CENA 1: Rafael apressa o
marido.
-Anda, Marcelo... abre esse
exame de uma vez!
-Tou nervoso, amor... agora
que tá tão perto da gente saber da verdade eu não sei se tenho
coragem de ler o resultado.
-Ah, pode parar! Se você não
quer ver eu mesmo arranco isso daí da sua mão e leio!
-Tá! Não precisa dessa
agressividade... eu vou olhar.
Marcelo respira fundo e abre o
exame.
-Então... qual foi o
resultado? Fala, Marcelo!
Marcelo paralisa e não
consegue dizer nada. Lágrimas começam a correr de seu rosto e ele
abraça Rafael, explodindo no choro. Rafael entende a situação e
Marcelo entrega o exame para ele ler.
-Então é isso... - fala
Rafael, perplexo.
-O Cláudio... é meu irmão!
Eu cresci ao lado do meu irmão sem saber que ele era meu irmão! Tem
noção do que é isso?
Marcelo chora e Rafael o
ampara.
-Agora a gente vai precisar
encontrar um jeito de dizer isso a ele... mas hei, amor! Se anima!
Pra quem há um ano atrás não tinha nenhum irmão, agora você tem
dois!
-Eu tou num misto de emoções,
Rafael... por um lado eu fico feliz de saber que o Cláudio é meu
irmão... só que ao mesmo tempo eu fico com raiva daquele cara...
-Do pai de vocês, você quer
dizer?
-Esse mesmo! Ele nem merece
ser chamado de pai. Como é que ele teve a coragem de fazer isso?
Abandonou o Cláudio e abandonou a mim, durante mais de vinte anos!
-Isso é o que você supõe.
Você ainda não ouviu a versão dele dos fatos...
-E por acaso precisa? Eu sou
jornalista por acaso?
-Marcelo, não seja
infantil...
-Infantil, Rafael? Não é o
seu pai que abandonou dois filhos, um ainda na barriga da mãe e
outro pra ser lançado à própria sorte num orfanato. Já pensou
como o rumo da vida do Cláudio podia ter sido diferente se aquele
merda do Márcio tivesse assumido ele como filho? E a mãe dele, quem
será que é? Ninguém sabe!
-Por isso mesmo que eu digo,
meu amor... a gente precisa pelo menos ouvir o que o seu pai tem a
dizer. Ele vai acabar explicando tudo e quem sabe assim, já saibamos
quem é a mãe do Cláudio...
-Tá... você tem razão. Mas
não espere que eu receba o Márcio com flores depois de saber de
tudo isso.
-Eu te entendo. Mas insisto
pra você não concluir nada precipitadamente. Às vezes os mal
entendidos acontecem justamente por falta de comunicação.
-Só você, amor... só você
com sua sensatez pra me tranquilizar numa hora dessas.
-Deixa de bobeira... a gente
precisa focar no lado positivo disso. Nossa família é maior do que
a gente pensava...
-Vamos pra casa? Ainda vou
precisar digerir essa notícia antes de decidir qualquer coisa.
-Também acho melhor. Acho que
uma noite de descanso vai colocar suas ideias em ordem...
Os dois deixam o laboratório.
CORTA A CENA.
CENA 2: No consultório de
Valentim, ele e Mara seguem debatendo sobre a ausência de ação de
“Chefe” e sua facção.
-Sabe o que tem de mais
estranho em tudo isso, Mara? Que nesses anos todos, essa talvez seja
a primeira vez que essa facção se silencia por tanto tempo...
-Isso se os homens dela
realmente não estiverem agindo. Tudo isso pode não passar de uma
grande cortina de fumaça. Sabemos que o número de pessoas que
trabalhou ou trabalha para essa organização, compulsoriamente ou
não, é grande... incalculável, ainda.
-Entendo sua cautela, amor...
mas não acredito que nesse momento qualquer ação grande esteja
sendo feita.
-O que ainda não significa
que nenhuma ação menor não esteja sendo planejada ou executada.
Não se esqueça que há políticos envolvidos nela...
-Eu sei, Mara. Mas ainda
assim, ninguém nessa facção age sem as ordens do “Chefe”.
-Justamente por isso que eu
pensei numa coisa: atualmente temos 6 suspeitos, certo?
-Sim, correto.
-Que tal se você tentasse
analisar o perfil psicológico de cada um deles e não apenas daquele
que eu coloquei como o principal suspeito encabeçando a lista?
-A sua ideia é excelente,
amor. Eu deveria ter pensado nisso antes, afinal de contas a
especialidade é minha...
-Tá vendo como uma mulher é
fundamental na vida de um homem? Mas, deixando a brincadeira de lado,
o que você teria a me dizer dos outros cinco, superficialmente?
-Bem... esse segundo da lista
honestamente só permaneceu aqui por sua insistência e por
desconfianças alheias... eu sinceramente não vejo esse rapaz como
alguém que pudesse ter tanto sangue frio de mandar e desmandar em
tantas vidas, decidindo quem vive e quem morre. É um sujeito
controverso? Sem dúvida, mas nada aponta para um perfil criminoso...
-Certo.... e o terceiro? Ou
melhor: a terceira?
-Essa é uma forte candidata.
Escapa como ninguém dos olhos de quem suspeita rapidamente e é
ardilosa o suficiente para não deixar rastros. Porém algo se
contradiz nessa suspeita, porque mais de uma vez as ações de
“Chefe” se mostraram um tanto apaixonadas, carregadas de
emoções... negativas, mas emoções.
-Sou obrigada a concordar.
Pode ser ela, mas seria contraditório.
-Sobre o quarto suspeito...
esse sim. Aliás, tanto ele quanto o quinto souberam e sabem manter a
discrição por tempo indeterminado. Ambos possuem um instinto de
sobrevivência exacerbado e dependendo de como isso se manifesta na
totalidade, poderia perfeitamente significar eliminar qualquer
ameaça... inclusive pessoas.
-Esses eu sinceramente acho
que você poderia já ter excluído da lista, Valentim. Não acredito
que apesar do histórico deles, eles sejam criminosos...
-Enfim, que seja... o nosso
último suspeito tem passado por uma súbita mudança de
comportamento. Sua postura aparentemente cordata e mansa pode ocultar
o extremo oposto de tudo isso...
Os dois seguem debatendo sobre
o perfil psicológico dos suspeitos. CORTA A CENA.
CENA 3: Raquel está arrumando
suas malas e Márcio conversa com ela.
-Eu vou sentir sua falta, dona
Raquel... você sempre foi como uma mãe pra mim.
-Você pode vir comigo, se
quiser. Você não tem nenhuma obrigação de continuar “morando”
nesse hotel esperando pela Suzanne.
-Eu sei que não... mas eu amo
a sua filha.
-O problema é que esse seu
amor por ela sempre te fez cego. Não te culpo por isso... eu mesma
levei anos, como mãe, para perceber que infelizmente minha filha
nunca teve bom caráter. Você pode desconversar quantas vezes
quiser, mas eu sei que você só foi preso anos atrás por culpa
dela, pagou pelos crimes que ela planejou e você, cego de amor,
executou.
-Sabe o que mais me dói
nisso? Saber que você tá certa... mas eu nunca soube fazer da vida
outra coisa senão seguir a Suzanne por onde ela fosse.
-E você acha justo isso com
você, meu querido? Em algum momento ela se preocupou com você
quando tomou as próprias decisões e te obrigou a não agir para
impedir que ela entregasse o filho de vocês pra adoção?
-Eu... não lembrava que a
senhora sabia disso.
-Acho que nunca te contei. Mas
eu sei de muito mais do que você imagina. E estou ao seu lado. Você
sabe o quão difícil é para uma mãe se colocar contra a própria
filha? Mas eu sei que você é tão vítima quanto eu fui nesses anos
todos... não posso te virar as costas. Mas também não posso
admitir que um homem bom como você destrua a vida por alguém como a
Suzanne. Vem pro apartamento que eu aluguei, querido. Vai ser melhor
conviver menos com ela... afinal de contas, ela não se importou com
você quando se mandou pra França sem nem se despedir direito...
-Desculpa, dona Raquel. Você
é realmente uma mãe pra mim. Mas eu não sei deixar de amar a sua
filha. Eu acho que esse amor só vai morrer dentro de mim no dia que
eu tiver coragem de denunciar ela pelos crimes que ela cometeu.
-Eu não espero outra coisa de
você, Márcio. De qualquer forma, minha casa estará sempre aberta
pra você. Eu te amo como uma mãe ama um filho...
Raquel abraça Márcio
emocionada e vai embora. CORTA A CENA.
CENA 4: Rafael tenta encorajar
Marcelo a ligar para Cláudio.
-Amor... por que não liga de
uma vez pro Cláudio?
-Você sabe que ele deve estar
na companhia de teatro uma hora dessas e o assunto que a gente tem a
tratar com ele é sério.
-Acho que você não tá
entendendo bem, amor... não tou te dizendo para ligar pra ele e
contar toda a verdade pelo telefone! Tou dizendo pra gente marcar de
ver ele... ainda hoje, se possível.
-Ai... tá. Mas nesse caso não
precisa ligar. Tenho medo de ele perceber alguma coisa pelo meu tom
de voz. Acho mais prudente avisar ele pelo whatsapp que a gente quer
ver ele ainda hoje, quando ele estiver em casa. Ou chamar ele pra vir
aqui. Assim, quando ele ler, ele nos responde.
-Você tá certo. Do jeito que
você tá tenso – e com toda a razão – o Cláudio perceberia
alguma coisa pelo seu tom de voz.
-A gente ainda precisa pensar
nas palavras certas pra mandar na mensagem... acho que vou deixar pra
você decidir o que dizer, porque do jeito que minha cabeça ainda tá
bagunçada com essa notícia, é capaz de eu acabar deixando escapar
alguma coisa e isso não ia ser nada bom...
-Marcelo, você não devia
ficar tão inseguro assim, não é esse o Marcelo que eu conheci e me
apaixonei.
-É, só que o Marcelo que
você conheceu e se apaixonou não sabia que tinha esse passado
todo...
-Tá... me passa o seu celular
que eu mando a mensagem...
Rafael começa a mandar
mensagem para Cláudio. CORTA A CENA.
CENA 5: Vicente percebe que
Riva está intrigada.
-Engraçado, amor... faz dias
que você anda com uma cara esquisita, mas hoje especialmente você
tá de um jeito que parece até estar pressentindo alguma coisa...
-Sabe, Vicente... tem uma
semana que o Marcelo anda numa pilha de nervos. Conheço meu filho e
sei que ele tá escondendo alguma coisa. Além disso o Rafael está
esquisito também... desde aquele dia do incidente com o Márcio, que
ninguém entendeu direito a grosseria do Marcelo com ele...
-De repente eles estavam
tensos por conta da estreia daquele projeto secreto que tá
viralizando na internet...
-Mas Vicente... se fosse isso
essa tensão já teria acabado. O seriado está sendo super elogiado
pelo público e pela crítica. E eles continuam esquivos. Quando a
gente passa perto do quarto deles, um deles sempre fecha a porta.
Coisa que não faziam antes da hora de dormir...
-Você acha que eles estão
guardando segredo de alguma coisa, Riva?
-Tenho quase certeza. E tou me
roendo de aflição por não ter a mínima ideia do que possa ser
isso...
CORTA A CENA.
CENA 6: Horas mais tarde, Eva
e Renata, que estão na casa dos pais de Eva, encerram a gravação
do vídeo em que Regina, Adelaide, Cleiton e Geraldo dão seus
relatos sobre conviver com filhas lésbicas e se posicionam contra o
machismo da sociedade. Renata desliga a câmera.
-Gente, ficou ótimo! Cada um
desses relatos vai ser editado e no máximo em dois dias, a gente
publica o vídeo no canal da Eva e colocamos também no site. - fala
Renata.
-Ficou bom o que eu falei,
filha? Ainda fico preocupada com as besteiras que eu posso falar por
não saber direito como entrar em certos assuntos... - desabafa
Adelaide.
-Deixa disso, dona Adelaide!
Você foi muito bem. Depois, não tem nada que uns truques básicos
de edição não possam fazer pra manter apenas o melhor da sua fala.
Não se preocupe com isso, minha sogra... - fala Eva.
-Ih, queridas! Acho que eu vou
ser o que mais vai dar trabalho pra vocês na hora de editar tudo
isso. Do jeito que eu fiquei divagando, fazendo pausas, indo e
voltando do mundo da lua... - brinca Geraldo.
-Bobo. Você não se cansa de
ser o melhor pai que existe? - fala Eva.
-Espero que esse vídeo sirva
pelo menos de convite à reflexão de todas as famílias que tenham
filhos ou parentes próximos que sejam LGBT... - fala Cleiton.
-E vai ser, meu amigo. O que
não podemos é nos amedrontar e nos manter calados diante desse
conservadorismo que incita a violência contra lésbicas, gays,
mulheres, travestis, transexuais... ih, a lista é tão grande de
pessoas ameaçadas por essa onda conservadora que se eu colocar isso
num caderno, ainda falta espaço... - fala Regina.
-Bem, gente... por hoje já
tivemos muito trabalho. Se vocês não se importam, vamos pra nossa
casa porque eu pelo menos tou exausta de tanta coisa que fiz só no
dia de hoje... - fala Renata.
-Você nos deixando em casa,
filha, tá de bom tamanho... - fala Adelaide.
Eva, Renata, Cleiton e
Adelaide partem da casa de Regina e Geraldo. CORTA A CENA.
CENA 7: Cláudio passa
rapidamente em sua casa, toma um banho e se arruma. Antes de sair,
liga para Marcelo.
-Fala, viado! Desculpa se não
consegui sair mais cedo da companhia de teatro... mas, enfim. Tou
saindo daqui da minha casa em menos de cinco minutos. Chamei um uber
pra não demorar muito pra chegar até aí...
-Ótimo. Então você chega
mais ou menos em meia hora?
-Acredito eu que sim, amigo.
Só demoro mais se o motorista se perder no meio do caminho...
-E o Guilherme, não vem com
você?
-Nada! Assim que eu li a
mensagem mais cedo no whatsapp eu liguei pra ele, avisando pra ele
nem ficar aqui em casa e ir pra casa dele, porque eu nem sei que
horas volto pra cá...
-Perfeito. Te espero, então.
-Você tá com uma voz
estranha, viado... parece que tá falando as coisas pela metade.
-Impressão sua, Cláudio.
-Não costumo me enganar,
Marcelo... você parece que tá me escondendo algo.
-Querido... a gente conversa
direitinho quando você chegar, ok? Não fica pensando muito nisso,
tá? A gente tá te esperando e já compramos uma pizza caso você
não tenha jantado.
-Tá certo, tou saindo.
Beijo...
Cláudio fecha a porta de sua
casa e espera o carro estacionar. CORTA A CENA.
CENA 8: Sozinho no apartamento
do hotel, Márcio relembra o dia que Suzanne fugiu do hospital com o
filho deles recém-nascido e ele a esperou no lado de fora. Corta
para flashback de 1995.
-Você tá louca, Suzanne! Não
tem nem vinte e quatro horas que nosso filho nasceu!
-Esse bebê não é meu, não
é seu, não é nosso. Não é de ninguém.
-Eu não acredito que você
vai levar esse plano adiante. Pensei que depois de parir a criança
você fosse mudar de ideia.
-Posso saber por que eu
mudaria? Você que insistiu pra esse menino nascer.
-E eu ia compactuar com você
colocando sua vida em risco num aborto clandestino, Suzanne? Eu te
amo!
-É, mas por causa desse seu
amor eu tive que aguentar nove meses com meu corpo deformando e esse
parasita crescendo dentro de mim!
-Não fala assim do nosso
filho!
-Márcio, pela última vez eu
te peço pra não chamar esse merdinha de nosso filho, tá me
ouvindo? A gente precisa ir embora daqui. Onde está o carro?
-Deixei estacionado logo ali.
-Vamos sair daqui. Agora.
-Pra onde?
-Pra onde eu mandar. Esse
parasita não vai atrapalhar meus planos, não vai atrapalhar nossos
planos.
-Você não sente nem um pingo
de amor por essa criança, Suzanne?
-E tenho eu motivo pra amar um
vermezinho que cresceu dentro de mim e me roubou energia vital? Não!
Eu não sei o que é amar tão rápido assim. Esse papinho de que ser
mãe muda a mulher é conversa pra boi dormir. Me leva pro orfanato,
esse bebê não fica com a gente nem por essa noite.
Márcio chora e Suzanne se
irrita.
-Para de chorar, seu frouxo!
Você sabia desde o começo que ia ser assim!
Márcio volta da lembrança e
chora. CORTA A CENA.
CENA 9: Cláudio está na
mansão dos Bittencourt e chega ao quarto de Marcelo e Rafael.
-Espero não ter demorado
muito, meninos... agora vocês podem me dizer o que tanto precisam
conversar comigo? - fala Cláudio.
-Cláudio... senta aí. O que
a gente tem a te falar é muito sério e o Marcelo nem sabe por onde
começar a te dizer. Por isso mesmo eu acho melhor te entregar esse
exame pra que você mesmo conclua o que a gente tem a te dizer. -
fala Rafael, entregando o exame de DNA para Cláudio, que lê o exame
e fica confuso.
-Isso aqui é um exame de DNA.
Mas comparando o meu DNA com quem? Eu só posso estar entendendo
errado... - fala Cláudio, começando a compreender.
-Você não está errado. Eu
fingi passar mal aquele dia na sua casa e peguei seu cabelo.
Cláudio... você é meu irmão. - fala Marcelo, emocionado.
FIM DO CAPÍTULO 80.
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