CENA 1: Valentim percebe que
Laura está surpresa pela sua chegada.
-Se tranquilize, Laura... eu
me certifiquei que ninguém me seguiu do consultório até aqui.
Posso entrar?
-Claro, Valentim... por favor!
Bruno estranha.
-O que esse cara tá fazendo
aqui? - pergunta Bruno.
-Bem... acho que você é o
único daqui que ainda não sabe: não sou apenas um psiquiatra amigo
do Procópio. Sou um investigador da Polícia Federal. Haroldo e
Mateus já sabem disso e... bem, Laura é minha colaboradora
informal. - esclarece Valentim.
-Eu sou o Bruno.
-Eu sei, rapaz. Sei também
que você e o Mateus foram vítimas do “Chefe” e que o Mateus,
coagido pelo que o “Chefe” sabia sobre vocês, sobre o
relacionamento que vocês tinham escondido desde quando você veio
aqui pro Rio, acabou sendo forçado a prestar serviços à facção.
Você sempre soube disso, não soube, Bruno?
-Soube... mas não podia fazer
muita coisa. Esse “Chefe” tem informações sobre mim que podem
destruir minha família... meus pais não sabem que sou bissexual e
ele me obrigou a me manter calado, caso contrário ele poderia levar
ao conhecimento dos meus pais lá em Coroados sobre minha
sexualidade... isso pra não dizer coisas piores que ele poderia
fazer.
-Entendi. Dessa forma, vocês
dois se viram sem saída, não foi?
-Exatamente. Mateus prestava
os serviços e eu me mantinha calado diante de tudo. Só que tudo
mudou de figura quando eu fui obrigado por esse “Chefe” a seduzir
o Cláudio. Eu acabei me apaixonando pelo Cláudio desde o primeiro
momento que o vi diante de mim e acabei não fazendo o que havia sido
ordenado que eu fizesse.
Valentim se espanta.
-Peraí... isso que você tá
me contando é completamente novo! Onde é que o Cláudio entra
nisso? - questiona Valentim.
Mateus, assustado, tenta
impedir Bruno de prosseguir.
-Bruno... por favor. Você já
está falando demais! - fala Mateus.
-Mateus, se tranquilize. Essa
aqui é uma conversa informal e eu não fui seguido. Estamos em
segurança... e eu sei que você omitiu a parte de que foram homens
da facção que sabotaram o carro de Rafael.
Mateus se impressiona e nada
diz.
-Sendo assim, deixe o Bruno
falar, ok? Nada vai lhes acontecer. - finaliza Valentim.
-Bem... sendo assim, vou
continuar: eu não sei exatamente qual é a cisma do “Chefe” com
o Cláudio, mas ela não é de hoje. O cara parece nutrir uma
obsessão pelo Cláudio, culpa o Cláudio por alguma merda que
aconteceu na sua vida. Assim, nos últimos anos esse sujeito tem
manipulado o destino do Cláudio, decidindo quem entra e quem sai da
vida dele... pesquisando os podres do passado das pessoas próximas a
ele para exigir que elas se afastem, mediante chantagem... - fala
Bruno.
-Eu posso confirmar tudo isso,
Valentim. Eu fui apaixonado pelo Cláudio quando eu fui Rodrigo... o
sentimento era verdadeiro e nossa história, apesar de eu esconder
tantas coisas dele, foi uma das coisas mais verdadeiras que vivi. Só
que o “Chefe” concluiu em certo momento que eu não seria mais
útil para os planos dele, que ele nunca revelou quais eram. Então
ele me obrigou a terminar com Cláudio... sem mais nem menos. Ou eu
terminava com ele, ou ele faria uma loucura... - fala Haroldo.
-Vocês precisam falar tudo
isso à polícia, em depoimento. O cerco contra o chefe está
finalmente se fechando! - constata Valentim.
CORTA A CENA.
CENA 2: Raquel chega em sua
casa depois de um longo dia de trabalho e Márcio a recebe com um
forte abraço.
-Que bom te ver assim animado,
meu filho...
-Ah, dona Raquel... eu resolvi
começar a reagir. Se for pra me livrar da Suzanne, que a coisa seja
feita pelo lado certo.
-Assim que se fala, Márcio...
-E o seu dia, foi muito
corrido?
-Nossa, você não faz ideia.
Dobrei jornada hoje, ainda prendi três caras acusados de pedofilia.
Foi osso! E o seu dia, querido... como foi?
-Fui almoçar com a Riva...
ela queria conversar comigo.
-É mesmo? E o que ela
precisava conversar?
-Sobre uma coisa que ela me
sugeriu... confesso que fiquei dividido. Ela quer que eu denuncie a
Suzanne, assim que ela voltar pro Brasil.
-Eu sugeriria a mesma coisa,
no lugar dela... sabendo de tudo.
-Você acha mesmo que isso
daria em alguma coisa?
-A gente só sabe se tentar,
não é?
-Mas dona Raquel, como é que
eu vou denunciar uma pessoa que nunca na vida teve uma mísera
passagem pela polícia? Como que me levariam a sério sendo eu o
denunciante, sendo que eu mesmo já fui apenado?
-De qualquer forma, Márcio...
Riva sugeriu a coisa certa.
-Mesmo que isso não dê em
nada? Ah, dona Raquel... não vejo sentido em dar murro em ponta de
faca, sabe?
-Querido... eu adoraria
continuar essa conversa com você, mas estou realmente destruída e
derrotada pelo dia longo que tive hoje. Se incomoda da gente
conversar mais sobre isso amanhã de manhã, caso você já esteja
acordado?
-Claro que não me incomodo,
mãezinha... só vou ficar com essa dúvida martelando um pouco mais
na cabeça, mas... tudo o que sempre tive vindo da Suzanne foi isso:
dúvidas.
-Você ainda é tão jovem,
meu querido... tem uma vida inteira e promissora pela frente. Não
devia perder tanto tempo com uma pessoa que sempre te usou, como a
minha filha. Você merece um amor de verdade, a liberdade, ser
feliz... se prender à Suzanne só vai te privar de tudo isso.
-Não sei o que seria de mim
sem a senhora. Você é que é minha mãe... não aquela que desistiu
de mim porque preferiu acreditar nas fofocas que a vizinhança fez
sobre mim.
-Eu também te sinto como um
filho, meu querido. Agora preciso tomar uma ducha e me atirar na
cama. Durma bem, meu filho...
-A senhora também...
Raquel beija a testa de
Márcio. CORTA A CENA.
CENA 3: Valentim faz perguntas
a Haroldo, Bruno e Mateus.
-Bem... eu não quero que
vocês se sintam acuados e nem obrigados a responder nada, mas
lembrem-se que essa é uma conversa informal e eu estou aqui mais
como pessoa do que como investigador... no entanto, preciso juntar
mais informações. Então vamos lá: Haroldo, como e quando você se
viu sem saída e coagido pelo “Chefe”?
-Bem, não é segredo pra
ninguém que durante muitos anos eu fui, assim como meu pai, viciado
em jogatina. Comecei desde garoto e a coisa foi se agravando nos meus
vinte e tantos anos. Conheci um monte de agiotas, de toda espécie.
Fui me endividando cada vez mais e minha família estava indo à
falência, antes do meu irmão começar a atuar como ator na TV. Um
desses agiotas trabalha para a facção do “Chefe” e me mandou um
recado direto dele: ou eu sumia, ou eu e toda minha família
morreríamos. A ideia era que eu juntasse o suficiente de dinheiro
para pagar a dívida que eu tinha. Mas essa dívida eu paguei em
questão de meses. O problema passou a ser sair dessa facção porque
eu sabia de muita coisa... sabia como era o modus-operandi dos homens
dela. Acabei sendo obrigado a continuar mesmo depois de ter quitado
minha dívida e aquilo foi como uma bola de neve na minha vida. No
meio disso eu conheci o Cláudio e o “Chefe” ordenou que eu o
seduzisse... acontece que eu me apaixonei de verdade pelo Cláudio e
quando eu estava disposto a contar toda a verdade... o “Chefe”
mandou eu terminar tudo com ele... e sumir. Foi o que eu fiz. - fala
Haroldo.
-E você, Mateus... tem algo a
dizer?
-Nada que já não tenha sido
dito pelo Bruno, Valentim... eu até teria mais o que dizer, mas me
desculpe... ainda tenho muito medo. Esse chefe é perigoso, muito
perigoso.
-Valentim... acho que o Mateus
não consegue falar mais sobre isso. E é compreensível... eu e você
sabemos o que o “Chefe” já fez contra nós... - fala Laura.
-E eu sinto que não posso
mais contribuir com nada nesse momento, Valentim... no fim das
contas, o “Chefe” pode estar em outra vibe agora... pode até
mesmo ter desistido de muita coisa... - fala Bruno.
-Está bem, pessoal... acho
que por hoje eu já fiz vocês falarem mais do que aguentam. Não se
esqueçam, contudo, que estou do lado de vocês... - fala Valentim.
CORTA A CENA.
CENA 4: Na manhã do dia
seguinte, Cleiton percebe, ao se acordar, que Adelaide não está na
cama e a encontra pensativa na sala, a tomar uma xícara de café.
-Caiu da cama, querida?
-Quase não dormi, Cleiton.
Fiquei com aquelas ameaças ridículas do pastor ecoando na cabeça.
Quem ele pensa que é pra condenar as pessoas que vivem diferente do
que ele julga certo?
-Ele não é ninguém,
Adelaide... mas eu fico com medo que agora que a gente gravou aquele
vídeo, ele acabe fazendo algo contra nós.
-Que se meta a besta pra ver
se eu não boto a boca no mundo! Foram anos naquela igreja me
submetendo a todas regras absurdas. Não tenho medo de um covarde
feito ele.
-E o que você pretende fazer,
se as ameaças não pararem?
-Eu não pretendo fazer, meu
querido... eu vou fazer. E é mais simpes do que você imagina: eu
vou denunciar ele. Falar de todos os podres daquela igreja.
-Adelaide, Adelaide... você
não tá mexendo com peixe pequeno.
-E daí? Se todo mundo se
amedrontar, nunca ninguém nessa vida vai reagir contra quem tenta
oprimir, será que você não percebe?
-Você não está nem um pouco
disposta a desistir da denúncia, né?
-Nem um pouco, Cleiton. A
gente já tá na chuva. Deixa a água molhar a gente...
Cleiton apoia a esposa. CORTA
A CENA.
CENA 5: Raquel se acorda e
encontra Márcio tomando café.
-Que bom que você acordou
cedo hoje, querido... tava mesmo precisando continuar aquele papo com
você.
-Aquela nossa conversa de
ontem, dona Raquel?
-Sim, querido... acho que
faltou eu te explicar algumas coisas, como elas realmente funcionam
na polícia.
-Pois é, mãezinha... eu sei
que sou leigo, mas duvido muito que alguma coisa possa ser descoberta
contra a Suzanne só com a minha denúncia.
-Aí é que você se engana,
meu querido... e muito!
-Como?
-Simples: a partir do momento
que é feita a denúncia, é aberto um inquérito, certo?
-Certo.
-Esse inquérito pode ficar
aberto por tempo indeterminado, desde que se encontrem provas mínimas
de pequenos delitos. Não precisa ser nada grave, mas isso dá
sustentação ao inquérito, para que ele continue, tá entendendo?
-Acho que tou começando a
sacar...
-Então... uma vez aberto esse
inquérito, muitas coisas passam a ser investigadas, por nossa parte,
como movimentações financeiras, por exemplo... diferente das
investigações que correm por fora, as investigações dentro de um
inquérito aberto correm nos conformes da lei e isso, por si só, nos
dá algumas vantagens, como quebra de sigilo, etc.
-Eu acho que entendi, dona
Raquel... se eu fizer a denúncia, isso facilita as investigações
da senhora e dos outros investigadores, é isso?
-Exatamente, querido...
Os dois seguem a conversar.
CORTA A CENA.
CENA 6: Laura parte para mais
um dia de ensaios na companhia de teatro enquanto Bruno se prepara
para mais um dia de trabalho.
-Olha, gente... só tou indo
trabalhar hoje porque nunca fui de faltar serviço, mas confesso que
tou com bastante medo de andar na rua, sabendo do que pode vir a
acontecer... - confessa Bruno.
-Nem me fale, Bruno... eu
insisti tanto pra Laura que era só ela ligar pro Procópio dizendo
que não iria ao ensaio... mesmo assim ela foi! E sem mim! - fala
Haroldo.
-Ih, Haroldo... se acostuma,
aquela ali é ariana ao cubo. Enfia as coisas na cabeça e homem
nenhum tira! - fala Mateus.
-Bem, rapazes... eu vou me
apressando, senão perco a condução pro trabalho... - fala Bruno,
indo embora.
-Até mais, Bruno! - falam
Mateus e Haroldo.
-Sabe, Haroldo... eu não
queria demonstrar isso perto do Bruno, mas a verdade é que eu tou
morrendo de medo pelo que pode acabar acontecendo com a gente. Por
mais que a Laura insista que o Valentim tomou todos os cuidados antes
de vir aqui ontem, eu sei que o “Chefe” quando quer esconde bem
os seus olheiros...
-Vou te mentir se te disser
que não estou com medo, Mateus... e também sei como esse infeliz
age, não me esqueço de quando ele colocou três brutamontes
vigiando a casa da minha família, só pra me meter medo. Mas sabe de
uma coisa? Acho que ele tá mais preocupado em fazer terror
psicológico com a gente do que em fazer qualquer coisa de má contra
a gente...
-Que os deuses te ouçam,
Haroldo... porque alguém aqui nessa casa vai ter que fazer as
compras do dia, senão você sabe que a Laura fica uma fera! E como
eu sou ainda o único morador oficial dessa casa além dela, faço eu
as compras mais pro começo da tarde, tá?
-Tá certo... não sou eu que
vou discutir... - brinca Haroldo. CORTA A CENA.
CENA 7: Guilherme e Cláudio
estão arrumando a sala, quando Guilherme lembra de um assunto.
-Amor, você não disse que
era hoje que começava a mandar os convites do nosso casamento por
e-mail pra todos os seus amigos?
-Ih, Guilherme... é mesmo! Já
ia me esquecendo... mas dá pra deixar pra mais tarde? Essa sala tá
numa sujeira que não dá pra parar a limpeza agora...
-Não tem problema, eu fico
aqui fazendo a limpeza enquanto você redige o e-mail e manda pra
todos os convidados pro nosso casamento. Vai tranquilo!
-Tá certo, então... mas que
marido bem prendado que você tá me saindo antes mesmo do casamento,
hein? Todo prestativo, ajudando sem pedir nada em troca...
-Ah, nada em troca uma pinóia!
Eu exijo os meus beijinhos!
-Como se precisasse pedir por
eles, seu bobo... enfi, eu vou ligar o PC rapidão e já mando os
convites pra todo mundo, tá?
-Ótimo.
Cláudio liga o computador.
-Ai que demora dos infernos
pra iniciar esse PC, socorro!
-Depois sou eu que tou
ansioso, né Cláudio?
-Você faz umas comparações
tão estapafúrdias que chegam a ser singelas, Guilherme... mas
enfim, acho que preciso comprar um PC novo, esse aqui já tá
velhinho...
-Eu compro um pra você, amor.
-Pode parar por aí,
burguesinho! Sou pobre mas sou limpinho! - brinca Cláudio.
-Mal dá pra acreditar,
Cláudio... depois de todas as voltas que essa vida deu, de tudo o
que a gente deixou de viver e tá vivendo... não dá pra acreditar
que depois de tudo, falta tão pouco pro nosso casamento. Acho que
esse vai ser o dia mais feliz da minha vida... - derrete-se
Guilherme.
-Eu te amo cada dia mais,
sabia disso? Espero que um dia seja amor suficiente para estar à
altura do que você sente por mim... mas agora me dá licença que eu
preciso mandar os convites...
CORTA A CENA.
CENA 8: No seu intervalo para
o lanche, Laura volta para a plateia do teatro e Procópio a percebe
tensa.
-O que aconteceu, Laura? Até
antes da pausa você tava tão leve, se dedicando tanto a tudo...
-Ai, Procópio... eu tou com o
coração apertado. Eu devia ter ouvido o Haroldo e ter ficado em
casa hoje...
-Se você não está se
sentindo bem pra continuar depois, me avisa, querida. Nunca foi um
problema liberar vocês...
-Não, Procópio... eu já
estou aqui e vou levar esse dia até o fim.
-Você parece preocupada,
Laura.
-Eu não sei o que está
havendo... não sei se é paranoia ou intuição... mas a sensação
que me dá é de pressentimento ruim, sabe?
-Se você acha que deve voltar
pra casa, não pense duas vezes.
-Querido, eu sei que você
quer o meu bem, mas eu fico melhor ensaiando, acredite. Essa sensação
de mau presságio vai passar. Daqui a pouco os outros atores também
voltam e eu esqueço rapidinho disso...
-Tá bom, querida... qualquer
coisa, me avisa.
CORTA A CENA.
CENA 9: Mateus está voltando
do mercado com as compras do dia para a casa. Ao atravessar a rua e
rumar em direção ao prédio, nota que dois homens suspeitos se
aproximam. Mateus apressa o passo tentando chegar ao prédio
rapidamente, mas os homens o abordam antes.
-É dinheiro que vocês
querem? Meu celular também tá no bolso... - fala Mateus,
acreditando se tratar de um assalto.
-A gente não quer nada seu,
babaca. Você não devia ter confessado aquele crime. Chefe ficou
muito desapontado e agora você vai ter que morrer! - fala um dos
homens.
-Isso deve ser um engano... -
fala Mateus, tentando se esquivar.
Os homens encurralam Mateus e
ele é esfaqueado. FIM DO CAPÍTULO 92.
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