois de ter
recebido através de Mara a notícia do estupro de Eva e Renata.
-Como vocês estão, meninas?
Sou Raquel, investigadora. Vim assim que fui avisada do ocorrido.
Renata estranha.
-Estamos bem, fisicamente.
Fizemos os exames e tomamos a pílula do dia seguinte, além de anti
retrovirais. Vamos ter de fazer exame de HIV daqui um mês, para nos
certificarmos que está tudo bem, mas... vá me desculpar, Raquel...
é esse seu nome, certo?
-Sim, é esse meu nome. E você
deve ser a Renata.
-Sou sim... mas como você
recebeu essa notícia? Nós viemos com um funcionário da boate e uma
conhecida... que já foram embora.
-A conhecida de vocês ligou
para a delegacia da mulher, mas não havia ninguém de plantão.
Mara, minha colega, foi avisada pelo atendente e repassou a
informação a mim. Se eu fosse vocês, meninas, eu ia imediatamente
à delegacia da mulher prestar queixa contra esses estupradores. Eles
precisam ser encontrados e presos. O quanto antes isso acontecer,
melhor para vocês e para outras mulheres que possam ser vítimas
deles.
-Agradecemos a preocupação e
o apoio, queremos denunciar esses monstros com certeza. Mas estamos
exaustas, traumatizadas e precisando de um banho e do colo dos nossos
pais, antes de qualquer coisa... - fala Eva.
-Compreendo essa necessidade
de vocês, meninas. Mas por favor, não deixem de denunciar esses
homens o mais rápido à delegacia da mulher. Chega de violência
contra a mulher, chega de impunidade! - fala Raquel.
CORTA A CENA.
CENA 4: Horas depois, Eva e
Renata estão em casa e são amparadas por Regina, Adelaide, Cleiton
e Geraldo.
-Eu senti... eu senti que
vocês corriam perigo, filha... seu pai tentou me tranquilizar e eu
mesma tentei tirar aquilo da minha cabeça, achando que era só
paranoia minha... eu sinto tanto por não ter ligado pra vocês! Se
vocês tivessem me falado que iriam sair ontem à noite eu ia pedir
pra vocês não saírem... - lamenta Adelaide, abraçando Renata.
-A gente sempre quer evitar
que nossos rebentos sofram as dores desse mundo louco... - fala
Geraldo, triste.
-Mas vocês vão precisar
reagir, meninas. Nós todos aqui vamos precisar reagir... fazer
alguma coisa, denunciar esses dois monstros à polícia e rezar para
que eles sejam presos antes de fazerem mais vítimas... - fala
Regina, resignada e decidida.
-Quanto a isso, mãe, você
pode ficar tranquila. Nós planejamos de ir à delegacia da mulher
hoje mesmo. Se esses monstros que quase acabaram com a vida da gente
pensam que a violência deles vai ficar impune, estão muito
enganados! Esse estupro poderia ter acabado com a minha vida, com a
vida da Renata... mas depois que eu esfriei a cabeça a respeito de
tudo isso eu quero mais é reagir! Essa dor de termos sido
violentadas dessa forma hedionda não vai sair da gente, mas a gente
não pode nem deve se deixar abater. - fala Eva, decidida.
-A Eva tá coberta de razão.
Sempre subestimei a homofobia, a lesbofobia que existe por esse mundo
e por esse Brasil. Acreditei por toda uma vida que eu estava livre de
sofrer esse tipo de violência porque sou empoderada como mulher
lésbica. Agora eu entendo todo o medo, todo o receio e todos os
motivos que levaram a Eva a protelar por tanto tempo a saída pública
do armário. Vivemos em situação de risco, vulnerabilidade social.
Culpa desse machismo, que insiste que mulheres sempre vão sentir
falta de um falo. Culpa dessa homofbia, dessa lesbofobia, desse
preconceito de gênero que se enraiza nesse machismo odioso. A minha
vontade é de jogar a merda dessa sociedade aos quatro ventos, mas
por enquanto a única coisa que a gente pode fazer é denunciar esses
desgraçados! - fala Renata.
-Vocês tem todo o nosso
apoio! - fala Regina.
CORTA A CENA.
CENA 5: Suzanne resolve ligar
para Riva.
-Que milagre é esse de me
ligar, Suzanne? Quase sempre você vem aqui em casa sem avisar
antes...
-Então, Riva. Ando numa
correria daquelas, sabe? Então achei melhor ligar. Como as coisas
andam por aí?
-Por aqui andam cada vez
melhores. Tenho recebido orientações na companhia de teatro pra
encarar o teste de elenco que tenho daqui alguns dias... e com você,
como andam as coisas?
-Pois vou ter que sair do
Brasil, amiga, cê acredita? Tem uma conhecida minha praticamente
implorando por aulas de etiqueta. Sabe onde ela tá morando? Em
Paris! Disse que precisa de mim o mais rápido possível.
-Mas você vai embora pra
França amanhã mesmo?
-Não, sua boba! Antes tenho
algumas coisinhas pra resolver aqui. Vou daqui alguns dias, sem
falta... mas você acha que eu ia perder de fazer um daqueles eventos
maravilhosos com a nata da sociedade carioca? Nem morta e enterrada,
meu bem!
-Ah, é verdade... você
realmente gosta dessas festas da alta sociedade, né? Me avise quando
estiver perto da sua festa de despedida, então.
-Pode deixar que aviso sim,
querida... agora preciso desligar que tem uma cliente me ligando no
outro celular...
Suzanne desliga. Riva estranha
o súbito anúncio de que Suzanne vai embora do país. CORTA A CENA.
CENA 6: Cláudio chama Bruno
para passar a noite com ele em sua casa.
-Ainda bem que você veio,
Bruno... não me acostumo mais com essa casa vazia.
-Até estranhei esse chamado.
Não era pro Guilherme estar aqui? Ele praticamente se mudou pra sua
casa...
-Conversei bastante com ele,
você sabe... ainda não estamos casados e eu quero que ele fique
ainda uns dias na casa dele. Ele ainda tem o apartamento dele em
Copacabana, sabe?
-Mas você acabou de me dizer
que não se acostuma mais com essa casa vazia...
-Ai, Bruno... e não me
acostumo mesmo. Preciso de alguém pra desabafar e sei que posso
confiar em você.
-Pois desabafe à vontade,
querido. Jamais seria capaz de te julgar.
-Sabe o que é? Tenho pensado
muito em tudo... sobre as voltas que essa minha vida deu em menos de
um ano. Há um ano eu namorava Rodr... digo, Haroldo. Daí você
surge no meio de uma das várias crises que tive com ele. Ele termina
comigo do nada, eu e você começamos a namorar... eu descubro
aqueles segredos que envolviam o ex da minha melhor amiga, a gente
termina, você continua morando aqui. No meio desse turbilhão eu
brigo com meu melhor amigo, por pura falta de noção e maturidade da
minha parte... e quando o mundo está desabando sobre a minha cabeça,
surge o Guilherme. Sabe... tudo isso aconteceu num espaço de tempo
curto demais. Mal deu tempo de entender tudo direito...
-Onde você quer chegar com
isso, Cláudio?
-Na parte que eu não estou
tão certo assim do meu casamento com Guilherme. Acho que essa
decisão foi precipitada demais e agora não sei como dizer isso a
ele...
-Você vai precisar encontrar
uma maneira de dizer isso pro Guilherme, meu amigo... se eu fosse
você, eu reconsiderava mesmo esse casamento. Porque eu nunca deixei
de te amar...
-Ai, Bruno... nem sei o que
dizer, sinceramente...
Os dois se encaram, dominando
o desejo. CORTA A CENA.
CENA 7: Diogo termina de fazer
o jantar e serve a ele e a Victor.
-Você não se cansa de ser um
excelente cozinheiro, não? Masterchef perde!
-Deixa de ser exagerado,
Victor... aprendi a me virar sozinho desde cedo, você sabe disso...
-Eu tava pensando numa coisa,
que eu morro de vontade de fazer. Acho que esse pode ser um bom
momento.
-E o que seria?
-Eu adoraria viajar. Conhecer
lugares novos, sabe? Agora que eu tou recebendo a minha graninha por
conta da minha aposentadoria por invalidez, a gente podia juntar essa
grana com a que você recebe do seu emprego...
-Cê tá maluco, Victor?
Querendo ou não, sou assalariado...
-É, mas já está há quase
dois anos na mesma empresa e com férias vencidas que você nem tirou
ainda...
-Olhando por esse lado, eu
fecho dois anos semana que vem. E tenho direito a dois meses de
férias por conta das férias que não tirei quando fechei um ano.
Vai entrar uma boa grana, de fato... mas posso saber pra onde que
você gostaria de viajar comigo?
-Ah, pelo mundo! Quero muito
conhecer a Holanda, a Europa, a África principalmente... você acha
que tem como?
-Apertando, tem como... mas
você nunca me falou que tinha vontade de andar por aí conhecendo o
mundo... você há de convir que eu tenho razão de achar isso
estranho.
-Ai, Diogo... eu já perdi
tempo demais me lamentando pelas coisas. Acho que passou da hora da
gente viver a vida, de um jeito leve...
-Tá... eu vou pensar nisso
tudo. Eu te aviso se conseguir as férias dobradas na minha empresa.
Os dois seguem comendo e Diogo
encara Victor, desconfiado, sem que o namorado perceba. CORTA A CENA.
CENA 8: Laura comenta com
Mateus sobre os novos planos de investigar a identidade do “Chefe”.
-Então foi isso, Mateus... no
final das contas o acordo ficou que a Mara e o Valentim me orientam à
distância, mas que eu não devo procurar por eles fora da companhia
de teatro.
-Bem que eles fazem. Esse
“Chefe” está cada vez mais fora de si. Aquela situação do
rapto foi assustadora. Sorte que eles não te fizeram nada.
-É, mas não se esqueça que
o “Chefe” em pessoa tentou matar o Valentim. Aquela emboscada foi
armada pra eliminar o Valentim e disso não há como ter dúvida.
-Definitivamente é mais
prudente que essas investigações corram com mais discrição. Pela
segurança de todos, ninguém está a salvo.
-Você fala de um jeito,
Mateus... às vezes fico com a clara impressão de que você sabe
quem é o “Chefe” e não quer dizer.
-Suponhamos que eu soubesse,
Laura... você acha mesmo que eu arriscaria a pele de todos nós
soltando essa informação sem a certeza de que ele seria preso?
-Olhando por esse lado... você
tem razão. Mas se você souber, bem que você poderia contar só pra
mim, não podia?
-Laura, por favor... não
insiste. Se eu soubesse, eu não te diria, porque sei que você é
impulsiva.
-Talvez eu seja. Mas será que
você não percebe a gravidade da situação toda?
-É por perceber a gravidade
que insisto que você deve se manter discreta...
Laura se dá por vencida e
desiste da conversa. CORTA A CENA.
CENA 9: Acompanhadas de Mara,
Valentim, Adelaide, Regina, Geraldo e Cleiton, Eva e Renata chegam à
delegacia da mulher. Renata está ansiosa.
-Poxa vida! Achei que a gente
ia chegar aqui e já seríamos ouvidas... - reclama Renata.
-Ih, Renata... você não sabe
como isso aqui é movimentado. Infelizmente a violência contra a
mulher é diária e frequente. Dificilmente a delegacia fica inativa
nas horas que tá aberta... - esclarece Mara.
A delegada se apresenta a
todos.
-Olá, pessoal. Sou Veridiana.
As queixosas podem me acompanhar, por favor... - fala a delegada.
Renata e Eva sentam-se e Eva é a primeira a falar.
-Bem... nós viemos aqui para
denunciar um estupro que sofremos ontem...
FIM DO CAPÍTULO 73.
Nenhum comentário:
Postar um comentário