CENA 1: Eva se anima, mas fica
apreensiva.
-E a gente vai agora? Eu não
sei se eu tenho coragem de olhar pra cara daqueles vermes, isso se os
caras presos realmente forem eles...
-Amor... a gente vai precisar
reconhecer os estupradores. Pode ser que não sejam eles, mas a
delegada nos ligou antes que fosse lavrada a intimação pra gente
comparecer lá... isso só aconteceria amanhã. Ela me disse que eles
resistiram à prisão e ficam ameaçando as mulheres que trabalam lá.
A gente precisa ir de uma vez, para que eles possam ser, caso sejam
eles mesmos, transferidos para um presídio e aguardar julgamento.
-Tá. A gente vai. Só me
ajuda a colocar o feijão no congelador pra gente não perder o
jantar, depois?
-Claro!
As duas se aprontam
rapidamente.
-Vamos, Eva... chegou a hora
da verdade.
Renata e Eva deixam o
apartamento. CORTA A CENA.
CENA 2: Eva e Renata chegam à
delegacia da mulher. A delegada se apresenta às duas.
-Bom dia. Vocês devem ser
Renata e Eva. Eu sou Lauriane, a delegada titular. Preciso que vocês
venham comigo até eles, para que me digam se os homens que prendemos
são mesmos os caras que violentaram vocês. Venham comigo, por
favor... - fala a delegada.
Eva e Renata seguem a delegada
Lauriane e chegam até onde estão os homens, que não podem enxergar
elas, mas elas os enxergam através do vidro. Renata sente seu sangue
ferver de raiva.
-São eles mesmo, delegada! Os
dois criminosos que estupraram a gente! - fala Renata, tentando
conter sua raiva.
-Como é que vocês
conseguiram chegar a eles e prender? - questiona Eva.
-Estava havendo uma festa na
Barra da Tijuca. Festa de gente fina. Uma das convidadas dessa festa
ligou para cá, denunciando que os dois rapazes estavam com um
comportamento suspeito e que ela temia que eles dessem boa-noite
Cinderela em alguma das mulheres que estavam nessa festa. Quando
chegamos ao local da festa, eles tentaram fugir da revista, mas
acabaram sendo revistados de qualquer maneira. Foi aí que
encontramos em seus bolsos uma série de calmantes e ansiolíticos
potentes, confirmando a suspeita da denunciante. Se eles não
tivessem sido pegos a tempo, provavelmente eles teriam estuprado
mais.
-Isso é chocante! A cada dia
fico com mais certeza que a melhor coisa que podíamos fazer era
abrir essa campanha para denunciar toda e qualquer violência contra
a mulher. Fico imaginando quantos desses ainda estão soltos por aí,
sem a polícia nem suspeitar dos crimes que eles cometem... - fala
Eva.
-Bem, agora que vocês
confirmaram que se tratam deles mesmo, eu vou encaminhar os dois para
serem transferidos para o presídio no máximo em dois dias, para que
eles aguardem o julgamento por lá e sem chance de fuga. - esclarece
a delegada.
-Ótimo! Vamos precisar
prestar depoimento, ainda? - pergunta Renata.
-Não vai mais ser necessário.
Vocês estão liberadas. Esse reconhecimento era fundamental para que
eles possam ser autuados pelos crimes cometidos. Claro que ainda há
outras acusações que recaem sobre eles, mas carecemos de provas.
Obrigado por virem. Fiquem tranquilas, que esses dois não vão mais
ameaçar vocês! - fala a delegada.
Eva e Renata deixam a
delegacia. CORTA A CENA.
CENA 3: Mara percebe que
Valentim está insatisfeito por não encontrar pistas concretas sobre
o “Chefe”
-Tou vendo que você tá
cansado de andar em círculos...
-E tou mesmo, Mara. Essa
história parece que nunca tem fim. Quando a gente acha que encontrou
finalmente uma pista quente, tudo desaparece como se fosse passe de
mágica.
-Sabe o que eu pensei sobre um
possível traço do perfil desse “Chefe”? Desculpe falar, eu sei
que você é o psiquiatra aqui, mas... você se atentou ao fato de
que a vaidade é um traço bem notável nas poucas ações do “Chefe”
que conhecemos? E digo mais... essa vaidade pode se estender de tal
forma que o sujeito, convencido de que atua bem, pode passar a imagem
de pessoa ilibada, bondosa, acima de qualquer suspeita.
-Você tem razão, querida.
Mas todos esses traços que você descreve me levam a suspeitar de
uma pessoa que eu me sinto até culpado de suspeitar.
-Porque ele é seu amigo? Ora,
Valentim! Mais de trinta anos nesse ofício e você fica na dúvida
por causa de apego afetivo a uma pessoa? Menos, meu querido, bem
menos. Qualquer pessoa pode ser suspeita e você sabe disso.
-Bem... sendo assim, só me
resta colocar ele na lista de suspeitos.
-É o melhor que você faz
nesse momento. Olha, eu sei que o ideal era ir afunilando a lista,
mas... e se por acaso o real “Chefe” nem estiver nessa lista de
suspeitos? O ideal talvez seja estender bem mais essa lista.
-Eu sei, Mara... o problema
disso é que, se for esse cara que a gente tá pensando... ele pode
ser o pior tipo de pessoa. Uma pessoa que é capaz de enganar a todos
dissimulando vinte e quatro horas por dia e sete dias por semana é
tão psicopata quanto a Suzanne, por exemplo.
-É uma possibilidade que
precisamos tratar como real...
Os dois seguem debatendo.
CORTA A CENA.
CENA 4: Durante o sono,
Valquíria se vê transportada para um sonho que a remete a
lembranças reais do passado. O ano é 1980 e sua filha Marinete está
grávida de sua neta Riva. As duas vão ao Rio de Janeiro fazer
comprar para o enxoval de bebê e Valquíria vê uma gargantilha de
ouro com um grande botão no centro que lhe chama a atenção.
-Filha, olha que linda essa
joia! Não é de encher os olhos?
-Ah, mamãe... eu adoraria ter
uma gargantilha dessas, mas já parou pra pensar no valor absurdo que
isso daí deve ter?
-Eu me viro pra pagar. Essa
garantilha é sua, tá decidido: eu vou comprar e você não me venha
com reclamações.
-Mas mamãe, como que a gente
vai pagar uma joia dessas? Eu tenho trabalhado menos por conta da
gravidez...
-A sua gravidez já tá
avançando um bocado, minha filha. Você nem deveria trabalhar. Se
esqueceu que durante anos fui eu a ambulante? Eu volto a ser depois
que a gente voltar pra Barra de São João. Até o fim da sua
gravidez, você não trabalha. Eu sei como trazer bastante dinheiro
pra dentro da nossa casa. Você fica cuidando da sua irmãzonha
Marion, combinado?
-Desse jeito nem me arrisco a
discutir. A senhora é tinhosa quando coloca uma coisa na cabeça.
Valquíria retira a
gargantilha do mostruário e entrega à filha.
-Tome, minha filha... segure e
coloque no seu pescoço. Ela é sua. No caminho de volta a gente tira
uma foto sua 3 por 4 pra colocar dentro desse botão lindo.
Marinete segura, fascinada,
sua gargantilha.
Valquíria acorda do sonho,
emocionada. CORTA A CENA.
CENA 5: Riva está amamentando
Lúcio quando Valquíria a procura no seu quarto.
-Bom dia, querida. Esse meu
bisneto nunca para de ter fome, nossa!
-Puxou a mim, vó... que me
milagre ver a senhora acordada tão cedo e sem estar trabalhando...
-Eu tive um sonho essa noite.
Um sonho lindo... bem, na realidade não foi sonho. Enquanto eu
dormia eu revivi um momento das vésperas do natal de 1980...
-E o que foi vivido de tão
especial nas vésperas desse natal?
-Sua mãe estava grávida de
você e nós fomos ao Rio comprar as coisas para preparar seu
enxoval. Foi quando eu vi a gargantilha que o Márcio te roubou
quando fugiu em noventa e seis... Marinete, sua mãe, ficou
maravilhada e eu decidi comprar aquela joia linda e dar de presente a
ela. Foi um sufoco daqueles pra mim, ter de trabalhar dobrado até a
gravidez da Marinete acabar e você nascer, em maio do outro ano. Mas
aquela cena, da sua mãe fascinada segurando aquela gargantilha, pela
primeira vez na vida, antes de colocar no pescoço... é uma das
coisas mais emocionantes que eu vi. No caminho de volta a gente tirou
uma foto três por quatro dela e colocamos dentro do botão. Sua mãe
disse que um dia a gargantilha seria sua, quando você já fosse uma
mulher feita. Ela não teve tempo de te ver crescer e se tornar essa
mulher forte que você se tornou...
Riva se emociona fortemente e
abraça a avó.
-Mas me deu a gargantilha
antes de morrer. Me dói muito não ter mais essa lembrança dela...
mas fazer o que. As melhores lembranças estão nos nossos
corações...
Valquíria paparica o bisneto.
CORTA A CENA.
CENA 6: Horas depois, Valentim
e Mara estão no camarim da companhia de teatro e Valentim começa a
falar.
-Mara, você vá me desculpar,
eu entendo que seu embasamento argumentativo foi consistente pra eu
incluir aquele cara na lista de suspeitos, mas... a gente precisa
investigar é o passado do Márcio. Não podemos esquecer que ele
também é um dos suspeitos.
-Que seja, Valentim. Você tem
razão... tem muita ponta solta, muita história mal contada nessa
coisa de ele ser pai do Cláudio e do Cláudio ser irmão do Marcelo.
Pode mesmo ser que ele tenha alguma ligação com essa facção, mas
ainda assim, não acredito que tenhamos indícios de que ele seja o
chefe. Ele não tem nem de longe o tipo físico do homem que
flagramos disfarçado mais de uma vez...
-Esse homem ou esses homens
podem ser testas de ferro, Mara. Precisamos saber mais do passado de
Márcio.
-Tá certo. Mais tarde a gente
vê isso. Agora preciso voltar pra preparar os atores.
-Mara... por favor. Me ajude a
investigar o passado desse cara. Ele pode ter informações sobre
muito mais coisas que imaginamos.
-Eu sei disso. A começar pelo
fato de que ele sequer diz com quem se envolveu no passado. Mas por
favor, amor... agora eu não vou ter muito tempo de te ajudar nisso.
Mais tarde a gente se debruça sobre as informações que estiverem
disponíveis.
Mara deixa o camarim e
Valentim fica pensativo. CORTA A CENA.
CENA 7: Horas depois, no
intervalo para o lanche, Valentim chama Laura.
-Haroldo, querido... você
pode nos dar uma licencinha? Vou precisar roubar sua namorada por
instantes... - fala Valentim.
-Claro... - fala Haroldo,
esperando na plateia.
Laura vai com Valentim até o
camarim.
-Fiquei assustada... o assunto
parece ser urgente...
-Bem... urgente não chega a
ser, mas acabei de verificar, fazendo uma intensiva pesquisa em
outras informações, que a ligação que o Mateus teve com essa
facção foi algo bem maior que pensamos...
-Como é que é? Ele fez
exatamente o que?
-Pelas informações que foram
levantadas, ele foi homem de confiança do “Chefe” antes de ser
dispensado. Era o responsável por fazer as cobranças daqueles que
estivessem devendo dinheiro pra facção.
-Estou chocada... mas ele
cometeu crimes?
-Até onde conseguimos apurar,
não. Mas, se eu fosse você, escolhia um momento oportuno para
“apertar” Mateus... ele precisa falar do que sabe, pelo menos pra
você. Talvez ele seja uma das maiores testemunhas de toda essa
investigação.
-Mas ele também pode ter
cometido crimes!
-Sim, isso pode ter
acontecido. Mas pessoalmente, eu duvido disso. Mateus tem um perfil
mais acovardado. Só trabalhou pra esse “Chefe” porque estava nas
mãos dele. A questão que precisa ser esclarecida nisso é: por qual
motivo esse “Chefe” tinha Mateus nas mãos? Alguma coisa de séria
serviu de motivo para essa chantagem ser executada. O fato é que
houve uma chantagem e graças a ela, Mateus se viu obrigado a prestar
serviços ao “Chefe” dessa facção. Mateus sabe muita coisa... é
um arquivo vivo. É possível mesmo que ele saiba a identidade desse
cara. Mas obviamente ele não diz porque é ameaçado. Nós sabemos o
quanto tudo isso é perigoso.
-Pelo menos eu fico aliviada
por saber que ele não seria o próprio “Chefe”. Confesso que nos
momentos que cheguei a suspeitar disso, quase expulsei ele de casa.
-Tire isso da cabeça. Mateus
é uma vítima desse cara. Trabalhou forçado. Claro, deve ter
ganhado um bom dinheiro pelos serviços que prestou. Se eu fosse
você, eu conversaria com ele sem julgar. Ele precisa sentir
confiança em você para poder falar sobre tudo sabendo que não será
julgado. Conto com você, pois a sua ajuda para esclarecer o que está
por trás disso será fundamental.
-Pode contar comigo, Valentim.
Agora preciso me apressar, senão perco a hora de lanchar.
Laura parte do camarim. CORTA
A CENA.
CENA 8: Rafael conversa com
Marcelo.
-Amor... eu sei que tudo tá
muito recente, mas você não acha que seria um bom momento de
conversar com seu pai?
-Eu só tenho uma mãe.
Desculpe, amor... mas não reconheço como pai um sujeito que
abandonou dois filhos e por causa disso impediu que eles descobrissem
que são irmãos.
-Ainda acho que você está
fazendo o que critica tanto no Cláudio... que aliás, é
compreensível... vocês são irmãos, mesmo.
-E o que eu tou fazendo que
critico nele?
-Concluindo as coisas por
precipitação e por conta própria. Você está se baseando apenas
pela sua visão, no máximo pela sua visão e do seu irmão, dos
fatos. Não quer ouvir o que o seu pai tem a dizer. Isso é ser
intransigente demais, você não acha?
-Você tá certo. Mas também
tá certo quando diz que tudo isso tá recente demais. Como é que eu
vou agir com imparcialidade e sangue frio diante de tudo isso? Foram
mais de vinte anos sem saber que eu tinha um irmão mais velho, tem
noção do que é isso? E o Cláudio, coitado? Ficou destruído! E
ainda tem que aturar os pitis daquele babaca do futuro marido dele...
-Eu sei de tudo isso, meu
amor... eu realmente sei e sou empático a vocês. Mas se você
espera empatia, como pode esperar que sejam empáticos com você
quando você se recusa a ouvir seu próprio pai? Ele tem o direito de
falar a versão dele dos fatos. E você precisa se desarmar.
-Às vezes eu tento ficar com
raiva de você, Rafael... mas não consigo. Detesto como você sempre
tem a palavra certa na hora certa. Detesto como você sempre consegue
me fazer ver o óbvio quando eu não consigo ver por mim mesmo...
detesto tanto tudo isso que não sei fazer outra coisa dessa vida
senão te amar...
Os dois se beijam,
carinhosamente.
-Eu que te amo, Marcelo. Te
amo pela sua alma, pelo seu coração, pela sua essência pura e
justa. Te amo pelos seus potenciais, pela sua infinita capacidade de
amar e sempre haver mais espaço nesse coração pra um pouco mais de
amor. É por isso que eu digo, amor: permita-se amar o pai de vocês.
Ainda dá tempo...
-Tá certo, amor... você me
convenceu. Mas vamos deixar isso pra amanhã? Ainda preciso me
preparar emocional e psicologicamente pra tudo.
-Eu espero, querido. Só não
permita que o ódio vença o amor...
CORTA A CENA.
CENA 9: Horas mais tarde,
Cláudio recebe Guilherme em sua casa. O clima está pesado entre
eles.
-Olha, Claudinho... eu sei que
fiz besteira.
-Ainda bem que sabe. Você tem
noção do quanto foi inoportuna e incômoda sua atitude naquele
momento? Eu tinha acabado de descobrir que Marcelo e eu somos irmãos
e tinha vindo de uma discussão pra lá de tensa com o nosso pai e
você nem quer saber de nada, só me aponta o dedo e me faz aquela
cena ridícula de ciúme. Não te serviu de nada o desabafo com o
Bruno na noite anterior? Não te ajudou em nada o apoio, o ombro
amigo e a empatia que ele te ofereceu? Se você sabe que fez
besteira, espero que lembre de tudo isso. E eu também quero deixar
bem claro que você não tem a permissão de fazer nada parecido com
isso outra vez. Ou então não tem mais casamento entre nós, tá me
ouvindo bem? Chega de usar sua doença como desculpa pra tudo, chega!
-Eu aceito cada uma dessas
suas palavras, por mais duras que elas sejam. Elas são a verdade. Eu
sinto muito, de coração... saí de mim. Perdi a noção e passei
feito um trator por cima de você, de todo mundo.
-Eu fico feliz que você
esteja reconhecendo isso. Sabe, Guilherme... eu não gosto de brigas.
Não gostode brigar com você... mas você testa minha paciência e
minha tolerância muitas vezes... e eu perco a cabeça!
-Prometo que nada disso vai
acontecer. Prometo não... juro!
-Não precisa jurar, amor...
eu só quero o seu bem. Se você estiver bem, eu também vou estar.
Os dois se abraçam, selando a
paz. CORTA A CENA.
CENA 10: Mara vai à delegacia
de mulheres para interrogar os estupradores de Renata e Eva. A
delegada Lauriane a recebe.
-Chegou na hora marcada, Mara.
-Como vai, Lauriane? Eles
estão complicando muito?
-Demais. Não disseram quase
nada no depoimento. Ficam naquela ladainha de que só falam na
presença de advogado. Já contatei defensores públicos para que
eles tenham advogados. Vamos até eles...
Mara e Lauriane chegam à
frente da sala onde eles estão fechados e conversando entre si.
-Pera, Lauriane... antes de
entrar eu vou ouvir um pouco o que eles estão falando... - fala
Mara.
-Isso não podia ter
acontecido com a gente, Alexandre. Agora que a polícia pegou a gente
o “Chefe” vai caçar a gente até apagar a gente... a gente vai
morrer! - fala um dos homens.
Mara fica perplexa. FIM DO
CAPÍTULO 83.
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